Eu gosto de evitar rendas. A maioria é desgastada ou "comida", o que torna os vestidos mais feios piores do que são. Não gosto de rendas porque são feias, e não é necessária para que uma roupa seja bonita.
Mas um vestido com rendas bem cuidadas, trabalhadas à mão, e traçadas com fios de ouro é especialmente bonito. Eu poderia dizer que estava bajulando a herdeira, mas ela ficou linda de verdade. Tão linda que eu podia ter jurado ver um brilho apaixonado nos olhos do meu irmão quando ele espionou pela porta do quarto de Zylia enquanto ela se observava no espelho.
O quarto de Zylia não era só composto por cores claras, mas era tão fofo e adulto ao mesmo tempo que quase chorei. De verdade. Não parecia o quarto da mulher que usava roupas grossas e pretas de couro o dia todo, liderava um reino enorme e não tinha dó de atirar quando necessário, independente de quem fosse. Ela poderia ter me matado naquela noite que fomos cercados. Deve ser por isso que ela cultivava dois jardins mágicos escondidos por aí.
— O que você acha? — Não sei por que ela perguntava minha opinião. Tinha tantas outras pessoas no reino e ela decidiu perguntar pra mim. Ela mal me conhecia.
E tinha Eliya. Eu não me considerava boa em opinar sobre roupas tanto quanto qualquer um em Álix devido às circunstâncias da minha adolescência.
— Bonito?
Ela negou, rindo.
— Se for devolver com uma pergunta, pode deixar que eu respondo.
— Desculpe. Não sou muito boa com roupas.
Ela retirou os olhos do espelho enorme que estava na sua frente, e pousou-os em mim, sem descer da plataforma redonda e branca. Era um pedestal para deixá-la mais alta diante do espelho.
— Só seja sincera. Quero sua opinião.
— O que acontece se eu não gostar? Você vai me bater?
Ela gargalhou. Eu também sorri.
— Você está me julgando mal. Se disser que não gostou, eu vou trocar. Tem outros modelos.
É claro que tinha. Ela era uma princesa. E tinha dinheiro. Ela sempre poderia ter outros modelos de vestido.
— Por que quer minha opinião?
Zylia respirou fundo.
— Porque vocês arthorianos costumam ser muito sinceros. E, não que não saibam esconder, mas vocês não tem medo de chatear outra pessoa quando comentam alguma coisa. — Errada ela não estava. — Preciso de alguém assim. Não comemoro meu aniversário faz um pouco mais que quinze anos. Quero fazer algo decente.
Quinze anos! Uau. Eu não comemorava o meu fazia... bem, desde o último, quando eu e Hale compramos profiteroles com uma grana surrada que juntamos durante o ano.
— O vestido é bonito — falei.
A tenente, herdeira, princesa, levantou as sobrancelhas.
— Mas?
Analisei o rosto dela.
— Mas a cor deixa suas bochechas muito escuras e realça as olheiras. A cintura está alta de mais e não valoriza o seu corpo e o caimento dele é muito robusto. Você é uma pessoa elegante, deveria começar por ai.
Ela parecia um pouco indignada. Pensei em coisas ruins. Afastei o pensamento. Lembrei do que Hale disse, e do que Renoward me disse também. Já chega disso. Precisava mesmo arrancar o espinho. Zylia não faria nada comigo.
Ela voltou a se olhar no espelho.
— É, acho que você tem razão. — A tenente analisou um pouco. — O que você sugere?
Olhei ao redor, reparando nos vestidos espalhados e jogados em cima de puffs, sofás, cadeiras e até nos ganchos. Alguns continuavam na arara atrás de Zylia, encapados cuidadosamente por um tecido escuro.
Levantei de sua cama e caminhei até o cabideiro, tentando pensar de alguma cor que não lembrasse o amarelo que ela usava. Amarelo não ficava bom nela.
Olhei o esboço feito no papel na frente das capas. Eu poderia escolher um dos que ela já tinha experimentado, mas nenhum deles tinha ficado exatamente bom.
Com cuidado, abri a capa, retirando o vestido com o cabide e revelando sua bela cor vermelha. O vestido tinha um caimento suave. Era feito com organza. As alças cruzavam-se na frente e desciam depois dos ombros, formando uma capa tão leve quanto um véu. Ele era na altura do joelho, o que mostraria o necessário e nada mais que isso. Não era vulgar e não cobria demais.
Perfeito.
Ergui para que Zylia pudesse ver. Seus olhos se iluminaram e ela abriu um sorriso.
— Sabe, de repente, eu apoio ainda mais a ideia de você na liderança.
Dei de ombros e caminhei até ela, entregando o vestido.
— Acho que vai deixar seu rosto mais iluminado. Ah, e... — observei as joias por um momento. — use a terceira joia. Vai cair certinho.
Zylia não esperou muito para ir provar.
Nesse meio tempo, me sentei na ponta da cama de Zylia novamente, tão arrumada e esticada, sentindo o colchão afundar.
Eliya entrou no quarto no momento seguinte com uma prancheta.
— Onde ela está? — sussurrou.
Não entendi por que ela o fez, mas sussurrei de volta:
— Provando outro vestido. Por quê?
— Nada. — Ela veio até mim. — Quer dizer, tem um motivo, sim. Assine aqui.
Eliya me entregou a prancheta.
— O quê? Pra quê?
— Está escrito ai. Leia rápido.
Eu li. Não sei se concordava.
Aparentemente, Eliya e os outros planejavam jogar um certo tipo de luz ao céu na comemoração do aniversário de Zylia. Eram como borboletas brilhosas que desenhavam no ar. Eu não conhecia a tenente então jamais saberia dizer se ela gostaria de ver. As assinaturas diriam quem apoiava a ideia de surpreendê-la com isso.
— Tem certeza disso?
A garota de cabelos marrons hesitou. Trocou o peso de um pé para o outro, cutucou as cutículas. Mordeu os lábios.
— Na verdade não. — Eliya ainda sussurrava. — Não fazemos isso há muito tempo. Tenho medo de ela não gostar.
— Então não faça. — Ergui a prancheta para ela. Eliya não pegou.
— Queremos. Achamos que vai animá-la.
— Mas você tem medo de ela não gostar.
— Eu sei. É um risco a correr.
Respirei fundo. Molhei os lábios.
— Olha, se você quiser eu pergunto a ela.
Ela hesitou.
— Como?
Dei de ombros, analisando as palavras do papel branco. Tão branco que era quase transparente.
— Vou dar um jeito. Mas não vou assinar isso.
— E se ela aceitar?
— Ainda não vou assinar. Não gosto de barulhos altos.
— Não fazem barulho. — Ela riu. — Tudo bem. Pergunte a ela e me procure depois.
Assenti e a observei sair bem a tempo de Zylia abrir a cortina que ficava em seu quarto, separando o closet do restante do quarto.
E ela estava perfeita.
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Arthora | A Queda de Um Império
Fantasy[Obra concluída ✔] Há 980 anos, Arthora, um dos Sete principais Reinos, foi escravizado. Gaëlle Provence é descendente dos escravos, e esteve nos campos de escravidão quando era uma bebê, até que seu irmão, Hale Provence, fugiu com ela para evitar s...