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André

Sim, ela é intensa.
Assim que ela sai pela porta da minha sala eu me permito soltar o ar que eu estava segurando.
Eu sei reconhecer uma mulher quando está com ciúmes, sei quando ela está cobrando seu lugar numa relação e eu sei que essa mulher acabou de fazer isso comigo. Talvez inconscientemente, mas ela fez.
E isso sempre foi algo que me assustou em relacionamentos.
Mas de certa forma eu achei, bonitinho? Ou pior, agradável.
Só que eu e essa mulher não temos absolutamente nada e provavelmente ela está gravida, de um otário - segundo meu pai-.
Isso tinha tudo para ser bem trágico e tudo se encaminhava para esse triste fim.
Não sei o que rola quando ela está perto de mim, mas o ar parece ser rarefeito e tudo fica muito confuso e descomplexo.
As horas se passam e eu sei que não posso ir embora enquanto ela não me trouxer os documentos confirmados e com os termos a qual estamos assinando, então como sei que vai demorar, resolvo adiantar algumas outras pendências.
Em alguma hora depois meu telefone tocou e eu vejo o nome da minha mãe brilhando na tela.
Ignoro. Não estou a fim de falar com ela nesse momento.
Algumas outras horas depois a porta se abriu e era ela de novo. Rayssa.
Aproveito para olhar o relógio e já passam das nove horas da noite. Nem vi a hora passando.
Rayssa: Pronto! - ela entra um pouco abatida e me sinto péssimo por ter feito ela ficar até agora. - Acabei demorando mais do que eu imaginava, mas está tudo certo, já enviei pro seu email tudo detalhado e é só assinar. - eu pego o documento quando ela me estende.
Começo a assinar os papéis.
André: Muito obrigada. E me desculpe por esse tempo a mais em que você teve que ficar.
Rayssa: Tudo bem, eu não ia fazer nada mesmo e você me recompensa me dando hora extra. - diz tentando soar divertida e eu orrio. Essa é a primeira vez em que ela fala comigo um pouco descontraída e eu gostei.

André: Não tem ninguém com quem você preferisse estar agora? - pergunto sem desviar o olhar e eu vejo nos dela sua resposta.
Eu sei através do meu olhar que ela tem alguém a esperando, mas não é alguém com quem ela queira estar. No seu olhar eu sei sua resposta, mas sei que sua boca falará outra coisa.
Rayssa: Ele entende. - franzo a testa e ela entende como se eu não soubesse do que está falando. - Meu noivo. Ele entende, é advogado e sabe que essas coisas acontecem. - assinto. É legal pelo menos saber que ele não encrenca com sua profissão.
Por que ela não está satisfeita? Fico com esse pensamento matutando por alguns segundos e sei que durará por algum tempo, pelo menos até que eu descubra o porque.
André: Ah sim, seu noivo. — volto minha atenção para o PC enquanto eu envio os documentos assisnados. — Meu pai me falou que você está grávida, é verdade? — sei que meu pai não afirmou, mas eu preciso saber. Passei essa semana inteira pensando nisso. — envio e volto a olha- lá.
Rayssa: Grávida? - Ela arregá-la os olhos e salta um riso nervoso. - Não! Seu pai havia me ligado naquele dia quando eu passei mal - sim, eu sabia. - E ele deduziu que eu poderia estar grávida, por causa do enjôo, mas não. Definitivamente não estou grávida.
André: Não quer ter filhos? - Ela pensa alguns segundos e responde:
Rayssa: Não me entenda mal, eu quero ter filhos, só não é ainda o momento.
André: Entendo
Rayssa: E você? Já tem filhos? - me surpreendo com sua pergunta. Ela ainda não havia demonstrado interesse na minha vida.
André: Não e não - rio. - Tenho o pensamento um pouco parecido com seu, porém eu ainda não tenho uma mãe para eles. Quem sabe um dia... - fico de pé e fecho meu notebook. - Vamos embora? - Ela parece sair do supor que sempre entra quando estar próxima de mim.
Rayssa: Ah claro, vou pegar minha coisas e vou também. - escuto seus saltos descendo a escada com rapidez e volto a sorrir.

Eu posso jurar que tenho a impressão que ela está sempre tentando fugir de mim.
Fecho minha sala e desço para o primeiro andar o encontrando completamente vazio. As luzes já estão 60% desligadas, apenas com alguns setores de manutenção ainda funcionando e o jurídico, que de onde estou consigo ver Rayssa terminando de arrumar sua bolsa.
Eu poderia ir embora e deixar com que ela saísse sozinha, mas resolvo aguardá-la.
Assim que ela fecha a porta do seu setor, ela caminha a minha direção novamente acanhada.
Rayssa: Não precisava me esperar. - eu sorrio.
André: Eu sei. - estendo o braço para que ela passe na minha frente e me recuso a reparar em sua bunda mexendo enquanto ela anda.
Ela sempre usa essas sainhas tubo apertadas demais. Acho que vou começar a proibir esse tipo de roupa na empresa...
Assim que a porta do elevador se fecha com a gente junto, me arrependo de ter esperado.
Normalmente durante o dia enfrento elevador bem mais cheio e nunca me senti tão sufocado.
Noto que ele apertou o botão 1, enquanto eu apertei o A.
André: Não veio de carro? - ela nega. No dia em que ela passou mal, lembro que ela tinha deixado o carro na garagem. Por isso sei que ela tem um.
Rayssa: Eu vim de metrô.
André: Por que não veio de carro? - ela mexeu os dedos impaciente e eu não dei a mínima. Vantagem de ser o chefe.
Rayssa: O caminho da minha casa até aqui é um pouco engarrafado e não vale a pena vir sempre. Metrô é mais rápido.
André: Quer uma carona? — ofereço mesmo sabendo que pode ser do outro lado do rio. Não me importaria.
Rayssa: Não, obrigada. - o som do elevador apita e ela como o diabo foge da cruz, em segundos já estava do lado de fora. - Até amanhã! — diz sem voltar a olhar para mim.
Não consigo responder, a porta se fecha muito rápido.
Chego no estacionamento e sigo direto para meu carro. Ligo-o e arranco para fora dali.
Enquanto escolho uma música e ajeito o ar condicionado, vejo Rayssa caminhando a passos rápidos em direção ao que sei que é o metrô.
Acho no mínimo irresponsável ela caminhar sozinha a uma hora dessas.
Passo ao seu lado devagar e abaixo o vidro.

André: Ei. - grito e ela ignora. - Rayssa. - ao chamar pelo seu nome ela olha e me reconhece. Ela franze a testa confusa e se aproxima. - Entra. - ordeno e ela parece não entender. Olha para os dois lados e respira fundo.
Rayssa: O que acha que está fazendo? - pergunta irritada.
André: Podemos conversar aqui dentro? - alguns carros atrás de mim já começavam a buzinar.
Percebendo que perdeu, ela respira fundo e abre a porta do carro.
Imediatamente seu perfume invade, me deixando quase que intoxicado.
Rayssa: Isso é uma grande besteira. - olho no retrovisor e dou partida novamente com o carro.
André: Onde você mora? - pergunto concentrado.
Rayssa: Pode me deixar no metrô, já estará me ajudando.
André: Não vou permitir que vá sozinha para casa a uma hora dessas. Foi por minha causa, então eu a levo.
Rayssa: Uma grande bobeira. - dou de ombros.
André: Pode ser que sim, mas me fará bem. - vejo de rabo de olho que ela sorriu e assim que percebeu que eu vi, virou todo o rosto para a janela.
Mas bastou para melhorar boa parte do meu dia.
É, isso tá muito estranho...

DE REPENTE, ACONTECEU...Onde histórias criam vida. Descubra agora