chapter x

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No dia seguinte, o rei de Vanaheim nos convidou a dar um passeio pelos pontos mais importantes do reino, afirmando que na sua terra “primeiro vinha o lazer, depois as questões de trabalho”. Thor e eu meramente aceitamos o convite, numa animação e cordialidade tão fingidas que talvez até um cego houvesse visto nossa péssima atuação.

Desde a conversa infeliz de ontem, não havíamos trocado mais uma palavra sequer. Falei muitas coisas das quais me arrependi no minuto seguinte, principalmente sobre suas qualidades enquanto rei. Thor era um homem sensível apesar de seu porte físico gigantesco. Uma palavra por simples que fosse era capaz de entristecê-lo e no meu caso, foram várias. Sempre soube como irritá-lo e magoá-lo, afinal — conscientemente ou não. O fato era que ele estava mal e não conseguia esconder tão bem quanto eu, por isso planejava me desculpar consigo na primeira oportunidade em que estivéssemos só nós dois para evitar complicações na hora de negociar com a corte de Vanaheim logo mais.

Nosso passeio seria à noite e eu já estava devidamente trajado, penteando meus cabelos negros para trás absorto em pensamentos. Não sabia para onde o rei nos levaria, só esperava que não fosse a uma taberna cheia de bêbados imundos e meretrizes seminuas. Esse tipo de passeio eu dispensava. Ouvi passos se aproximando e me virei para ver quem era, me deparando com a figura encorpada de Thor.

Ele trajava vestes casuais, coberto por sua manta escura por conta do frio daquela noite. Suas madeixas loiras estavam soltas e visivelmente um pouco úmidas, denunciando que havia acabado de tomar banho. Seus lábios cheios estavam curvados num sorriso contrário e senti um leve desconforto diante da cena, o remorso me engolindo novamente. As coisas que falei no dia anterior eram todas verdades, mas admitia que a forma com que as despejei sobre Thor fora injusta. Estava irritado e não devia ter aberto minha boca no calor da emoção.

— Está pronto? — Thor questionou sério, me fazendo voltar à realidade. De onde estava pude sentir seu perfume forte e respirei fundo, inalando-o discretamente. Estava mais agradável do que eu me lembrava.

— Só um minuto. — murmurei sem olhá-lo, deixando a escova sobre a cama.

Olhei-me rapidamente no espelho e seguimos para encontrar o rei, Thor vários passos à minha frente. Encontramos o casal simpático próximo à nossa carruagem e trocamos um sorriso cordial. Entramos no veículo em silêncio e assim fomos, até chegarmos ao nosso destino.

A presença quieta de Thor ao meu lado me incomodava profundamente, era muito fora de sua personalidade. Ele era expansivo e eminente, falava alto, seu carisma era capaz de conquistar o mais introvertido dos seres. Sempre tinha algo a dizer, sério ou não, inteligente ou não. Sua estranha quietude estava me dando nos nervos, logo eu, o primeiro a criticar seu jeito intrometido e inconveniente. Suspirei e encarei o céu estrelado, recordando as palavras infelizes que causaram mágoa tão grande no mais velho.

— Chegamos. — ouço sua voz grossa, estranhamente apática e indiferente.

Apenas assinto e descemos da carruagem simultaneamente, sendo recebidos pelo rei em frente ao que me parecia ser uma taberna assim que pisamos fora do veículo. Segurei a vontade de revirar os olhos. Ele vem até nós e dá um abraço apertado em Thor, um sorriso brilhante estampando seu rosto. Felizmente ele não se sente na obrigação de me cumprimentar com a mesma intensidade, me dando leves tapinhas no ombro enquanto nos guia até o estabelecimento.

Há poucas cabeças no local, surpreendentemente. Uma música alta e irritante ecoa pelas paredes grossas da taberna, sendo acompanhada pela gritaria incompreensível das pessoas na tentativa de se comunicar. Olho para Thor e ele continua com o mesmo semblante fechado, embora force um sorriso de vez em quando para agradar o rei tagarela. Sentamos a uma mesa mais reservada e recuso a oferta de bebida, diferente de Thor obviamente. Logo os dois reis estão sentados de frente para mim engajados numa conversa sobre os negócios reais, enquanto bebericam suas cervejas.

Entrelaço minhas mãos sobre meu colo e as encaro, esperando pacientemente que Thor me introduza na conversa de alguma forma. O que não acontece, de fato, o que só faz sentir-me mais culpado ainda. Nunca cogitei que Thor fosse do tipo “tratamento de silêncio” quando estava magoado, mas poderia afirmar com toda convicção que ele estava alcançando seu objetivo, se esse era me incomodar. Respiro fundo, resignado. Tomo um farto gole da minha água e tento esconder o mau humor, vez ou outra rindo forçadamente de alguma piada sem graça do rei de Vanaheim.

— O quê?! — o rei espalhafatoso exclama, chamando minha atenção. Ele olha incrédulo para Thor: — Como você nunca conheceu os charmes da nossas damas antes, Thor? Que tipo de Odinson é você?! — então ele se levanta e vai até uma moça que está em uma mesa próxima à nossa, a trazendo delicadamente pela mão. Ela senta no colo de Thor e abre um sorriso sedutor para o loiro, me fazendo sentir um desconforto imensurável. — Esse é o rei de Asgard, minha querida. — diz o velho com um sorriso orgulhoso nos lábios, como se estivesse apresentando seu filho à meretriz.

— Às suas ordens, majestade. — ela o fita maliciosa e o loiro sorri de volta, mas não responde.

Travo o maxilar e desvio o olhar daquela cena, indignado e confuso pela minha própria reação. Talvez eu só esteja esgotado desse dia e precise de uma longa noite de sono. Observo em silêncio a mulher acariciando o peitoral de Thor, enquanto ele volta a conversar sobre negócios com o rei. Meus punhos cerram involuntariamente. Sinto uma raiva indescritível tomar conta de mim e me levanto, pedindo licença e deixando a taberna a passos ágeis. Se ficasse mais alguns segundos ali, poderia causar uma cena que só complicaria a vida de Thor como rei e não era esse o meu objetivo.

Assim que sinto o ar fresco da noite solto um longo suspiro, ainda me sentindo estranhamente sufocado. Queria ir embora daquele lugar, sentia minhas energias sugadas. Mil vezes as estantes mofadas da biblioteca de Asgard do que essa sensação excruciante que invadia meu peito e ficava cada vez mais pesada, me impossibilitando de pensar claramente. De fato não sabia ao certo o porquê do meu incômodo com as carícias da meretriz no corpo de Thor, mas estava nervoso demais no momento para tentar entender minhas próprias sensações.

Respirei fundo e encarei o céu estrelado, caminhando para longe da bendita taberna. Estava quase entrando na carruagem e pedindo ao cocheiro que me levasse o mais distante possível daquele lugar imundo. Cheguei a dar dois passos na direção do veículo, mas fui violentamente puxado pelo ombro, parando onde estava. Virei-me para dar de cara com um Thor furioso, me fitando com fogo em seus olhos azulados. Prendi a respiração, tomado pelo susto.

Ele questiona, a ira presente em sua voz:

— Aonde pensa que vai?!

HEAVY CROWN | 𝐭𝐡𝐨𝐫𝐤𝐢Onde histórias criam vida. Descubra agora