capítulo um.

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Preciso de um tempo e várias respirações profundas para entender. Sinto meu sangue borbulhar por debaixo da minha pele, como se eu queimasse por dentro.

Sinto os olhares me avaliando, como se eu fosse alguma bomba prestes a explodir, mas eu não faço nada. Eu apenas congelo e prendo a respiração.

Meu buquê ㅡ que eu fiz questão de escolher a dedo ㅡ cai ao chão, se espatifando em um tapete de pétalas.

Gemma me chama, mas a voz dela é apenas um eco infinito na minha cabeça. Não ouço, não vejo, não raciocínio. Sou apenas um montante de pensamentos desconexos. Eu preciso respirar.

Eu preciso respirar…

Eu preciso…

Meus joelhos cedem e eu caio ao chão. Liam tenta me amparar, mas é em vão, eu já toquei o chão de madeira. Sinto as lágrimas rolarem por meu rosto como cachoeiras desgovernadas.

Aron não fez isso, ele não pode ter feito isso…

Reúno toda a minha força e sussurro, mais uma vez, implorando:

ㅡ Cadê o Aron? ㅡ Minha voz sai tão baixa que nem eu me escuto.

Minha mãe se ajoelha em minha frente, seus olhos inundados em água ao passar os dedos pelo meu rosto.

ㅡ Filho… ㅡ ela sussurra e estende a mão para o meu pai. Um bilhete. É isso que ele entrega a ela. ㅡ Os pais dele nos deram isso. Nem eles sabiam que isso ia acontecer, mas quando ele demorou a vir, eu acabei abrindo, e… ㅡ sua voz falha.

Ela não precisa terminar. É uma despedida.

Uma despedida. Por bilhete. Após sete anos de relacionamento.

Me solto de Liam apenas para arrancar o bilhete das mãos da minha mãe. Meus olhos estão embaçados pelas lágrimas, mas faço questão de lê-lo.

Penso em todos esses anos… em todos os anos que me dediquei a ele, que me doei, que me entreguei. Todos esses anos resumidos em uma folha de papel amassada. Não tinha um envelope e muito menos um laço para amenizar o soco. Nem com isso ele teve o cuidado.

Meus dedos trepidam e eu lembro de como eu sonhei com esse momento. Em como sonhei em me casar com o meu amor da adolescência. Em como eu imaginava que passaria o resto da minha vida com o menino tímido que conheci nas aulas de biologia do ensino médio. Aquele que me roubou um beijo e me fez contar estrelas em uma noite estrelada de inverno. Que me fez acreditar em mim e correr atrás dos meus sonhos. Quem me fez acreditar que eu seria um grande policial, mesmo eu tendo inúmeras inseguranças. Quem me fez centenas de promessas entre os lençóis. Quem me fez sonhar com uma família. Quem compartilhava comigo a vontade de adotar uma criança de pele preta clara, para que ela fosse uma mistura perfeita de nós dois.

E olha só, tudo agora se resume a um bilhete…

Abro a folha, sentindo meu coração explodir no peito, como se eu estivesse sendo apunhalado da forma mais covarde existente.

Harry,
Não sei como começar a escrever este bilhete, mas preciso começar pedindo que me perdoe. Não conseguiria dizer nada disso olhando para você. Somos novos, e acabamos tomando um passo inevitável. Há semanas que tenho me questionado se é isso mesmo que eu quero. E não digo sobre você, digo sobre o casamento. É um passo muito importante, é uma escolha que deveria ser para a vida toda e infelizmente eu não tenho certeza se quero passar a vida preso em um casamento. Sei que, se eu fosse casar com alguém esse alguém seria você. Mas não quero me casar, não quero firmar esse compromisso sem ter a certeza que daqui três anos eu vou estar feliz. Eu estou em pânico e peço desculpas por te fazer passar por isso, mas preciso pensar em mim. Por isso, decidi não dar continuidade a este casamento. Sua família sempre nos pressionou a casar, assim como você nos últimos meses também se tornou fissurado com a ideia, eu apenas segui o fluxo. Sei que errei em não ter dito antes, mas eu nunca fui conivente com a ideia. Não se preocupe, eu irei arcar com metade dos gastos, não deixarei seus pais com dívidas que não são deles. Não duvide que você é o amor da minha vida, porque você é… eu só não estou pronto para me comprometer pelo resto dos meus dias. Espero do fundo do meu coração que me perdoe, e quando estiver pronto para conversar, sabe que eu estarei aqui. Não quero te perder, mesmo sabendo que já te perdi. Não sei como ficaremos de agora em diante, mas quando você estiver bem, me procure, posso separar suas coisas que ficaram no meu apertamento, ou poderemos continuar de onde paramos, sem pressão, sem ressentimentos… isso cabe a você decidir.

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