Capítulo Dezoito

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Nosso novo quarto era um grande depósito, com uma porta e uma claraboia, então quando abri os olhos depois de uma noite mal dormida, a luz foi bem vinda. Kate havia dormido ao meu lado. Levantei e fui até o banheiro improvisado no outro canto do quarto. Havia uma pia e uma banheira, separados por uma cortina. Lavei o rosto e bebi a água direto da torneira. Me olhei no espelho pela primeira vez desde que fui sequestrada, e minha aparência não era das melhores. Havia olheiras sob meus olhos, meu cabelo estava sujo e embolado. Voltei a lavar meu rosto e bebi um pouco mais de água.

–Hey.--Kate falou. Olhei para ela através do espelho.--Tudo bem?

–Não...–falei. Me apoiando na pia.--Me sinto mal ao pensar no que Beur planeja e como o cio pode ser uma realidade para mim.

–Você cheira a lobo. E por mais que não tenha se acasalado com ele, sua natureza está se adaptando ao lobo dele. Você está mudando.--ela especulou.

–O que significa isso? Você já entrou no cio?--perguntei, sem jeito..

–Apenas uma vez.--ela estremeceu.--Charlie... eu, sinto muito.

–Por que?--me preocupei com sua expressão devastada.

–Beur irá se unir a você hoje.--ela disse.--E no cio... você pode engravidar.

–Não.--recuei, toda cor fugindo do meu rosto.

–Talvez não aconteça.--ela se adiantou.--Mas é melhor estar preparada para essa possibilidade. Alguns de nós não engravidam no primeiro cio. E você é humana, talvez, seja diferente.

–Eu não posso...–balancei a cabeça, e caí no chão. Kate se agachou na minha frente.

–Eu realmente sinto muito.--ela alisou meu cabelo.

–Kate, precisamos sair daqui.--falei.--Temos que tentar.

–Eu tentei, Charlie.--ela riu sem graça.--No primeiro ano, tentei três vezes antes de desistir. Da última vez, os sentinelas me encontraram em outra cidade...–seu lábio inferior começou a tremer e ela sorriu com devastação no olhar.--Vamos dizer que eu aprendi minha lição.

–Eu nem posso imaginar o que passou esses anos, mas sinto que não devo aceitar, não posso apenas deixar isso acontecer.--disse.--Eu nunca me considerei uma pessoa capaz de sentir tanto ódio por outro ser. Mas esse lugar, essas pessoas...

–Eu sei.

–Roan virá por mim.--afirmei, mais para mim. Tentando encontrar forças.--Beur irá morrer essa noite.

–Precisamos te arrumar.--Kate avisou, com tristeza após um silêncio pesado.--Se vierem nos buscar e não estivermos prontas...–ela lançou um olhar nervoso para a porta. Me forcei a levantar e começamos a nos mover automaticamente pelo quarto.

Enquanto tomava banho, pensei no que me esperava nas próximas horas. Tudo em mim se rebelava contra a ideia de ser tocada por outro homem. Por alguém que não fosse Roan. Minha pele coçava e meu coração estava acelerado desde o momento que acordei. Não só minha mente rejeitava a possibilidade, mas meu corpo também. Eu não iria baixar a cabeça e aceitar. Eu lutaria até o final. Eu não era corajosa, pelo menos, nunca me considerei uma pessoa assim. Sempre fugi de conflitos e sempre vivi de forma segura. Talvez há um mês atrás essa situação tivesse me quebrado, mas agora, agora eu tinha Roan, eu era companheira de um shifter lobo. Eu sabia que ele viria por mim, isso me dava forças. Eu só precisava aguentar mais um pouco.

Desliguei a água, me secando e fui em direção a cama onde a roupa da noite já me esperava. Fiquei encarando o vestido com uma careta. Era um vestido de seda branca, curto e parecia transparente. Não havia sutiã ou calcinha. Kate parou ao meu lado, usando algo semelhante, um vestido verde curto e decotado, não deixando muito para imaginação. Seus machucados mal apareciam agora e sua beleza estava voltando a aparecer com força.

–Eles preferem assim.--ela respondeu sem emoção, tocando a barra de seu vestido. Uma batida na porta nos alertou que nosso tempo estava esgotado. Me apressei a vestir o pedaço de pano, constando que de fato era transparente. Meus seios estavam praticamente a amostra e segurei a vontade de vomitar.--Charlie... quando... pense em um lugar. Tire sua mente do presente e...

–Vamos!--um grito a interrompeu. Ela pulou e uma lágrima rolou por seu olho. Seus braços me envolveram e retribui seu abraço me sentindo entorpecida.

–Kate, se eu não sobreviver, peça abrigo a Roan.--sussurrei rapidamente.--Eles são bons, vão te proteger.

–Tudo bem.--ela concordou.--Mas você me prometeu que sairíamos dessa juntas.

–Eu sei.

–Então sairemos juntas.

Norm nos esperava na porta e o seguimos em silêncio. Ele não escondeu seu olhar sobre nossos corpos. Queria me cobrir ou correr. Mas sabia que não iria longe e poderia machucar Kate no processo. Então me forcei a entrar na minha mente e sobreviver a isso. Meu corpo começou a ficar entorpecido e dei boas vindas a névoa que se instalou em meus olhos. Eu estava ali, mas não estava.

Voltamos para o centro do armazém e Beur estava sentado, vestido como no dia anterior. Seus olhos passearam por meu corpo, sua língua lambeu seu lábio e ele sorriu.

–Minha noiva é deliciosa. Não acham?--falou. Rosnados de aprovação soaram ao meu redor.--Mal posso esperar para comê-la.

Ele levantou, vindo na minha direção e pegou minha mão me puxando para si. Meu corpo estava mole e senti uma onda de repulsa sacudir minha mente. Ele se inclinou, cheirando meu pescoço e sua mão subiu por minha perna, tocando minhas partes.

–Antes da noite acabar, você estará implorando, Charlie.--ele murmurou sem fôlego em meu ouvido.

"Não!"

Gritei em minha cabeça.

A névoa que cobria meus olhos se quebrou. Eu não podia ficar calada. Não podia!

–Posso ver o fogo em seus olhos e isso só me deixa mais excitado.--ele riu.

Algo estalou dentro de mim.

Gritando, me joguei contra ele, buscando toda força dentro de mim. Ele não esperava por isso. Com certeza, não esperava isso de nenhuma mulher. Foi toda a vantagem que eu precisava. Não pensei, só agi e seu grito chocado e suspiros ao meu redor se registraram em meus ouvidos. Senti o gosto nojento e metálico na boca e coloquei mais força em meus dentes e puxei. Senti mãos agarrando meu cabelo e puxando. O soltei, gritando ao pousar sobre meu quadril com força contra o chão. Por sob o cabelo vi sangue manchando sua camisa e sorri ao ver que havia causado uma grande ferida em seu pescoço. Ele segurava o corte com a mão.

--Sua vadia!--ele berrou e se lançou contra mim. Gritei esperando o impacto mas um vulto vermelho o interceptou. Arregalei os olhos ao ver um lobo um pouco menor de pelagem laranja mordendo o braço de Beur. Ao meu lado os restos do vestido que Kate usava. Com um grunhido, Beur deu um soco na loba, que voou metros para longe com um choro agudo.--O que temos aqui? Uma revolta de vadias.--Beur cambaleou rindo.--Muito bem, vou ensinar como devemos tratar vadias rebeldes no meu clã.--ele olhou ao redor, fúria em seu olhar.

Os sentinelas se mexiam inquietos.

–Você é patético.--falei.--Uma desculpa de alpha.

Os olhos de Beur escureceram e engoli, sabendo que tinha ido longe. Recuei, tentando levantar e fugir, mas era tarde. Ele era mais rápido e mais forte que eu. Vi suas garras crescerem e ele agarrou minha perna com a mão esquerda, afundando em minha carne. Gritei ao sentir minha carne rasgando.

–Quando eu terminar com você, Roan irá desejar ter morrido com Refield.--ele disse e começou a se transformar em lobo.

Oh não...

Roan...

Fechei os olhos, minha mente buscando seu rosto. Se minha hora havia chegado, ele seria meu último pensamento. Um rosnado animal me alertou do ataque e gritei esperando seus dentes.

"Roan."

O Tempo de RoanOnde histórias criam vida. Descubra agora