Estupidez

Sessão de Fotos

Flash atrás de flash.

Ámbar já estava acostumada. Seus olhos mal se incomodavam com a luz dos refletores e o barulho tão característico dos bastidores não atormentavam mais seus ouvidos. Eles eram tão corriqueiros em sua vida que haviam se tornado tão naturais quanto o ar que entrava em seus pulmões a cada respiração.

Ela teria um dia lotado. Sua assistente Jazmin a perturbava desde o raiar do sol, repetindo a cada segundo todos os compromissos inadiáveis que estavam marcados, como um disco arranhado.

Estava ficando insuportável.

Não era exatamente sua assistente que Ámbar não conseguia mais aguentar. Ela gostava de Jazmin, mesmo com as loucuras diárias e os momentos agoniados. Sua assistente era uma boa pessoa. No entanto, a modelo queria algum momento de descanso, algum momento de silêncio.

Silêncio. Uma palavra de oito letras. Um desejo que Ámbar almejava a cada novo segundo com todo o seu corpo. Há tempos havia vivenciado um momento assim que nem conseguia se lembrar de como a sensação de calma podia ser tão reconfortante.

—Levante mais o queixo – ela o fez prontamente, com perfeição – Isso! Fique assim, não se mexa. Está perfeito!

Mesmo com a notável empolgação do fotógrafo, ele continuava o seu trabalho em silêncio. Ámbar o conhecia o suficiente de alguns trabalhos anteriores para dizer: Ele era um homem talentoso de poucas palavras.

Flash atrás de flash.

Os músculos contraídos do corpo dela permitia-a se sustentasse na pose correta pelo tempo que fosse necessário. Esse era o seu trabalho e Àmbar o amava, mas a tensão que se formava em seus ombros todas as noites revelava o que ela já sabia. A rotina corrida estava acabando com ela mais rápido do que gostaria de admitir para os outros e, principalmente, para si mesma.

—Sorria e feche os olhos. Eu preciso que mude de posição - o fotógrafo se posicionou, imitando como ela deveria ficar e acrescentou. – Fique assim.

Ámbar respirou fundo e mudou a postura, conforme orientada.

As sessões de fotos desenrolavam-se com espontaneidade e cumplicidade, porém, hoje, algo estava diferente. O grande e suntuoso desfile que havia protagonizado há dois dias parecia ter esgotado toda sua energia para o trabalho. Talvez ela realmente devesse ouvir seus amigos e tirar alguns dias relaxantes de férias. No entanto, isso não era tão fácil quanto pensavam. Estava dividida. Uma parte sua, rogava por descanso e tranquilidade, longe de contatos, sessões de fotos, desfiles, provas de roupa e produtos. Longe de trabalho. Enquanto, a outra parte fazia questão de recordá-la do compromisso com o que fazia, da própria inquietação ao se manter longe da rotina intensa e da dificuldade de não pensar nas situações e nas obrigações que direcionavam a ela.

Os novos contratos de publicidade vieram em mente. Vários deles eram excelentes e encontravam-se empilhados sobre a mesa de Ámbar, esperando ansiosamente sua assinatura. Era certo que, independente de qual contrato ela escolhesse, seriam mais quatro meses ininterruptos de trabalho, viajando de país em país apresentando o novo produto que, quem sabe, nem ela mesmo realmente o usasse.

—Intervalo – Ámbar ouviu alguém gritar.

"Finalmente", ela pensou.

Sua garganta ansiava por um pouco de água há tempos. Um copo seria de boa ajuda no momento. Levantando, Ámbar começou a se afastar do alcance luminoso e incandescente dos refletores, piscando repetidamente em uma tentativa de fazer seus olhos se acostumarem com as luzes mais calmas dos bastidores.

Ela deteve o passo, bruscamente.

O frio na barriga ressurgiu inesperadamente, acompanhado do descompasso forte do coração que duplicava seus batimentos desesperadamente como uma adolescente apaixonada. Por um momento, Ámbar retrocedeu no tempo, viajando de volta infância, onde inexplicavelmente seu corpo externava sentimentos e sensações completamente desconhecidas e assustadoras apenas com a ligeira troca de olhar com um garoto bonito específico da escola.