Pano e pedra

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O velho sai do escritório, deixando Pacifica e William a sós naquela  bagunça de sala, a menina assim que  o homem foi embora correu até o rapaz e colocando as mãos delicadas no ombro dele indagou:
— Você está bem? Vi o tapa que levou....
Mas Will cora de vergonha e afasta a mão da garota rapidamente, ele a responde sem encara-la:
— Estou bem...
E sem espera-la caminhou para frente até pisar no tapete vermelho da sala. Não queria que Pacifica tivesse o visto daquele jeito. É, esse era o lado ruim da companhia deles: momentos como este, que antes eram doloridos com a presença dos primos, essas punições se tornavam humilhantes. Uma prova de como ele era dependente e incompetente, um testemunho de como um ser tão extraordinário quanto ele, foi reduzido a uma vida mísera de servidão. Odiava se sentir assim. Ele respirou fundo, e começou a catar os papéis espalhados pelo chão:
— A pedra tem mais ou menos do tamanho da palma mão...
— Certo, você não acha melhor descansar um pouco antes de continuarmos procurando?
Ela se aproxima com passos lentos e o ajuda a organizar a sala, o rapaz nega com a cabeça a pergunta e responde:
— Eu não posso parar – deu uma pausa, e assim que juntou toda a papelada do chão se levantou e continuou – você não precisava ter se metido nisso, de verdade....
— Como não? – retrucou pegando o maço de papel das mãos dele – eu não ia deixar ele continuar te tratando assim! É claro que eu precisava me meter! Roubo é uma acusação muito séria, e mesmo que fosse o caso, isso não dá o direito dele te bater.

Ouvir essas coisas dela o deixava com um sentimento estranho revirando-lhe o estômago, por um lado era reconfortante saber que pelo menos uma pessoa estaria ali o protegendo,por outro lado, ainda sentia-se envergonhado pelo ocorrido, outra coisa: um tapa certamente doía, mas não chegava nem perto da dor de uma chicotada ou do toque fantasmagórico de uma gota de água benta, mas o fato de: agora ter uma plateia para assistir o deixava enjoado. Mas esses sentimentos pouco importavam, o que importava era que se eles não acharem o amuleto em algumas horas os dois estariam encrencados, e ele não sabia o quanto disso Pacifica aguentaria. Então ele apenas se vira a ela.
— Tente procurar na sala e eu vejo se não há encontro aqui, temos mais chances se procurarmos em lugares diferentes....

Pacifica concorda com um aceno breve e vai correndo até a sala, deixando o rapaz a sós no escritório. Ele passou uns 20 minutos olhando e organizando minuciosamente o lugar e não encontrou nada, seu único olho começou a esquentar de raiva e pouco tempo depois ele se viu chorando, lágrimas mornas desciam seu rosto enquanto ele fazia o máximo para internalizar todo aquele sentimento que parecia ferver dentro dele. Aquele ódio era fruto dos dias horríveis que ele tem passado, primeiro teve toda a situação com Mason e agora aquela merda de amuleto tinha que ter sumido de volta! ele tinha certeza de não ter encostado na pedra, mas ao mesmo tempo não tinha ideia de onde aquele maldito canalizador poderia estar.

—Will.

"E se Pacifica também não tivesse encontrado a pedra?"

—William!

"E se Stanford tivesse realmente perdido o amuleto?"

—William!

"E se eles obrigarem a volta do uso das correntes? Elas são tão humilhantes e dificultam tanto as atividades!"

—William!

Após o quarto grito, a menina bateu o salto no chão e o foco do olhar fumegante de Will finalmente tornou-se Mabel, a menina o encarava com desdém, o rapaz rapidamente tomou jeito e as pressas enxugou o olhar saindo de seus pensamentos:

— Pois não? No momento estou fazendo algo importante para Stanford, mas quem sabe Gideon possa te ajudar agora...
Explicou tentando manter a postura, Mabel realmente sempre o pegou desprevenido, e desta vez não foi diferente. Ele observou a menina entrar no escritório e parar bem em sua frente: Rezou para que ela o deixasse voltar a sua procura em paz, se mais alguma coisa ruim acontecer ele ia ter um colapso.
— E o que Stan quer que possa ser tão importante?
Will ousou encara-la levando de encontro seu olhar marejado com o azul enjoado dela. Como assim "o que possa ele querer"?  Ela deveria saber que o senhor Gleeful possui prioridade em todos os quesito e quereres. Mas respondeu a garota mesmo assim:
—Ele não encontra o Amuleto e eu estou procurando.
Ao contrário do que ele esperava a menina não esboçou espanto, sua face estava calma... mais do que isso, ela estava sorrindo, o sorriso de canto e o olhar relaxado desmontou Will, Qual o problema dela?
—Ah.. então ele não encontrou a pedra? Nossa que penaaa, se bem que eu me lembro de ontem passar por aqui e a encontrar ela encostada do lado de alguns papéis. Mas ah quem sabe onde aquela Saphira polida foi parar? Boa sorte com sua procura mertilo.
Durante toda sua frase o tom de voz dela não parecia certo, seus olhos azuis brilharam em crueldade e o desejo de boa sorte soou mais como uma ameaça, Will piscou uma, duas vezes até chegar numa conclusão, virou a palma da mão como se quisesse alcança-lá antes dela deixar o recinto.
— Senhorita Mabel espera!
E a garota parou na porta virando-se para encarar o rapaz:
— Sim?
— Você estava aqui ontem, certo?
A menina pareceu irritada com a pergunta:
— Eu acabei de te falar isso, não acabei?
—Acabou sim, tem razão... por um acaso, a pedra não estaria com você, estaria?
Seu rosto pareceu claro, e seus olhos azuis malvados denunciaram o ato, ela sorriu perante a acusação:
— Mesmo que estivesse com, Stan nunca acreditaria em você.
Naquele momento foi  cristalino ver o pânico apoderar-se do olhar do rapaz, ela tinha razão, Mabel aos olhos de Stan nunca poderia estar com a pedra, ela já tinha uma e não tinha motivos pra pegar outra, e mesmo que tivesse, teria muito mais sentido ela pegar o amuleto de Mason, visto que seria mais fácil enfrentar a ira do irmão do que a do seu tio-avô.
Will nervoso e sem saber o que fazer com a informação ajoelhou-se desesperado perto da menina.
— Mabel, Mabel por favor devolva a pedra. Por favor! Faço tudo o que você quiser mas pelos deuses devolva a pedra!
A garota apenas sorriu, aquele sorriso sádico se fez de orelha a orelha.
—Olha só... cadê seus rosnados agora? Cadê toda aquela bravura hein? Cadê aquele demônio raivoso e desconfigurado do laboratório hein Will?

Veneno azul - Reverse FallsOnde histórias criam vida. Descubra agora