CAPÍTULO 21

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HEROUX

Bernard e eu éramos amigos desde a faculdade, então não havia nada do meu passado que ele não soubesse. Ele tinha me encontrado num dos piores momentos da minha vida e me incentivado a fazer terapia. Seu apoio foi a única coisa diferente que experimentei depois de quase oito anos vivendo nas garras de alguém que tudo o que sabia me oferecer era dor. Eu tinha ajudado Bernard da única forma que podia, lhe dando o suficiente para abrir sua firma e hoje ele era um dos melhores advogados da França.

— Achei que iria querer um tratamento vip, então vim buscá-lo pessoalmente — disse, encostado ao seu carro, na frente do hotel.

Eu tinha contratado uma empresa para lidar com a minha locomoção, mas era segunda, o dia da reunião na Arnault após a auditoria rigorosa que pedi e, também, o dia que me apresentaria como o sócio. Certamente Bernard não perderia aquele momento, por isso estava ali em seu terno impecável e com um sorriso amigável no rosto. Dispensei o motorista e mantive apenas os seguranças, não iria a batalha sem proteção. Seria loucura se o fizesse.

— Não precisava.

— Claro que precisava, acha que vou perder a oportunidade de ver a cara de François e Austin despencar ao perceber que você foi quem adquiriu a participação na empresa deles? — Entrei no carro. — Como se sente?

— Bem — respondi indiferente. Eu estava nervoso, de fato, e com medo. Passavam dezoito anos desde que os tinha deixado para trás fisicamente, porém ainda estavam na minha mente. Sempre que o nome do irmão da minha mãe era pronunciado eu via minha vida num filme de meio minuto. Via as lembranças dolorosas e exaustivas. E mesmo com toda terapia, eu me perguntava se um dia enterraria tudo aquilo. Talvez não, talvez sim, vê-los pessolamente me diria sobre isso. Ou não. Sentia que estava pronto para o que viesse, se eu desabasse que como um criança entenderia que ainda tinha muito trabalho a fazer com Sullivan, se eu me mantivesse inabalável seria a certeza de que os venci em minha vida, mesmo que aparecessem em meus sonhos.

— Que bom, mostra que a terapia deu certo. E mesmo que não tenha dado, eu estarei lá para lhe auxiliar — soou cauteloso, me encarando de vez em quando.

Acenei, um pouco aéreo. A realidade estava me batendo como um boxer raivoso. Eu sabia que, caso comprasse a Arnault, o encontro era inevitável, mas estar a caminho disso chegava a ser surreal. Eu tinha gastado anos para voltar a ter o que era meu e agora que tinha, estava me questionando se valia mesmo a pena. Aubert provavelmente estivesse certo, isso era uma obsessão descabida. Mas, ainda assim, eu precisava confirmar, precisava vê-los para saber se os tinha deixado realmente para trás. Não queria ter dúvidas sobre mais nada em minha vida. Usaria este momento como um marco de transição.

— Depois da reunião eu vou voltar para os Estados Unidos — informei, ao descermos. — Não tenho intenção de ficar muito tempo.

— Como não? Eu disse para minha esposa que jantaria connosco. Ela ficou bem animada porque finalmente vai conhecer meu amigo e sócio.

—Não sou seu sócio — embora tivesse dez por cento de participações na firma dele, eu não me considerava sócio. Só tinha assinado os papéis para ele aceitar o dinheiro. — Posso jantar com você e sua família, mas vou embora logo depois.

— Está preparado?

— Não, mas até chegarmos aqui já me conformei que isto é inevitável — peguei o crachá oferecido na recepção e coloquei no pescoço. — Não me lembrava deste lugar assim.

A decoração havia mudado de alegre para fria. Não muito distante do tempo em que vim aqui pela última vez, ingênuo demais para entender o que estava acontecendo. Eu tinha uns quinze anos na altura, ou menos, o certo é que naquele dia, no meu último dia na Arnault, dei o poder, inocentemente, a François para decidir tudo sobre os negócios que me pertenciam. E ele decidiu pensando nele.

UM LAÇO ETERNO《#Orfãos Cardin 1》Onde histórias criam vida. Descubra agora