Capítulo Três

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O vi antes mesmo de estacionar o carro no estacionamento. Desci carregando uma sacola grande de pães, me apressando.

--Ei, Kyan.—falei—Só abrimos as 6hs, está aqui há muito tempo?

--Oi, Charlie.—ele me cumprimentou, tirando o saco da minha mão. Abri o restaurante e gesticulei para que entrasse.—Eu sei, mas estava pela área, pensei, por que não um café?

--Oh.—respondi ainda em movimento, tratando de abrir tudo, ligar a máquina de café e pegar os pães de sua mão.

--Você é rápida.

--Preciso ser.—falei, e me surpreendi ao vê-lo arrumar as cadeiras em seus lugares. Terminei de fazer minhas coisas e quando voltei dez minutos depois, o encontrei esperando no balcão. Sorri, pegando uma xícara e servindo seu café.—Quer mais algo?

--Então, você mora sozinha?—ele perguntou. O fitei, confusa. Ele corou.—Eu só estou tentando conhecê-la.

--Ok.—assenti, desconfiada.

--Somos muitos. Homens quero dizer. Não há muitas mulheres na reserva.—ele gaguejou. 

Achei adorável.

--Sim, eu moro.

--Não é bom que more sozinha.—ele comentou.

--Moro em um bairro agradável, além disso duvido que haja algum perigo nessa cidade. Todos se conhecem.

--Ficaria surpresa.—ele resmungou. O olhei confusa.

--O que quer dizer?—ele pareceu pensar um pouco, por fim balançou a cabeça.

--Não é nada.—ele levantou, jogando uma nota no balcão.—Tenha um bom dia.

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Já passava das seis quando encerrei meu turno, me despedi de Diana e fui em direção ao meu carro. Não estava escuro, mas o céu estava nublado, indicando uma tempestade que estava por vir. Meus pés doíam, mas eu estava feliz. O restaurante estava indo bem, considerando. Aparentemente, a comida do meu tio não era mais tão boa quanto eu me lembrava, então tive alguma resistência no começo, mas logo a notícia se espalhou, maravilhas de uma cidade pequena, e eu tive um dia lotado. Minha comida foi muito elogiada. 

Eu não tive um minuto livre.

Mas minha mente volta e meia retornava até o homem que vi . Minha pele formigou ao me lembrar como ele me olhou no dia. Ele era rústico e grande. Não tinha dúvidas que suas mãos eram gananciosas. Me perguntei quem já esteve com ele por uma noite e como sobreviveu. Ele parecia alguém insaciável. Balancei a cabeça, eu estava louca. Provavelmente resultado da falta de vida sexual. Fazia mais de três anos desde a última vez que fiz sexo. Eu tive um namorado e fiquei com ele por quase quatro anos, até que ele me traiu. Típico. Eu pensava que ele era bom. Que me amava. O sexo nunca fora bom, era algo que fazíamos. Eu não reclamava quando ele não me procurava ou dizia estar cansado.

Eu deveria saber que não duraríamos. Quando o peguei com a secretária ao visitá-lo depois do expediente, já que ele sempre fazia horas extras, segundo ele, precisava ser o melhor. E isso exigia dedicação. E com certeza exigia, principalmente a posição que o encontrara em cima da ruiva magra e exótica que gemia como uma verdadeira cantora de ópera. Quando o confrontei ele apenas sorriu e disse que eu poderia ter participado, logo depois perguntou o que tinha para comer.

Posso ter colocado um pouco a mais de pimenta em sua comida que o levou para a urgência, mas ninguém era perfeito, não é mesmo? Terminei com ele assim que o deixei no hospital. Claro, ele me ligou por meses. Mas eu já não confiava mais nos homens. Eu sabia que nem todos eram iguais, eu não era generalista. Mas Brad fez um bom estrago. Tentei alguns encontros mas sempre me encolhia ao pensar se ele teria uma secretária e se eu seria o suficiente. Eu sabia que não era magra, nem a maior beleza do mundo. Eu adorava cozinhar e amava doces. Sempre tive quadris um pouco largos e seios grandes.

Depois de um ano na fossa, me olhei no espelho e não me reconheci. Lembro de olhar para minha mão segurando uma colher de sorvete. A larguei, corri até o armário e troquei de roupa. Comecei a correr todos os dias desde então. Cada quilo que perdi, me senti mais livre, me senti mais dona do meu corpo. Logo encolhi quatro números. Eu era um sólido 42 agora. Mas correr não apagou minhas inseguranças. Eu também não me sentia atraída por ninguém. Por isso minha surpresa quando meu coração acelerou ao ver Roan. Mas ele nunca olharia para mim. Eu sabia das minhas chances. Era realista. Roan tinha várias secretárias ao seu dispor.

Ao chegar em casa, fui direto para meus tênis e peguei minha garrafa de água na cozinha. Correr era sagrado. Diana me disse que havia uma trilha que muitos usavam e decidi tentar. Segui o tráfego e após pedir direções encontrei meu caminho. Meu corpo suava, e minhas pernas queimavam. Olhei para o relógio e xinguei internamente ao ver que se passaram duas horas. Às vezes eu exagerava. O tempo esfriou e começou a chuviscar. Me virei para voltar, mas acabei escorregando, meu corpo indo com tudo para o lado, meu pé entortando de uma maneira nada saudável. Saí rolando barranco abaixo e só parei no final, minha cabeça batendo numa pedra. Pontos pretos surgiram atrás dos meus olhos e gemi. Tentei levantar mas estava sentindo muita dor e meu estômago revirava. Desespero tomou conta de mim. Eu estava muito machucada para subir a trilha e não sabia onde estava. Tentava sentar, quando folhas sendo esmagadas me fizeram erguer a cabeça.

Arregalei os olhos e engasguei ao ver um lobo gigante preto parado há poucos metros de onde eu estava. Um lobo. Um maldito lobo! Recuei, mas o movimento me fez querer vomitar.

--Socorro!—gemi, incapaz de correr ou mesmo me mexer. Tudo começou a rodar e antes de eu desmaiar, vi o lobo vir na minha direção.

O Tempo de RoanOnde histórias criam vida. Descubra agora