Capítulo 24 - A grande cerimônia

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É bom ser mulher outra vez. Os soldados passam por mim me olhando com cobiça ou indiferença, no geral sem perder tempo me parando já que minhas roupas indicam que sou uma serviçal de alto escalão. Uma dama de companhia, provavelmente. Os criados abaixam o olhar ao passar por mim.

Tento ao máximo empurrar para longe os pensamentos sobre o Dragão e tudo que ele disse. Jun tem que estar bem e irei encontra-lo. Tenho a sensação de que estou deixando algo passar, que o Dragão se deixou ser impedido muito facilmente — não que eu esteja iludida sobre a facilidade com que ele irá fugir daquele quarto, mas ainda assim me preocupa a passividade com que se deixou trancar. — quase me sinto tentada a voltar e verificar o templo e os jardins para me garantir de que Jun não estava realmente lá a mercê dele.

Passo pela sala da coroa, que está vazia. Não há ninguém na gruta da deusa. Lembro-me de Jun ajoelhado em frente ao vidro, sua expressão de desamparo e o imagino ali de novo, rezando antes da coroação. De repente meu pensamento é turvado pela imagem mais sombria de um homem do Dragão, infiltrado, pegando Jun de surpresa, puxando-o por trás pelos lindos cabelos longos. Jun indefeso nas mãos deles. Meu pobre Jun...

Mas forço-me a lembrar que Nianzu gosta do príncipe e que seus homens confiam nele, além de discordarem do Dragão. Nem tudo está perdido. Atravesso o grande salão onde dancei com Jun no que parece uma vida atrás e chego finalmente à sala do trono.

Eu me recosto atrás de uma coluna sentindo o peso da adaga na coxa. Prendo a respiração. O Regente, os generais e Liling, com uma bela veste verde, estão ali. Não há sinal de Arjun. Prendo a respiração apreensiva quando um soldado se junta a eles, afobado.

— Senhor — ele arfa — Homens das montanhas! Foram vistos nas proximidades do pavilhão do príncipe! — cada palavra é interrompida por uma longa respiração. Meu coração dispara, mas me forço a não me mexer. Estive agora no pavilhão do príncipe, Jun não estava por lá.

Tento me convencer de que o Dragão foi sincero, de que Jun não estava lá, mas o medo começa a me consumir. E se ele estava mentindo?

O que o faria dizer a verdade?

O Regente dispensa o soldado, dando ordens para que vasculhem tudo e prendam qualquer suspeito. Agora os guardas tem que se dividir entre caçar o capitão Shang e os homens das montanhas. Para mim, quanto mais bagunça melhor, mas e Jun? Aparentemente o Regente também não sabe onde ele está, o que só aumenta minha apreensão.

Quando espio dentro da sala de novo, ele está parado em frente à coroa sobre uma almofada de veludo vermelho, pronta para ser posta na cabeça do novo imperador.

— Encontrem Arjun — o Regente ordena aos generais com voz monótona, embora eu saiba que cada uma das palavras está respingando veneno. — e matem-no. — Meu coração erra uma batida. — Não me importa o que façam ou como o façam. Cansei desse garoto. Uma nova era se inicia hoje no império, uma em que não terei mais Montanha ou herdeiro dela. — ele caminha até Liling e a presenteia com uma bela faca com cabo cheio de joias — se por acaso você vier a encontra-lo e o casamento se consumar, quero que o mate na cama, na noite de núpcias.

Ela pega a faca, mas o encara com horror. O Regente sorri, acariciando o queixo de Liling.

— Não se preocupe, meu bem, não creio que chegaremos a isso. Provavelmente ele será abatido hoje e você não precisará se dar ao trabalho. — Ele se volta uma vez mais para os generais. — Coloquem a culpa nesses invasores da Montanha...

Não consigo ficar ouvindo nem mais uma palavra, então me afasto enquanto ele ainda está dando ordens e explicando o plano. Sou uma tola, eu deveria ouvir o que o Regente está tramando até o final, mas não consigo. Tenho Jun ameaçado pelo Dragão de um lado e pelos homens do Regente do outro e agora ambos os estão caçando... E eu não consigo encontra-lo!

Qingshan e o imperadorOnde histórias criam vida. Descubra agora