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Que verdadeiro passado? Do que raios você está falando?

— É uma longa e complicada história. Certamente vamos precisar de mais de um dia para que você entenda tudo.

Para mim, já era incompreensível.

Entusiasmo brilhava em seus olhos e seria contagiante caso eu não achasse que ele estava delirando. Porém eu não podia insistir na ideia, já que agia de modo são. Hale não demostrava indícios de delírio e não acho que algum dia chegaria a ter.

— E talvez... Ah, Gaëlle, — ele segurou as minhas mãos — talvez possamos voltar para onde tudo começou. Talvez você possa conhecer a pessoa que mais te ama no mundo e espera ansiosamente que volte para casa.

— Por que não me diz quem é ela?

Seu sorriso se foi tão rápido quanto uma chuva no deserto. Os olhos ainda tinham um pouco do entusiasmo, mas tomaram um brilho de amargura. Pude ver por sua mandíbula que ele cerrava os dentes e eu soube que estava com raiva. Seu corpo se enrijeceu. Não de dor, não de cansaço, mas de ressentimento.

— Esquece. Acho que me sobressaltei. — Sua voz apenas confirmou a raiva. Hale retornou os olhos para mim. — Mesmo assim, há muita coisa que não te contei e que explicam um pouco sobre isso que estamos vivendo agora. E o que podemos viver depois.

— Então me conta.

Hale encarou meu colchão sujo, próximo ao dele. E depois, encarou a porta.

— Descanse — disse.

— O quê? Você enlouqueceu?

Ele abaixou o olhar para mim.

— Não temos muito tempo, Gaëlle. Vai precisar estar descansada. Eu cuido da porta.

— Está delirando. Você me joga uma bomba e não vai deixá-la explodir?

Seu rosto beirava a seriedade.

— Se eu estivesse delirando, você não precisaria me dizer isso. O que vamos fazer hoje à noite não vai te dar descanso tão cedo. Precisa estar o mais descansada possível.

E ele também não precisava?

— Por que não me diz logo de uma vez por todas o que vai vir esta noite?

— Porque você vai ver com seus próprios olhos. Não há necessidade de contar.

Quis protestar. Tentei achar vários argumentos quando abri a boca para argumentar, mas meu irmão apenas ergueu as sobrancelhas.

Então fiz conforme ele pediu e ao deitar, percebi o cansaço. Hale permaneceu sentado, encostado na madeira velha do pequeno quarto, observando a porta e às vezes olhando para mim.

Acho que demorei mais que o desejado para cair no sono. Mas assim que aconteceu, tive certeza de que Hale estava certo: algo iria acontecer.

* * *

Eu não fazia ideia de que horas eram quando Hale me arrastou para fora da cama. Também não sabia como ele estava tão animado; a sua febre tinha diminuído.

Antes de me acordar, ele catou a comida que Tinny havia nos dado, deixando um bilhete para senhor Rews que a encontrasse e devolvesse a bolsa para ela. Também guardou os remédios em uma trouxinha de lençol e organizou o pouco que tínhamos, deixando os colchões lado a lado e os travesseiros de pano arrumados, como sempre costumava fazer antes de sair.

O relógio batia quase uma da manhã. Não havia guardas no corredor. O museu escuro causaria terror em qualquer criança. A única luz presente era a que a lua refletia para dentro, por meio das janelas enormes e desgastadas.

Arthora | A Queda de Um ImpérioOnde histórias criam vida. Descubra agora