· Amberly narrando ·
─ Janet isso é um saco. ─ Bufei. Estávamos tentando jogar uma partida de xadrez pela oitava vez, dessas oito ela venceu sete. Só iríamos parar quando eu ganhasse, que, no caso, não estava muito interessada em participar. Estava cansada de ficar ali parada olhando para as mesmas peças, o mesmo tabuleiro, a mesma adversária, mesmas paredes de concreto em minha volta, o mesmo cheiro seco. A sala de treino fica muito mais tediosa quando não se está treinando. ─ Eu to com fome, to comendo por quatro. ─ Levantei os quatro dedos da mão direita para representar, mas não deu em nada, ela continuava atenta ao jogo.
─ Sem mente, seu corpo morre. Olha pra você, um rostinho bonito, mas se der uma prova de quinto ano você reprova ─ ela mexeu uma peça do xadrez. ─ Oitavo xeque-mate só em duas horas, precisa melhorar nisso.
─ Claro, claro. Eu tenho muitas coisas pra me preocupar, um jogo de xadrez não significa nada. ─ peguei meu moletom que estava no chão ao meu lado e me levantei. ─ Quem sabe na próxima eu ganho. ─ Vesti o moletom, bem mais largo que o meu corpo.
─ Vai pra onde? ─ Ela perguntava se levantando também.
─ Pegar comida, dã. Você me prende na sala de treino, me deixa sentada no chão sujo, e, ainda por cima, me obriga a jogar um jogo que eu nunca quis aprender. Você me disse que me daria um treino hoje, parece que perdi meu tempo com isso.
─ Vou com você, pra ver se não faz nenhuma merda. ─ Implicou.
─ Eu não faço merda, só faço o que quero. Não sou mais uma criança. ─ Saímos da sala de treino no subsolo e fomos andando para a cozinha, no andar de cima. Andando pela escada que uma vez estava lotada de refugiados tentando se esconder do grupo de assassinos, vulgo os Purificadores.
Hoje de manhã, fui acordada com Janet batendo em minha porta tão forte que parecia que queria fazer um buraco nela. Não fizemos uma refeição grande antes de ir para o treinamento, esse deve ser o motivo da minha fome. Ela não citara mais o beijo, que foi bastante inesperado pra mim. É como se não tivesse acontecido nada entre nós. Beijar os outros do nada é comum aqui e eu não sei?
─ Não, não é comum ─ ela lia a minha mente. Não gostava disso, não tinha nenhuma privacidade. ─ Ninguém tem privacidade aqui, muito menos você. Você cresceu pobre, mas age como uma pessoa que sempre quer tudo pra si. Depois de tantos anos na rua, você deveria saber que nada que você quer você ganha. ─ Ela olhava para a direção que estávamos indo, como se me ignorasse.
─ Queria falar sobre ontem ─ cruzei os braços. ─ Vai continuar agindo como se não aconteceu nada? ─ A observava, vendo se surgia alguma emoção vinda dela.
─ Vou. ─ ela afirmou seca ─ Porque não aconteceu nada.
─ Você me deu um beijo. E se meu pai tivesse passado por lá e nos visse? E se qualquer um nos visse? Não iria aguentar tamanha humilhação. ─ Ela parou de andar e me encarou com cara de nojo.
─ Humilhação? ─ ela segurou meu braço forte. Por que era sempre o meu braço? ─ Me beijar é uma humilhação pra você? ─ Se ela estava tentando achar algum tipo de homofobia de mim, ela não ia conseguir. Eu só achava humilhante alguém me ver beijando uma conhecida e, ainda, braço direito do meu próprio pai. Eu não consegui responder a pergunta, ela estava perto demais de mim. ─ Ouça bem, VanCite. ─ não gostava de ser chamada pelo sobrenome ─ Você não conhece a verdadeira humilhação, não ainda, e espero que nunca conheça. Se beijar é a pior coisa pra você, eu espero que se prepare para o pior. ─ Ela me prensou contra a parede de novo.
─ Da pra me largar? ─ empurrei o braço dela para o lado e continuei meu caminho. ─ Não podemos nem ter uma conversa que você já vem com esses papos estranhos pra cima de mim. ─ Bufei e segui adiante.
Aquilo já tinha me deixado o bastante de irritada. Queria saber ler a mente dos outros, igual a ela, assim saberia no que está pensando. Ela deve ser totalmente pirada, louca. Já é a segunda vez que me prensava assim contra a parede, e eu não tenho vontade de revidar ou tira-la de cima de mim. Talvez eu queira isso. Ou talvez a falta do Zayne me faça querer isso, mas não queria me aproximar de Janet assim, ou ainda não quero. Sentia como se a necessidade de ter alguém sempre ao me lado viesse novamente, mas por quem eu ainda não sabia.
Tive que ir pela primeira vez no refeitório, lugar público que eu tenho evitado desde que cheguei. Não tinha um cheiro agradável, cheiro de suor, que uma vez quase me fez vomitar enquanto comia. O que tínhamos pra comer hoje era purê de batata com molho de tomate, nada muito bom, mas é o que temos pra comer. Com a falta de Erik, não temos conseguido pegar muita comida, ele era nosso meio de transporte, esse fato preocupava qualquer um ali. Ainda não encontramos mais ninguém que podia criar portais, o que atrasava um pouco a vinda de suprimentos. Logo peguei a droga do purê e sentamos numa mesa desocupada, sem que muita gente nos veja.
─ Prefiro a merda barata. ─ Dizia olhando para, que estava sentada na minha frente comendo.
─ Merda barata não é saudável. ─ Ela garantia.
─ Mas batata tem muito carboidrato. ─ Argumentei.
─ Só come e cala a boca. ─ Ela riu baixo e continuou comendo.
Eu consegui fazer a Janet rir? Eu consegui fazer a Janet rir! Comemorei internamente, apenas com uns sorrisinhos por fora. Pra mim é uma grande conquista. Duvido que alguém seja tão importante assim ao ponto de fazer Janet rir. Fala sério, eu deveria virar comediante.
Mas ela precisou ir cedo demais. Enquanto comemorava, Janet foi chamada para a sala de reuniões. Quando foram informa-la não vieram nada felizes, eram dois homens, altos, carecas e idênticos, provavelmente gêmeos. Ela foi pisando fundo, me deixando sozinha no refeitório, no qual minha insegurança tinha voltado. Quando me deparei, já estava voltando para o quarto.
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I Think We're Alone Now - Temporada 1 (CONCLUÍDA)
ActionPRIMEIRA TEMPORADA DA SÉRIE I Think We're Alone Now PLÁGIO É CRIME! Inspiração: Manto e Adaga (2018) e The Gifted (2017) No ano de 2013, Amberly VanCite, uma garota que acaba de fazer 18 anos, se vê numa situação precária, dependendo do furto para s...