Capítulo 30
Giulia Moraes
— Vocês homens ainda falam essas coisas? Pfff — sorri irônica, enquanto analisava o rapaz. Usava uma regata branca e um short de tactel, que se não fosse pelo país onde estamos eu diria que era um brasileiro. Os cabelos pareciam recém-cortados e estavam levemente penteados para o lado, em uma espécie de topete natural. Barba rala, propositalmente, e um cavanhaque crescendo. Pelo tom bronzeado e o rosto levemente avermelhado, imagino que tenha tomado sol recentemente. Na verdade, observando melhor o conjunto da obra, ele parecia ser alguém bastante assíduo à praia. Arrisco dizer que é um surfista nato.
Bonito.
— Por quê? Já te disseram isso muitas vezes? — sorriu.
— Não o tanto que é normal para meninas da minha idade — voltei a olhar para o mar.
— Bom, eu só perguntei isso porque estava sentado naquele bar — apontou para um bar que eu havia passado na frente há alguns minutos — E eu te vi caminhando sozinha desde longe, não parecia bem, inclusive, você nem viu que quase foi atropelada enquanto atravessava. Eu fiquei preocupado e resolvi vir conversar com você, saber como está, se precisa de ajuda...
— Olha, hoje é um péssimo dia para dar em cima de mim. Eu não quero nada com ninguém agora e preciso ficar sozinha — interrompi sua fala para esclarecer a minha necessidade de ficar só. Voltei a caminhar na direção de onde havia vindo e ouvi os passos apressados do rapaz me acompanharem.
— Você é brasileira? — perguntou quando me alcançou.
— Por quê? Você vai dizer que eu tenho corpo de brasileira ou, sei lá, qualquer outra idiotice que vocês homens costumam usar pra se referir às brasileiras? — virei-me e respondi ríspida, vendo o rapaz hesitar e dar um passo atrás com uma expressão que era um misto de assustada e surpresa.
— Mmm... — sorriu pelo nariz — Na verdade, não. Você está usando uma camisa da seleção brasileira, e um chinelo brasileiro. Eu queria te perguntar quem era esse jogador, número noventa e cinco, e se ele era novo no time. Por isso tudo que eu te perguntei se você era brasileira — explicou, me deixando boquiaberta. Só então me dei conta que a camisa que eu estava usando era a de Christopher. A que eu tinha dado de presente a ele, e que com certeza ele esqueceu na minha casa uma das vezes que dormiu lá. Baixei um pouco o olhar, lembrando de quem eu vim até aqui pra esquecer — Olha, me desculpa, eu não quis te deixar mal, me perdoa eu já estou indo embora... — Enquanto ele falava a voz dele foi se distanciando, como se ele tivesse falando e andando pra trás, indo embora, de fato. Me arrependi de ter tratado assim alguém que claramente só se preocupou por mim e que, pela curiosidade em saber minha nacionalidade e pelos detalhes que já denotei antes, deve vir do mesmo país que eu.
— Não... Esquece! — falei no ímpeto, vendo como o rapaz parou a caminhada — Eu me chamo Giulia, e sou brasileira sim. Realmente eu não estou bem, você acabou me fazendo perceber que essa camisa não é a minha e sim a que eu tinha dado ao meu ex-namorado. Nós terminamos há pouco tempo, eu ainda não superei... Mas, eu não quero compartilhar mais. Só preciso ficar sozinha — desabafei, com a mesma expressão cabisbaixa de antes, agora recebendo o olhar completamente preocupado do moço.
— Eu te entendo. Você está completamente no seu direito. Mas, sabe... Às vezes é bom desabafar, colocar pra fora. Eu sei que a gente nem se conhece, eu não sou seu amigo, mas eu me preocupei de verdade com você. Então, se você mudar de ideia, quiser companhia, quiser conversar, talvez uma água ou só ficar calada, mas com alguém perto, eu tô ali — ele apontou para o mesmo bar que citou antes, mas agora mostrando a mesa onde estava sentado, que ficava na área descoberta.
No fim das contas eu estava certa. Ele era mesmo brasileiro. E pela primeira vez em tanto tempo eu estava ouvindo alguém falar português. Falar o meu idioma. Que saudades disso! E saudades de casa. Fiquei alguns minutos observando o rapaz ir embora lentamente e pensei se ele não estava certo e o melhor não era realmente colocar pra fora. Ainda mais sabendo que eu poderia fazer isso falando a minha língua, podendo me expressar muito melhor dessa maneira. Enquanto eu ainda pensava no que ele havia dito, ele parou a caminhada e me olhou a última vez, vendo que eu ainda o observava.
— E, ah! Meu nome é Bernardo. — sorriu tímido e acelerou seus passos. Era tão louco e estranho ver que ainda existem pessoas como esse rapaz. Que se preocupam com os outros e demonstram solicitude assim, a quem sequer conhece. Me transmitiu uma bondade e gentileza enormes o fato dele ter se preocupado comigo. Tudo isso eu ponderei em menos de três minutos, unindo ao que antes já pensava, decidindo se deixaria passar essa oportunidade de ter a companhia de alguém da minha terra.
— O seu nome é Bernardo de quê mesmo? — falei caminhando em sua direção.
— Bernardo Schneider — virou-se para mim, arqueando a sobrancelha, mas mantendo seu sorrisinho tímido, que não era nada tímido — E, provavelmente, você não me conhece, mas eu já te vi antes.
— O que? — perguntei curiosa, já que pelo visto a gentileza não tinha sido para uma total desconhecida assim como eu havia pensado.
— Você estava na festa da Eduarda, a namorada do Igor. Eu estava lá também. Eu fui o brasileiro que fez a caipirinha da festa. Você não me viu, mas eu te vi de longe. — Meu. Deus. Que cidade MINÚSCULA! Com tanta gente para encontrar, eu me deparo justamente com o mesmo rapaz que fez a caipirinha da festa. Porque eu estava certa de que tinha sido um brasileiro.
Pelo visto eu acertei.
E com ele tinha sido do mesmo jeito que com Christopher. Ambos me viram e eu não os vi.
Outra vez deixando que ele volte para o meu pensamento.
— Que loucura! Eu tinha certeza de que tinha sido um brasileiro o que fez a caipirinha. — sorri fraco — E ah! Eu já estou ficando mestre nessas situações.
— Perdão? Não entendi... — me olhou confuso.
— Quando Christopher... — apontei para as minhas costas, onde tinha o nome dele — Me conheceu, foi da mesma maneira. Ele me viu no corredor dias antes e eu não prestei atenção — recordei triste e um pouco angustiada.
— Ah! Deve ser o Christopher que Igor e Eduarda me falaram e você deve ser a brasileira que está passando uma barra com o término, então... Que loucura que eu já tenha te visto e ouvido sobre você sem saber que era você — falou surpreso.
— Pois é... E eu poderia matar os dois por terem falado isso para outra pessoa, mas pelo menos, agora me pouparam o trabalho de ter que explicar tudo com detalhes — sorri fraco outra vez — Bem, Bernardo Schneider... E eu posso ir com você? Tomar uma água? Não sei, acho que vai ser bom pra mim conversar com alguém, no meu idioma, desabafar ou me distrair... Ficar sozinha não é a melhor opção, eu acho — falei sem jeito. O brasileiro alargou o sorriso esbranquiçado e me abraçou pelos ombros.
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Best Part • Christopher Vélez
FanfictionDizem que os melhores amores são aqueles que nascem de uma amizade, mas nunca disseram se esses amores resistem às provas de fogo. Provas que muitas vezes colocava o amor em cheque em prol da realização pessoal, como se entre sonhar e amar não houve...