Os dias se passaram como um borrão. Eu apenas existi. E, embora isso quase não fizesse diferença para mim, o turbilhão de pensamentos que girava dentro da minha cabeça quase me deixava louca.
A princesa conhecia meu irmão. Ela ajudou meu irmão a sair de Sulman e a fugir. Essa era uma informação que não entrava na minha cabeça.
Simplesmente eu não conseguia entender como. Como poderia, minha família, ter tanta ligação com a realeza de Sulman? Eu começava a desconfiar que eu era um ímã para desastres e cortes que queriam me matar.
Não sei se Renoward chegou a ler a carta, mas imagino que sim. Nenhuma delas acompanhava data, o que dificultava a minha situação. Não sei quando elas foram escritas. Meus pensamentos corriam mais rápidos do que minha mente, me deixavam confusa, exausta.
Eu chorei em um momento, depois me irritei e derrubei parte dos livros da prateleira no chão. Uma hora eu estava apática. No outro momento, havia tanto pensamento, que eu não sabia o que pensar primeiro. As vezes me encolhia, sentindo os pés gelados como nas noites que passei entre as paredes do museu.
Andei de um lado para o outro. Cheguei a um ponto onde tinha cansado de pensar, mas eu não conseguia parar. Tudo me levava a etapa zero, onde as hipóteses são soltas e não tenho como ligá-las.
Não sei porque Renoward não mencionou aquilo para mim. Se ele o tivesse feito, as coisas teriam andado em um rumo diferente. Talvez eu não teria acreditado nele caso esse assunto saísse de sua boca, mas ele tinha provas. E eu segurava uma delas na minha mão.
Eu li, e reli, e li novamente, sentindo as mãos trêmulas toda vez que passava pelo nome do meu irmão. A não ser que fosse a maior coincidência da minha vida, Hale conheceu a princesa de Sulman. Ele nunca havia comentado comigo sobre quem o ajudou a fugir. Eu tive coragem para perguntar apenas uma vez.
Parecia um assunto um pouco íntimo demais, cujo a carta da princesa acabava de confirmar minhas suspeitas. Eles tinham prometido um ao outro nunca dizer nada a ninguém.
Dois dias se passaram e eu apenas afundava cada vez mais no desespero; na confusão. Não sabia o que pensar, o que fazer. Chorar parecia ser a decisão mais óbvia.
— Gaëlle? — Uma voz conhecida me fez relaxar.
Saí do pequeno closet, indo até o quarto, onde Zylia, Aaden e Eliya entravam. Zylia estava com o nariz vermelho, as bochechas mais rosadas e suas olheiras pareciam bem maiores que o normal. Suas mechas pareciam ter perdido o brilho e o prata, ficando cinzentas com as nuvens em uma forte tempestade. Eliya estava igual, porém bem mais vermelha. Aaden estava apenas cabisbaixo.
Senti as lágrimas mornas e salgadas escorrerem pelo meu rosto. Lágrimas de desespero, confusão. Saudade. Ah, eu sempre sentiria muita saudade de Hale.
— Oi — sussurrei.
Zylia abriu um pequeno sorriso sem graça, e observei duas lágrimas solitárias escorrerem por seus olhos. Não pude deixar de imaginar pelo que ela passava no momento.
Hesitante, ela se aproximou. Desabei em lágrimas quando a tenente me envolveu em um abraço maternal. Lembrei do quanto Hale era feliz com ela, do quanto ele desejava estar com ela, mas sempre respeitava seu tempo. Hale estava, claramente, apaixonado por Zylia. E ela seria uma ótima cunhada.
— Sinto muito — disse ela, com a voz trêmula.
Me afastei, desejando arrancar meu coração para não sentir mais. Não estava certa se aguentaria até o final.
Senti Aaden se aproximar e, hesitante, colocar a mão no meu ombro. Olhei brevemente para ele, me sentindo quase constrangida por chorar como um bebê na frente de um soldado.
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Arthora | A Queda de Um Império
Fantasy[Obra concluída ✔] Há 980 anos, Arthora, um dos Sete principais Reinos, foi escravizado. Gaëlle Provence é descendente dos escravos, e esteve nos campos de escravidão quando era uma bebê, até que seu irmão, Hale Provence, fugiu com ela para evitar s...