10 • Os trabalhos

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Revisar textos era cansativo. Com certeza. Ter de ler tecnicamente cada palavra e ver se ela é a correta e mais adequada dentro daquele contexto; ficar constantemente em alerta quanto a repetição de palavras e a eterna busca por sinônimos; pensar nos futuros impactos que cada termo pode causar... Tudo isso era exaustivo, mas Akaashi adorava.

Podia tranquilamente passar horas relendo, aprimorando e limpando desde o mais simples dos textos até os mais complexos. Atualmente, essa era uma das únicas coisas em que tinha completo controle, então se doava por inteiro para que ficasse perfeito. A sensação que tinha ao finalizar um texto e saber que estava impecável era inexplicável. Não era atoa que tinha sido o orador de sua turma.

O texto em que estava imerso no momento era um simples artigo sobre os festivais culturais das redondezas que estavam se aproximando.

Havia poucos dias que tinha conseguido arranjar o emprego de revisor no jornal da cidade e não tinha sido nada fácil. A razão da dificuldade nem de longe era porque havia muita concorrência, na verdade, não havia nenhuma.

Em um raro passeio pela cidade, Akaashi acabou por passar em frente ao escritório do jornal e reparou no panfleto pregado no vidro no qual diziam estar precisando de revisores e alguns outros trabalhos. Akaashi já tinha em mente há tempos que precisava começar a trabalhar e aquela parecia-lhe uma ótima oportunidade.

Ao entrar no local, recebeu olhares tortos e de julgamento de todas as poucas pessoas ali presentes. Era óbvio sobre o que se tratava, por mais que ele evitasse ao máximo qualquer aparição pública, sabia como cidades pequenas funcionavam, boatos se espalhavam rapidamente, e no estágio em que estava, era evidente.

Algumas pessoas suspiravam em desaprovamento, outras o olhavam por alguns segundos, então desviavam, mas logo voltavam a encarar, outras, ainda mais corajosas, começavam cochichos com os que estavam ao seu redor. Mas Akaashi ignorou tudo, era muito mais fácil simplesmente fingir que nada estava acontecendo.

Conversou bastante tempo com o diretor do jornal sobre a vaga de revisor e ele sempre parecia arrumar alguma desculpa para dispensá-lo, no entanto, Akaashi conseguiu fazê-lo ceder ao mostrar em qual faculdade tinha se formado e também ao assegurar-lhe de que somente trabalharia de casa, dessa forma, a empresa não seria "mal vista".

Akaashi sempre era perfeito, porém a instabilidade e constante pressão deste emprego exigia que ele fosse extraordinariamente sublime.

Batidas à porta da frente fizeram Akaashi despertar de todas essas memórias e também de seu trabalho. Só agora se lembrava da Sra. Bokuto dizendo que as coisas que ele havia pedido no dia anterior seriam entregues mais ou menos naquele horário da manhã.

Deixando o notebook na mesa, ele caminhou tranquilamente até a entrada. Mentalmente já se preparava para escutar a enxurrada de informações que Bokuto diria sobre tudo que havia observado pelo caminho. Porém teve uma surpresa ao abrir a porta. Não era Bokuto.

Um garoto moreno e bastante jovem, mesmo que alto, estava parado ali, segurando sacolas em ambas as mãos.

— Bom dia — cumprimentou com um sorriso prático, mas que também continha uma sutil veracidade.

— Bom dia — Akaashi respondeu baixo, seu cérebro ainda estava muito focado em analisar a situação.

— A Sra. Bokuto me pediu para entregar essas compras. Quer que eu deixe em algum lugar?

— Sim, na mesa, por favor — assentiu, dando um passo para o lado.

Enquanto o rapaz entrava e colocava as sacolas onde havia sido pedido, o cérebro de Akaashi trabalhava fervorosamente. Todo esse tempo, sempre era Bokuto quem ficava encarregado de trazer as compras dele. Aquilo tinha se tornado um tipo de acordo não verbal.

Refúgio - BokuAkaOnde histórias criam vida. Descubra agora