Capítulo 7 - O cavalo de um guerreiro

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Meu corpo parece pulsar com calor e vida. Sei que eu deveria estar furiosa. Um segundo atrás este sujeito estava em cima de mim e poderia ter me desonrado. Eu sei, racionalmente, que esta foi de longe a coisa mais desrespeitosa que me aconteceu... Por outro lado, ele avisou que precisávamos enganar os guardas e, acho que uma vez que era um plano de fuga, seria muito injusto de minha parte acusa-lo de algo.

Além do mais, eu gostei do beijo.

Qingshan, você talvez realmente não seja digna de um casamento!

Estou ruborizada com meu próprio pensamento, mas a escuridão do quarto não permite que meu companheiro note. Ele parece não ter se recuperado do beijo ainda, pois fica algum tempo sentado na cama olhando sem reação para minha mão estendida. Seu rosto é uma sombra indefinível no escuro, mas se pudesse vê-lo completamente tenho certeza de que veria um olhar vago e um queixo caído. Engulo uma risada que talvez seja puro nervosismo. Ou talvez eu goste de surpreender os homens.

— Para alguém que se diz o Dragão você não está se mostrando muito ágil... — provoco quando ele finalmente aceita o gesto e segura minha mão. Não que ele precise de ajuda para levantar.

— Para alguém que acabou caindo em uma armadilha em um bordel você me parece confiante demais, minha joia de jade — ele responde passando por mim. No meio do movimento aproveita para acariciar meu rosto. Eu deveria me afastar do gesto, mas me pego tão arrepiada quanto o gato que vive nos arredores da casa de chá quando passo a mão em suas costas.

Gosto do calor e da força desse homem, ele é diferente dos garotos do vilarejo. Mais um pouco e estarei ronronando aos seus pés. Eu reviro os olhos, me forçando a me afastar. Há algo perigoso nele, em sua confiança. Ou talvez sejam as lendas. Por outro lado, ele pode muito bem estar mentindo. Há máscaras de Dragão em toda parte no Mercado Norte. O que o tornaria diferente de um lavrador que comprou uma máscara para se divertir com os amigos?

Enquanto devaneio ele inspeciona as grades de bambu da janela. Retira do cinto uma adaga fina que eu não tinha reparado que estava lá e começa a serrar. Seus movimentos são precisos e ele não tem pressa. Ainda posso ouvir os soldados e penso ter reconhecido a voz de meu tio, o que me deixar ansiosa para partir — se ele me pegar aqui, em um bordel, acompanhada de um homem, nunca mais vou conseguir reconquistar minha honra —, mas o suposto Dragão não tem pressa.

Quando as grades finalmente cedem em suas mãos ele as joga para o lado, deixando a passagem desobstruída. Estou quase saltitando no lugar. O Dragão vira-se para mim e ri.

— Tem formigas em sua roupa, senhorita?

— Preciso sair daqui antes que não tenha mais chance de ser aceita em casa.

— Vai dar tudo certo. — ele diz, se empoleirando na janela. Está montado nela como quem monta em uma sela. — Pegue minhas coisas ali, por favor.

Ele é incrivelmente educado para alguém que já me roubou um beijo e deitou em cima de mim. O pensamento me faz ficar quente de novo, de forma que me apresso até as coisas dele amontoadas no chão do quarto. Viro-me de costas para que não haja chance dele captar meu rubor.

Quando pego a capa e a camisa do chão a pesada máscara rola até meus pés. Ela é antiga e constato que é realmente feita de ouro. Olho por sobre o ombro para a figura imponente sentada na janela, desejando poder ver seu rosto, pois penso que esta será a única chance de realmente vê-lo. Por um acidente do destino estou realmente face a face com o Dragão, o ser lendário que atravessa a Muralha a seu bel prazer e desafia o futuro imperador. Há mais lendas sobre ele do que posso contar. E eu o beijei. Ou melhor, ele me beijou. Eu o toquei e estou com ele em um bordel... Sem poder ver seu rosto. Na verdade, é por isso que ele tomou tanto cuidado ao manter a escuridão sempre presente entre nós.

Qingshan e o imperadorOnde histórias criam vida. Descubra agora