TRANS FORMAR

Dança

Momentos
Os atravesso um a um
Nunca sou a mesma

Alguns são extraordinários
Transcendentais
Apenas neles sou sem culpa, sem vergonha e sem rancor

Como quando entrego meu corpo a música

Ao dançar me afogo,
perco a ilusão do controle que um dia acreditei ter

Sou arrastada por uma força maior emanada dentro de mim
Vibrando viva

Meu turbilhão interno é transformado em algo grandioso
O som da música se funde em minha alma

Me torno inexplicável
Experiencio a unicidade de simplesmente ser
Pura integração

Momento fluido como uma gota de orvalho
Que se liberta ao cair de uma folha,
voltando a se juntar ao todo no rio
Renascendo de novo e de novo

Pertencer ao rio
Levitar aos céus
Ser leve como nuvem
Despencar no infinito
Arremessada até o aconchego de uma folha
E por fim escorregar dela pro fluxo de infinitude

Dançar é me concretizar em ação
É ter consciência de que faço parte do fluxo da vida
Me tornar irremovível

As marcas que os movimentos os quais dou vida deixam,
mesmo quando invisíveis,
são como gritos e berros no oculto éter

Embora nem por isso eu seja eterna
Sou efêmera

Uma gota d'água que em breve retorna ao oceano
No balanço do mar, bailar encantado da sereia
Navegando no princípio e fim vital

Fim

Depois de tanto movimento tudo parece ser absorvido ao nada

O fim de meu ballet rodopiante chega quando tudo para

Não há mais o fluxo sereno das ondas

Os sons coloridos se apagam junto com o brilho de minha consciência

Deixo de ouvir a intensidade da música

Meu corpo desliga-se, caindo no chão

O vazio que me espanca na queda o deixa dolorido

Deixo de ser tudo
Passo a ser nada

Nada é capaz de me levantar

Apenas eu e o silêncio

Na esperança de ser devorada pelo tempo

Até que a vida possa um dia

Invadir novamente meus tímpanos

Bailar lindamente em meu entorno

Me usar como ferramenta pra algo supremo

Preencher cada pedaço da vastidão vazia

Trazer significado a cada coisa existente

Tudo costurado em uma única obra prima, sinestesia pura da realidade