Nossa rotina tinha mudado drasticamente, a primeira sessão de quimioterapia foi dolorosa e silenciosa para todos, porém ela também foi mais um passo dado em uma luta que todos travariam juntos para vencer. Depois dessa sessão veio outra e outra e mais outra, mamãe começava a sentir o peso dos medicamentos, os olhos estavam mais fundos e a olheiras mais visíveis. As mãos tremiam constantemente assim como seu humor mudava rapidamente.
Todos nós a tratávamos com mais carinho e dedicação só que para ela era complicado se ver tão dependente de alguém, principalmente porque ela sempre foi uma pessoa ativa. Bia trazia leveza nesses momentos complicados, com seu sorriso e sem tanto dedo no modo de tratar a mamãe. Com seus prêmios malucos de bom comportamento.
Fazíamos de tudo para que ela não se sentisse mal, nas noites nos sentávamos na sala e conversávamos por horas a fio como sempre fizemos na Fazenda ou em nossa casa em São Paulo. Tinha dias que mamãe queria ficar sozinha com seus pensamentos assim como tinha dias que ela passava a maior parte do tempo falando com a Alice e o Mariano, era uma amizade especial a desses três.
Havia dias em que seu corpo doía, que ela chorava e eu secava suas lágrimas, havia dias que ela sorria como nunca e tinha os dias que a quimio exigia demais, então eu a ninava na calada da noite e velava seu sono, como ela fazia quando eu era só um garoto. Um cuidando do outro.
Ana era a mulher mais surpreende do mundo, forte. Não era atoa que era meu bálsamo, meu amor e meu refúgio. Sem o seu apoio eu não saberia o que fazer ou talvez soubesse, tinha dias em que eu pensava como seria se ela não estivesse aqui.
Como eu enfrentaria essa batalha? Possa ser que eu me reerguesse como um gigante ou talvez meu coração se fechasse para o mundo, talvez eu sucumbisse diante da dor de ver quem mais amo sofrer e não consegui fazer nada. Sempre que esses pensamentos obscuros rondava minha cabeça eu travava logo de manda-los embora. Não havia essa possibilidade, não havia nada que pudesse fazer a Ana ir embora. Disso eu tinha certeza.
Nos amávamos e compartilhamos tudo, as alegrias, as dores, a raiva e os temores. Os sorrisos, éramos cúmplices em absolutamente tudo. Nossa relação era forte e baseada em respeito e amor.
Meus sentimentos eram bagunçados e imensuráveis, bem antes de conhecer a Ana eu sentia um vazio e um medo tão grande da solidão, hoje por mais duro que seja mamãe e eu não estamos sozinhos. Tínhamos uma família um tanto peculiar que Ana nos deu ao ir em busca do seu caminho.
Bia era a criança mais especial que já conheci, com sua doçura ela enchia o mundo de luz e esperança. A garotinha tinha tomado para si não só a tarefa de cuidar da minha mãe, mas de mim também. Seu aniversário de dose anos foi a uns dias atrás e a felicidade dela ao ter a irmã e a nova família era tão genuinamente linda que não havia palavras no mundo para descrever.
Ela me fazia lembrar que mesmo cercados de momentos difíceis, devíamos prestar atenção e dar valor as pequenas e preciosas coisas da vida.
Remexo na cama e abro os olhos ao escutar ruídos vindo do lado de fora do quarto, levanto indo até a porta mas antes confiro se Ana ainda dorme tranquila. Fecho a porta ao sair e vou até ao quarto da mamãe que agora era ao lado do meu, era mais seguro assim e eu estaria a sua disposição para tudo.
Quando entro em seu quarto vejo a cama desfeita e a luz do banheiro acessa apresso-me até lá a encontrando apoiada ao vaso sanitário vomitando.
Maria: Vai embora – ela diz ao me ver – Eu tô bem e isso é nojento.
Não ligo muito para o que diz e vou até a pia, molho uma das toalhas de rosto na água corrente e me agacho ao seu lado, afasto seus cabelos e coloco a toalha em sua nuca.
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Refúgio
RomanceAna e Thiago se conheceram em um momento de dor e a conexão foi tão grande, que ambos se tornaram muito mais que amigos. Se tornaram o refúgio um do outro. O que aconteceria se nessa história um ponto importante fosse mudado? O que nossa querida An...