Como antes

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Deixo as sacolas jogada em um canto do quarto, vou para a cama e deito observando o criado mudo, em cima tinha uma luminária e alguns livros de psicologia me fazendo pensar que no outro criado mudo tinha qualquer coisa que remetesse a arquitetura. Encaro o porta retrato onde estávamos todos em um restaurante italiano, Maria e minha mãe faziam uma pose engraçada enquanto o restante de nós riamos. Era uma das fotos preferidas da minha mãe e por isso estava no seu quarto.

Alice: Então quer dizer que quando vocês desceram o Victor não estava mais lá? – escutei sua voz vinda do closet.

Ana: Sim e o Thiago estava com uma cara de bravo que o deixou ainda mais gato.

O som da sua risada foi ouvido por todo quarto, balanço a cabeça em uma negativa. Thiago estava obstinado a cuidar e proteger a minha irmã e saber disso me deixava tão feliz, a amizade peculiar que eles vem construindo é linda de se ver. Na noite anterior a vinda do Victor sondei a Bia em busca de qualquer informação que pudesse explicar seu jeito arredio com o Victor, foi aí que descobri o quanto ela precisou dele. 

Ter noção disso entristeceu-me pois eu entendia as motivações que o levará a fazer tal ato e me pegava imaginando o que faria em seu lugar, possivelmente o mesmo. 

Crianças são perspicazes e astutas, enxergam o mundo a sua maneira. Bia compreendia o porquê de suas atitudes, no entanto isso não tirava o peso de suas ações. O receio e a distância imposta por ela era compreensível assim como as perguntas que passaram a circular em sua cabecinha.

Eu iria conversar com Victor a respeito de toda essa situação, mas Thiago foi mais rápido do que eu e confesso que saber que o Victor não tinha ideia de como Bia se magoou aliviou meu coração. Porque se ele soubesse disso e ainda sim se aproximasse sem nem mesmo se retratar ou ter uma conversa com a minha irmã, as coisas mudariam de figura. Eu não deixaria Bia no meio de algo assim.

Deixo todos esses pensamentos em segundo plano quando escuto minha mãe me chamar, fico de pé e vou até seu closet a encontrando perto de umas das paredes, concentro meus olhos em torno e vejo como as gavetas, os armários e divisórias eram em uma mistura de tons pastéis com tons escuros. 

Ana: Seu estilo é bem elegante – pego os cabides e começo a pendurar as roupas com cuidado.

Alice: E o seu bem colorido – seus olhos fitaram a roupa que eu usava.

Ana: As cores combinam comigo.

Alice: Disso eu não posso discordar, você ama as cores e sempre teve um estilo único – me passou mais umas peças de roupas – Acho que exagerei nas compras – riu ao ver quantas ainda tinha que guardar – Há, antes que eu me esqueça marquei uma consulta com o meu clínico geral – fui até o espelho do quarto da mamãe e passei a mexer em sua maquiagem – Doutor Augusto, daqui dois dias ok?

Esse era o médico da mamãe e segundo ela, ele era um excelente profissional. Estávamos todos preocupados com a Maria e todas as suas queixas, se não era cansaço, era a dor de cabeça ou a falta de apetite. Tiro esses pensamentos obscuros da minha mente, Maria estava bem. Era só estresse.

Ana: Está ótimo mãe.

Deixo de fuçar nas suas coisas e volto a ajudá-la se não iríamos passar uma eternidade lá. Logo fomos para o outro cômodo do quarto e sentamos em sua cama, a conversa rolava solta e vários assuntos foram citados, desde moda até o clima que fazia hoje na cidade. Aproveito o bate papo descontraído e conto como foi a minha noite de amor com o Thiago e ela não perdeu a chance de rir de todas as minhas expressões.

Era impressionante ver como a meses atrás eu era uma garota que queria saber sobre o seu passado e com o passar do tempo encontrou o que nem sequer imaginava, uma família. O receio e o medo que tinha no começo já não existia mais, a confusão de identidade e a sensação ruim de estar roubando o lugar de alguém desaparecerá. Hoje tínhamos superado boa parte desses dilemas, faltava as memórias. Mas elas não nos impedia de ser uma família.

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