UM LAÇO ETERNO《#Orfãos Cardin 1》

CAPÍTULO 16

ARIEL

Ficar na cama de Heroux, olhando para ele dormir com a mão estática na minha barriga havia me feito refletir bastante. Era justo que eu dividisse o peso da gravidez com alguém e ele era a pessoa certa. Por isso, quando acordei no meu quarto, após abandoná-lo de madrugada quando estava no banho, decidi que estava mais do que na hora de ele tomar frente a tudo o que se passava comigo. Ele seria meu braço direito e, como ele havia dito que estavamos juntos naquela, nada mais justo que estar de verdade. O acordei para ir comigo a reunião do grupo de apoio para mulheres grávidas em gestação de risco, que acontecia todo domingo pelas nove da manhã, o fiz me ajudar a calçar as sandálias e seguimos na sua comitiva de carros.

Heroux estava de ressaca e como eu já esperava não lembrava de muita coisa, lhe dei comprimidos e água para aliviar a dor de cabeça que sentia. Ficamos em silêncio o caminho todo e a chegada deixei a bolsa cair propositalmente para ele apanhar. Assim o fez. Chegamos a sala enorme reservada todos os domingos para um conjunto de grávidas em pânico com o nome de gordivas. Verdade fosse dita, estávamos todas enormes e o nome dado pela nossa orientadora era até fofo. Saudei e me sentei num dos sofás com o pai dos meus bebés. Recebi olhares e ignorei, era o lógico.

A conversa começou e eu fui a vítima da vez. Faltar em dois domingos seguidos, além de sujar minha imagem de segunda integrante mais pontual, com certeza colocou algumas pessoas preocupadas comigo. Há quem provavelmente devia ter me feito uma visita e pensado que estava desamparada ao não me achar, e eu estava certa, houve quem me visitou. Expliquei que estava bem e falei alguma coisa aleatória sobre meus dias, contei sobre os exercícios aquáticos que fazia com Maya, mas claro, excluindo que ela era minha enfermeira. Não demorou para comentários surgirem, principalmente o de Kelly. Ela era a esposa orgulhosa de um advogado e fazia questão de esfregar nas nossas caras sua vida perfeita, desde seus outros dois filhos rapazes indo bem na escola, suas casas nos bairros mais nobres e até os ganhos e aquisições recentes. Eles tinham duas casas, um apartamento e os últimos lançamentos da Toyota. Não podíamos morrer menos de inveja, seu chá de bebé havia sido um tour luxuoso, o tema foi “A pequena sereia”, porque ela era ruiva e estava grávida de menina.

Quando ela terminou todos reviram os olhos, agora já sabíamos que ela tinha uma casa com piscina, e que a garagem era grande que se eu quisesse poderia ficar. Heroux adiantou e respondeu que eu tinha onde ficar. Nesse instante eu vi Morgan, a pessoa mais atualizada do grupo olhar para ele com suspeita. Ela o conhecia e deixou isso óbvio ao falar para todos ali presentes que ele estava na capa da Forbes. Todos sabiam o que era Forbes então os olhares viraram mais analisadores e as conversas mais secretas. Kelly, para quem lancei o olhar me devolveu puro desdém.Que mulher fútil. Não ser o centro das atenções certamente estava lhe roendo.

— Mais um piu e vamos para todos para o tapete! — Nossa orientadora gritou possessa.

— Ah, qual é? Eu fico todo dia de cama e hoje é o único dia que tenho contato com pessoas e a oportunidade de conversar com alguém. — Uma grávida resmungou.

— Ariel, ele é o seu casinho de uma noite?

— Chega! Todo mundo para o tapete, sem sapatos.

Aquilo foi uma ordem que ninguém contestou, e a parte do sem sapatos era punição perfeita para alguém que mal conseguia inclinar. Há semanas atrás eu estaria em alvoroço segurando minha cabeça e me questionando sobre como fazer tal tarefa com um obstáculo. Era uma das três sem companheiro para perguntar se necessitava de mais almofadas para as costas ou ir buscar minha comida nos encontros em que serviam almoços. Entretanto, com Heroux estava fácil, pedi para me tirar a sandália fugindo da sua questão sobre a pergunta constrangedora de uma das gordivas. E pedi para que ele ajudasse também as outras grávidas que não tinham ninguém, ele fez sem hesitar, elas sorriram para mim e agradeceram. Eu não estava ali para usar Heroux como troféu, ele não era nada meu. E mesmo que fosse eu não faria tal coisa, eu mais do que ninguém sabia como era estar sozinha ali, sem ajuda e seria contraditório não ter um pouco de empatia com alguém que estava numa situação desfavorável em relação a minha.