O Tempo de Roan

Prólogo

Roan olhava para a clareira a sua frente enquanto dois filhotes brincavam entre si, rolando na grama e rosnando. A vida não poderia ser mais simples. Exceto que não era. Nada era como antes. Sabia que sua alcateia estaria sempre em alerta sob a mancha obscura do seus antepassados. Havia uma guerra no ar que durava quase cem anos agora. Houve muita perda de ambos os lados, mas ao olhar para seus irmãos mais próximos sabia o quão cansados estavam de lutar. Só queriam paz e quem sabe encontrar suas companheiras. Sabia que para ele era quase impossível, já estava perto da idade sem volta, já vivera muito era um fato, mas não estava preparado para envelhecer e deixar seus irmãos em guerra.

Todo lobo tem trezentos anos para achar sua companheira, se isso não acontecesse perdia suas forças e sua longevidade. Começaria a envelhecer muito rápido e sucumbiria à morte em menos de um ano. E só lhe restavam meses. Podia sentir a atmosfera ficar cada vez mais tensa entre seu povo. Sabiam que seu tempo estava contado, e sem um herdeiro, era impossível prever como ficariam com sua morte.

Estava cansado, e a morte parecia agradável se, se permitisse ser fraco por um segundo. Mas todos dependiam da força do alpha. Toda alcateia temia por ele e por si mesmos. Uma alcateia sem um alpha forte era frágil e fadada à extinção. Pensou muitas vezes em sair das fronteiras de sua casa e sair em busca de sua prometida, mas nem isso poderia fazer sem que deixasse seu povo em risco. A qualquer momento poderia haver um ataque e estar longe era inadmissível.

--Ei, Roan.—Foxy chamou sua atenção. Seus mais fiéis guerreiros estavam reunidos, arrumados e rindo entre si.—Vamos na cidade.

--Diana disse que um novo restaurante abriu. Pensamos em visitar.—Kyan disse. Roan semicerrou os olhos. Lobos eram conhecidos por serem extremamente fortes e extremamente famintos. Comida era algo prazeroso e necessário para os manter fortes e bem humorados. Seu metabolismo rápido não permitia que os alimentos, bebidas ou mesmo remédios durassem muito em seu sistema. Tudo era revertido em energia.

--O velho Ernie vendeu seu restaurante e foi todo reformado.--Stone acrescentou.

--E por que estão me dizendo tudo isso?—resmungou. Eles olharam entre si.

--Queremos que nos acompanhe.-- Foxy deu de ombros—Hanna está cansada de cozinhar para nós, e já disse que devemos nos virar essa semana.

Hanna era sua irmã.

--Falarei com ela.—disse.

--Nah, deixe-a. Uma garota deve ter tempo para si mesma.—Kyan negou.—Vamos logo homem, estou com fome.

--Não podemos deixar todos sem algum vigia.—Roan o lembrou.

--Kor vai ficar.—Stone apontou para o lado sul da floresta—Está no rio de novo.

Uma tristeza o abateu. Kor fora o que mais perdeu em todos esses anos de guerra. Seu estômago roncou. Resmungando, resolveu aceitar o convite.

--Voltaremos logo.—avisou, preparando para correr mas Kyan o parou.

--Vamos na caminhonete.—falou, apontando para o carro gigante onde Stone já ligava e os esperava.

--Vou correr.—falou se afastando—Encontro vocês lá.--Se virou sem esperar por mais protestos e disparou pela floresta. Seus irmãos ficaram olhando-o se afastar mata adentro.

--Bom, nós tentamos.—Kyan deu de ombros.

--Agora teremos que ir para o restaurante de verdade.—Stone resmungou. O plano era levar seu alfa a capital à procura de uma companheira. A pequena cidade de Mayce onde moravam não tinha turistas frequentes e quase todos se conheciam. Sua companheira não estava ali. E Roan quase nunca saia da reserva.

--Diana estava nos esperando amanhã, mas acho que não ligará se aparecermos hoje.—Kyan falou. Diana era sua amiga. Tinha 40 anos e era mãe solteira. Havia ajudado ela uma vez há algum tempo e sempre se falavam quando ia na cidade.

--E quem é esse novo proprietário do Ernie?—Foxy quis saber.

--Um tal de Charlie.—disse Kyan.

--Espero que não seja outro velho que cozinha sem lavar as mãos.—Stone se encolheu. Todos fizeram careta. Ernie era velho e cozinhava bem, mas suas noções de higiene eram precárias.

--Sempre há comida chinesa.—Foxy suspirou.