RELUTANTE

capítulo vinte e sete

Li uma vez, em uma revista de astronomia que: astronautas que passam muito tempo no espaço, usufruindo de pouca gravidade, normalmente perdem massa muscular no coração, fazendo com ele diminua de tamanho. Eu tenho me sentindo como um astronauta, mesmo com os pés cravados em terra firme e envolto por gravidade.

Faz três dias que bombons são deixados em minha mesa, três dias que Louis cruza comigo no corredor e não me olha nos olhos, três dias que eu me faço de invisível para que ninguém veja a minha dor, três dias que eu sinto como se meu coração diminuísse de tamanho.

A vida tem sido dura comigo, e às vezes me questiono se fiz alguma coisa tão ruim para merecer metade das coisas pelas quais eu passei.

Antes de ir para a delegacia, eu passo no consultório de Dr. Antony para a sessão da semana. Pensei em desmarcar, mas no fundo, sei que preciso das palavras dele. Dr. Antony sabe exatamente o que dizer quando estou perdido, e por mais que talvez não absorva as coisas que ele me diz na hora, eu sempre lembro delas em algum momento. Ele talvez me conheça mais do que qualquer um, e é confortável estar na presença dele, mesmo quando não tenho nada a dizer. Assim que entro no consultório, seus olhos pousam em mim, e ele me lança um sorriso gentil. Não consigo dizer nada, e apenas caminho de cabeça baixa, me sentando na poltrona em frente a ele.

ㅡ Bom dia, Harry. ㅡ Ele diz com a voz calma de sempre, só que dessa, diferentemente das outras sessões, sua voz sai mais baixa. ㅡ Eu não irei te perguntar como está se sentindo, porque vejo que não está se sentindo muito bem hoje. Quer me contar o que aconteceu?

Fico em silêncio por um instante e não ergo o meu olhar. Me encolho na poltrona, encostando as minhas costas no encosto de veludo, e sinto meu olhos arderem.

ㅡ O senhor se importaria se eu ficasse calado hoje? ㅡ Digo sentindo a primeira lágrima rolar de meus olhos. ㅡ Eu só preciso chorar um pouquinho, e prometo não fazer muito barulho para não incomodar o senhor.

Quando termino a frase, eu desabo. Escondo meu rosto com as mãos e choro.

Choro por os sete anos da minha vida que foram jogados no lixo, choro por ter sido abandonado no altar, choro pela traição de Aron, choro pelo bilhete, choro pela festa perdida, pelos presentes que ele que quebrou, choro por Louis, choro por nossa história, choro por não ter tido a oportunidade de conhecê-lo de outra forma, choro pela a vida não ter sido delicada comigo, choro por meu coração ser idiota, me fazendo me apaixonar pela única pessoa pela qual eu não queria me apaixonar, choro por tudo que foi arrancado de mim, choro por não poder ter a oportunidade de saber como é ser amado direito, choro por tudo e por todas as coisas.

ㅡ Harry, ㅡ Dr. Antony me chama com a voz baixa ㅡ eu posso esperar até que você se sinta confortável para me contar tudo o que aconteceu para você ficar assim. Mas, quero te dizer que não tem problema nenhum em chorar. Às vezes nossas emoções extrapolam o limite, e a única maneira que conseguimos controlá-las é através do choro. Se suas emoções estão bagunçadas, liberte-as, e recomece. Você enfrentou muitas coisas durante os últimos meses, e tem o total direito de se sentir da maneira que quiser a respeito de tudo. Mas lembre, Harry… o momento mais escuro da noite, é quando está perto de amanhecer. Nenhuma escuridão dura uma eternidade.

Limpo as minhas lágrimas, à medida que novas lágrimas se formam e não digo nada... eu não consigo dizer nada. Dr. Antony parece perceber, e continua:

ㅡ As vezes achamos que a dor, que a angústia, que a tristeza e que mágoa nunca irão passar. Mas tudo passa, Harry. Até aquilo que é bom. Compreenda que somos feitos de fases, como a lua, e é normal ficarmos tristes e perdidos. Mas é só uma fase. E quando ela acaba, começamos a enxergar as coisas de outra forma. Sinta-se lisonjeado de sentir. Você sempre sente muito, Harry... Mas tente pensar pelo lado bom, algumas pessoas não sentem nada. O excesso é ruim, mas é o escasso que maltrata.