Capítulo Dezenove

5.1K 723 147
                                    

Evan D'Ávila

É incrível como as coisas mudam de uma hora para outra em nossas vidas. Em um dia eu estava inteiro e hoje uma parte de mim foi arrancada sem qualquer pena. Eu já me cansei de ouvir essa história de que era isso ou eu morreria por causa de uma infecção. Mas acontece que eu não aceito isso, não dá!

Eu só consigo sentir medo, raiva, repulsa de mim mesmo e uma angústia que não passa. Não é possível que tudo vai acabar desse jeito na minha vida. Eu sou a porra de um homem incompleto agora e não sei qual o sentido da minha vida agora. Nada faz sentido, na verdade. Faz exatamente dez dias desde que acordei e finalmente não há mais aqueles ferros em minha boca, me impedindo de falar ou comer como uma pessoa decente. Mas, para falar a verdade, não fiz questão de falar com ninguém.

Otávio foi a única pessoa com quem "conversei". Ele voltou duas vezes mais após aquela visita e monopolizou o assunto, já que eu não estava nenhum pouco a fim de pronunciar ou digitar uma palavra. Meus pais estão aqui todos os dias, principalmente pai Castiel, que praticamente não sai do meu lado. Eu me sinto culpado em não dar abertura a eles e os tratar da forma como merecem, mas eu não consigo fazer isso nesse momento.

Visto de fora pode até parecer um drama exagerado, mas só quem vive sabe como é. Ok, eu estou vivo, mas o preço é alto e eu me sinto morto de certa forma. Sei que após sair desse hospital eu ainda vou viver fazendo fisioterapia e então tem a merda da prótese, sem contar a cadeira de rodas que vou usar por um tempo e as cicatrizes horríveis que ficaram em meu corpo. Eu já havia me machucado antes, mas isso aqui não tem comparação, é tudo o que eu nunca imaginei passar.

E então eu penso que não posso mais fazer aquilo que eu amo, que é montar. Eu nunca mais vou poder competir em rodeios, nunca mais vou sentir a adrenalina de estar em cima de um touro. E agora eu penso... o que eu vou fazer da vida? Não é como se eu precisasse trabalhar, já tenho muito dinheiro, mas eu vou ficar sem fazer nada para sempre? Vou ficar apenas olhando para a minha perna amputada e sentindo raiva? É esse o destino que eu tenho?

Ouço batidas na porta e isso me tira dos meus devaneios. Viro meu rosto, olhando para a porta, mas não digo nada. Segundos depois ela se abre e vejo Otávio. Ele me olha por um momento e sorri para mim antes de entrar, mas o que me chama a atenção é a garotinha que há junto dele, sentadinha em uma cadeira de rodas. Ela é minúscula na cadeira, deve ter cerca de uns cinco anos. Seu corpo é magro, ela não possui os cabelos, mas há um sorriso em seu rosto e seus olhos azuis são sapecas, mesmo com um cateter no nariz e soro na veia.

- Olá, Evan! Zoe e eu viemos te fazer uma visita. - Otávio anuncia e termina de entrar no quarto, trazendo a menina para mais próximo.

- Oi, tio! - A garotinha sorri para mim e é impossível ser imune a isso.

- Oi, Zoe. - Saúdo e minha voz sai um pouco falha pela falta de uso, assim como meu maxilar dói um pouco no processo.

- Tio Tatá disse que você 'tá doente e triste, então eu vim aqui te fazer companhia. Eu sei como é ficar triste e sozinha. - Ela diz em suspiro e meu peito se aperta.

- Sério, princesa? Obrigado por isso. - Tento sorrir para ela, que ri e aperta o ursinho de pelúcia em suas mãozinhas.

- É, mas agora eu já tô ficando boa. Né, tio Tatá? - Ela questiona Otávio, que sorri grandemente para ela.

- Com certeza, estrelinha. - Ele confirma e aperta a pontinha do nariz dela, a fazendo rir.

Paro para observar Otávio por um momento e constato que é a primeira vez que o vejo sendo médico, como sempre foi seu sonho. Eu não pude estar junto dele enquanto ele realizava seu sonho e esse é um dos meus arrependimentos, pois é nítido o amor que ele tem pela profissão e pelos seus paciência.

Opostos | Livro 01 - Série Amores Indomáveis (Mpreg)Onde histórias criam vida. Descubra agora