Acordei com um braço gigantesco rodeando minha cintura, apertando-me como se fosse uma boneca de pano. Já era manhã e meu estômago deu-me um bom dia sonoro, me lembrando de que não havia comido nada desde a manhã anterior.
Olhei para o mais velho e seu rosto estava completamente coberto pelas mechas douradas. Sorri afetuoso com a cena e deixei um beijo terno em sua bochecha. Thor muito provavelmente não acordaria agora, então desvencilhei-me dos seus braços com cuidado para não despertá-lo.
Vesti minhas roupas e fui até a cozinha, cumprimentando alguns criados no caminho. O café da manhã já estava posto e servi-me num instante, sentando à mesa para comer. Minha fome era tamanha que ainda nem havia entretido-me com quais poderiam ser as consequências do rei de Asgard simplesmente ter sumido logo depois de voltar de uma longa viagem. Isso sem contar na possibilidade de darem por minha falta no processo, por algum milagre das Nornas. Caso ligassem os pontos de nossa absência simultânea, temia que a casa de Odin entraria em colapso.
Ele de certo já estaria preparando um discurso cheio de sermões sobre a irresponsabilidade de Thor — e quem sabe, nossa — com a coroa, o que não poderia ser mais longe da verdade. Por mais que me doesse admitir, Thor estava fazendo um bom trabalho como governante. Até o momento, de qualquer forma.
Recordei-me da conversa que tive com Frigga no dia da coroação, quando ela me disse que eu subestimava o mais velho e por isso era tão facilmente surpreendido pelo mesmo. Como sempre, minha mãe tinha toda a razão. Tanto sobre as ressalvas que tinha em relação a Thor, quanto sobre minha ignorância ao lidar com os sentimentos que nutria por ele.
— Olhe só quem está de volta e sequer veio falar comigo. — ouvi a voz de Frigga e sorri automaticamente, levantando da cadeira para ir abraçá-la. Falando no diabo...
— Perdão, eu cheguei indisposto. — ela segurou meu rosto, lançando-me um olhar maternal.
— Estava apenas fazendo drama, sei que essas excursões podem ser muito cansativas. — concordei com a cabeça e voltei a me sentar, fazendo um gesto para que ela me acompanhasse. Beberiquei meu suco e tão logo o líquido chegara à minha boca, ele quis fugir com o susto que levei ao ouvir a seguinte pergunta: — E seu irmão, como está?
— Perdão?! — indaguei pego de surpresa, enxugando meus lábios com um guardanapo. Frigga arqueou as sobrancelhas.
— Seu irmão. Vai me dizer que ainda estão brigados? — havia um misto de incredulidade e impaciência em sua voz, o que fez-me soltar um suspiro discreto de alívio.
Mas é claro que Frigga não fazia ideia de que nesse exato momento Thor estava dormindo em minha cama, apenas um lençol de seda cobrindo seu corpo nu. Limpei a garganta, tentando esquecer aquela imagem impura na presença de minha mãe.
— Não, está tudo bem. — respondi enfim, deveras consciente de que tal expressão era uma simplificação grotesca da minha atual relação com Thor. Mas disso ela não precisava saber.
— Ótimo! Ao menos não vou ter de lidar com seu mau humor, já basta o de seu pai.
— Problemas no paraíso, minha rainha? — fui sarcástico, meramente para esconder o desgosto em minha face ao ouvir a palavra pai. Frigga fez um gesto desdenhoso com a mão, um longo suspiro escapando de seus lábios róseos.
— Você bem sabe, o de sempre. Embora não seja mais rei, o peso da coroa ainda paira sobre os ombros do pai de todos. — prendi uma risada com sua escolha de palavras, mais uma vez. Odin era pai de todos, só não meu. A justiça poética podia ser tanto cômica quanto trágica.
— Estou certo de que é somente por agora, o reinado de Thor ainda é muito recente. — ofereci da maneira mais casual que pude, tentando não defender meu irmão tão descaradamente contra a necessidade infinita de controle que havia em meu pai adotivo. Frigga, contudo, me conhecia melhor do que ninguém. Ela abriu um sorriso gigantesco que por um segundo achei que fosse rasgar seus lábios.