Capítulo 11 - O reencontro

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Estamos frente a frente de novo. É quase como se alguém tivesse ouvido meu desejo e o feito se realizar, mas desta vez sou eu que o estou salvando. É claro que toda a situação foi horrível e eu não queria que nada disso tivesse acontecido, mas quando persegui seu cavalo em direção à Montanha eu não estava exatamente pensando em muita coisa.

Eu só queria ajuda-lo.

Ver aquelas pessoas pegando água enquanto, por ordem do Regente, nós construímos a barragem foi doloroso demais. Como alguém pode ser tão cruel e desumano? Um pouco do mundo que o Dragão tinha me alertado que existia do Outro Lado da Muralha ficou claro para mim. Por um instante desejei que ele estivesse ali para que eu dissesse que ele estava certo, para conhecer mais do mundo que ele conhecia, então ele estava ali, galopando entre nossos homens, atravessando bravamente a Muralha.

Eu, que tinha me mantido mais afastada do grupo o tempo todo, me vi avançando entre as fileiras, seguindo-os, sem recuar nem sequer quando o chamado do capitão ecoou. Não sei o que direi quando tiver que voltar, talvez algo me ocorra de improviso, talvez eu só fuja com o Dragão, talvez... Meus pensamentos são um turbilhão desordenado.

O Dragão se apruma agora que parou de tossir e me encara. Eu o trouxe para o abrigo de um desnível rochoso, onde o fogo e a fumaça, — e os olhos curiosos — não nos alcançarão. Automaticamente corrijo a postura e espero, mas não vejo em seus olhos o reconhecimento com que sonhei. Fantasiei sobre ele ficar surpreso e encantado ao me reencontrar, ainda mais aqui... Levo um segundo a mais para me dar conta de que não sou a mulher que ele resgatou do prostíbulo. Ele só vê um soldado imperial.

— Você está bem? — pergunto quando consigo me acalmar um pouco. Minha voz sai vacilante, mas ainda assim é melhor do que o silêncio tenso que nos cerca. Ainda posso ouvir o crepitar do fogo do outro lado da parede rochosa em que nos escondemos e ainda posso ouvir a batalha além do fogo, mas na minha cabeça só existe este momento e a loucura que fiz.

O Dragão respira fundo mais algumas vezes antes de responder. Ele retirou a máscara e a atirou longe tão logo nos afastamos da chama, mas para minha surpresa não foi seu rosto que vi e sim um capuz semelhante ao meu, deixando somente seus olhos de fora.

— Pareço bem para você? — ele retruca sem nenhuma da gentileza que ofertou para a donzela do prostibulo. Fico impactada pela diferença de tratamento, mas estou me passando por homem, então tenho que levar isto até o fim. Enrijeço minha postura, firmo os pés no chão e trinco os dentes. Ele não vai me atingir. Não vou permitir. Sei que por trás da carapaça existe um homem que é um herói.

— Você parece vivo. — Respondo firme, repetindo mentalmente que sou um soldado do imperador.

Não que isso valha de alguma coisa, ainda mais quando ser um soldado do imperador implica em matar de sede as pessoas.

O Dragão não se comove. Ele dá uma risadinha sem humor.

— E vai fazer o que então? Me prender, desafiar para um duelo ou me jogar de volta no fogo? Escolha, soldado. Não tenho muito tempo, nem paciência.

Sua máscara continua caída no chão, os olhos vazios e o ouro brilhando. Quando avanço para pegá-la ele alerta que está quente, mas não a tempo antes que eu me queime. Meus dedos enviam um choque de calor por todo meu corpo, fazendo com que me afaste da máscara assoprando a ponta dos dedos. O Dragão balança a cabeça, rindo. Não é uma risada contagiante como a do homem que esteve comigo naquele quarto.

Não consigo ver direito seu rosto, mas tenho a impressão de que está arqueando as sobrancelhas.

— Tem certeza que você é um soldado? — ele pergunta com um humor mordaz, mancando até a rocha, onde se recosta. Acho que desta vez ele não vai poder dizer que está só se alongando. O telhado da casa em chamas despencou sobre ele, prendendo seu tornozelo sobre uma viga bastante pesada.

Qingshan e o imperadorOnde histórias criam vida. Descubra agora