Sᴇᴍᴀɴᴀs ᴅᴇᴘᴏɪs.

Vɪᴏʟᴇᴛ.

Observo meu jardim enquanto pinto as unhas com o esmalte vermelho vivo.

— Lembra de quando éramos pequenas e corríamos entre os labirintos. — O tom nostálgico dela me envolve. Por um minuto vejo a minha irmã voltar. Vejo um vislumbre do que tinha dela.

— Uma vez fiquei presa no topo da árvore, de ponta cabeça. — Aponto a árvore mais longe não o suficiente para que não possa ser vista nitidamente.

— Ficou tão engraçada naquela situação — Raquel dá uma risada que vai se silenciando gradualmente.

Parada do meu lado, não ouso encará-la e continuo fazendo minhas unhas.

O clima fresco, a falta sol para nos esquentar. É como cenário cinematográfico.

— Não quero brigar contigo, só quero que me perdoe... Algum dia. — Tem arrependimento na sua voz, ou pelo menos é atriz suficiente para isto.

Raquel coloca a mão sob meu ombro ainda contemplando o horizonte acinzentado onde o sol se põe.

— É muito cedo... Um dia talvez possa perdoar, foi um peso muito grande que você não conseguiu aguentar como eu. — Deixo o esmalte sob as pernas onde contém todos os outros objetos. A loira dos cabelos mais escuros que os meus fica silenciosa.

— Nem todo mundo aguenta, nem todos são tão remodelados na frieza... Aprender a conviver com a dor é obrigatório. — Quero dialogar e entender como ela se sentiu também.

— Eu não tinha família, até que eles me tiraram daquele orfanato. — Um tom vazio e distante, junto da sua face parecendo vagar pelo passado como se o vento cuidasse disto. Ela significava o mundo para mim, e destruiu isso quando se foi...

— Por quê voltou? Por quê está aqui? — Raquel pode tentar me convencer... Não será tão fácil.

Ergui escudos tão fortes na minha mente que nem eu mesma sei como derrubá-los agora.

Fiz minha própria armadilha mental. Minha prisão.

O vento bate nas madeixas loiras dela e as faz voar.

— Eu queria ver você, saber como está e...

— Já chega desta conversa. — Não suporto o peso das palavras seguintes que viriam caso eu não a interrompesse neste momento.

Tento afastar os pensamentos que rondam minha mente atordoada e gritante.

Viro a cadeira usando o controle embutido na própria e saio do jardim.

Nada me tira que Raquel está armando algo... Sigilosa, sorrateira.

***

Não quis levantar o resto da tarde toda. O quarto todo fechado, mal vi o sol de deleitar no horizonte ou o clima mudar.

As lembranças do dia em que atirei o grampeador no Lucien, a fisioterapia, os problemas na empresa... Tantas coisas invadiram minha mente e tiraram meu sono; nem sequer tive tempo de me dar ao luxo de pensar noutra coisa.

Sinto-me tão... vazia.

Lucien me ignorou o resto da semana toda, exceto pelo seu dia de folga e quando era algum assunto da empresa. Não trocamos mais que meia palavra diariamente.

Não perguntei sobre Kate ou ele, os dois.

Meu peito arde só de pensar.

Pensar no quanto ainda tenho para resolver com Raquel.

Fingi não ter ouvido quando sai do jardim ela dizer: "Sobre a empresa, deixe isto de lado por enquanto".

Se referia a si própria e o interesse óbvio.

Aqueles olhos doces e a face de anjo, não me deixam odiá-la completamente. O rancor ainda está aqui, a dor. Mas... Ódio não.

Uma confusão. Só quero gritar, sumir e pedir socorro.

Que me tirem desta maldita sensação de pesar.

Essa casa tão grande, este jardim tão vivo. E eu... morta por dentro, ecoando como os corredores dela.

— Violet querida, não vai jantar? — Ouço Consuelo atrás da porta que abriu pouquíssimo deixando um espaço para somente sua voz entrar.

— Não, estou sem fome. — Devolvo deixando as palavras embargadas baterem entre as paredes, cor creme e chegarem até ela na porta.

A luz do abajur beijando meus olhos e deixando hipnotizada.

O vazio dos ecos pelo quarto se mistura a minha alma, repousando ali no cantinho onde tem tanto... Nada.

— Vai ficar doente, há dias você não come direito — pondera com tom preocupado.

Quero contar a ela e receber um abraço, conforto. Porém, não vai adiantar, sei que não. E desta vez não digo nem pelo meu orgulho. Tampouco pelas barreiras que criei, quem dera fosse.

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꧁ 𝙲𝚘𝚗𝚝𝚛𝚘𝚕 ꧂Onde histórias criam vida. Descubra agora