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O sol queimava e reconstruía minha pele. A terra fresca e escura sob meu corpo era, de alguma forma, reconfortante. Eu ouvia o barulho das árvores lá longe. Também ouvia o som de um rio próximo, violento e vertiginoso. Eu sentia meus pulmões se expandirem e depois se retraírem em um intervalo de tempo quase desigual.

Eu ouvia o tique-taque bem alto pulsando em meus ouvidos. Foi por ele que eu soube que estava viva. Ou talvez, não.

Abri meus olhos, deixando a luz me cegar. Ao meu redor, trigo balançava com o vento, alto e calmo. Estava no meio deles. Eram amarelados e muito bonitos.

Com dificuldade, consegui me sentar, percebendo que eu não alcançava nem metade da altura da plantação. Minha cabeça latejava. Minha garganta doía. Eu estava um pouco zonza e havia uma estranha pontada de dor que se erguia pelas minhas costas e percorria minhas veias até as solas dos pés.

Respirei fundo, tentando controlar minha respiração entrecortada e ofegante. Minhas mãos formigavam como se tivessem ficado paradas até demais. O vestido ainda me envolvia; sujo, um pouco molhado, mas nada que indicasse sangue.

Contei até três e me levantei.

Porém minhas pernas estavam molengas e eu tombei, tentando me segurar para não bater a cabeça no chão. Me levantei de novo, ainda um pouco sem equilíbrio. A plantação de trigo batia na altura dos meus ombros. Era enorme. Em um vasto campo, maior do que alguém poderia simplesmente supor. Eu não via o fim.

Um vento fresco e gelado passou por meus ombros e, por mais que as mangas do vestido chegassem até a metade do cotovelo, eu senti um pouco de frio. O sol estava alto e não havia sequer uma nuvem no céu.

Olhei ao redor. Atrás de mim, lá longe, uma pequena casa, sem cor e no meio do nada, jazia.

Não havia nada ao redor dela, não havia nada que indicasse que alguém morava lá dentro ou perto.

A passos hesitantes, porém rápidos de curiosidade, eu caminhei até ela. Não havia outro lugar para ir. Se eu já estava morta, então nada poderia me matar... certo?

Conforme me aproximava, a casa parecia bem mais triste. Solitária, deprimida.

Os pequenos tocos de madeira estavam encharcados. A entrada estava um pouco quebrada, mas de frente, parecia bem conservada. Suas janelas estavam opacas e escuras e passavam um ar sólido e triste. O branco estava um pouco sujo, e as plantas ao redor da casa estavam mortas. O pano de entrada estava mofado, embora não tivesse como molhar aquele lugar, já que a cobertura enferrujada, mas boa, cobria-o.

Não consegui ler o que o tapete dizia. Não sei se dizia algo. E, por um momento, senti raiva, porque queria entender.

Girei a maçaneta, empurrando a porta. Estava trancada.

Olhei ao redor, procurando algo ou alguém. Alguma chave. Olhei debaixo do tapete, entre as flores mortas e na madeira podre do assoalho da casa. Não havia nada.

Foi então quanto senti algo queimar em meu bolso. Era pesado e quase quis me puxar para o chão. Puxava o vestido e o deixava torto em meu corpo. Eu enfiei a mão no bolso do vestido, retirando um pequeno molho de chaves. Haviam três, cada uma de uma cor, tamanho e formato, todos diferentes. Não eram maiores que minha mão, mas eram pesadas.

A primeira era azul. Mas não era bonito. Era triste, um pouco apagado, e com algumas lascas. Correspondia à cor da fechadura da porta.

A segunda, era vermelha. Pulsava diante dos olhos; a cor mais viva que eu já vi.

A terceira, era rosada. Simples e suave, a terceira chave eu não sabia a que relacionar.

Eu peguei a primeira, enfiando-a na fechadura e destrancando a porta com facilidade. A casa estava uma bagunça. Papéis, lascas das paredes, algum tipo de pó que cobria o chão e tinta vermelha espalhada pelo piso velho de madeira.

Arthora | A Queda de Um ImpérioOnde histórias criam vida. Descubra agora