49 - Dúvida

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     Todos os nefilins mais jovens seguiam Heloíse a passos calmos dentro do terreno da mansão. Estranhamente, notaram que não havia sinal de vida algum no local, como se estivesse abandonado há meses ou mesmo anos. Eros observou a área ao redor da casa, em busca de algo que se parecesse com uma emboscada, ou alguém que pudesse estar à espreita, mas não foi capaz de encontrar nada. Ao mesmo tempo, Nicolas observou sua namorada andar um pouco mais distante dos demais, parecia pensativa, ele decide esperá-la.
     – Você está bem? – Perguntou o louro à nefilim de cabelos curtos.
Ela o alcançou e assentiu com a cabeça suavemente.
     – Sim, só estou preocupada... com o que podemos encontrar.
     Nicolas pegou sua mão com leveza e a incentivou a continuar. Quando todos finalmente alcançaram a ampla porta de entrada dupla do casarão, Heloíse se voltou para eles, sua expressão nunca havia sido tão séria.
     – Não temos ideia do que vai acontecer... – ela respirou fundo – Mas devemos dar nosso melhor para que todos se mantenham seguros e, independente do que encontrarmos, não desistam.
     No instante em que sua tia terminou de pronunciar essas palavras, Eros sentiu um frio em sua espinha, ao compreender completamente o significado delas.
Eva poderia não estar lá. Ou então, ela poderia estar, mas talvez já fosse tarde demais.
     Com um olhar rápido para trás, pôde notar que os anjos do lado de fora da barreira ainda buscavam um meio de quebrá-la, ele gostaria que seus pais pudessem ajudar, gostaria que fosse fácil para eles com um estalar de dedos e resolvessem toda aquela situação, como quando faziam com seus problemas no jardim de infância, mas ele sabia que não era mais uma criança, sabia que Susana e Luca não poderiam intervir naquele momento e que o destino de Eva estava em suas mãos.
     – Vou abrir a porta. – A voz de Heloíse o despertou de seus pensamentos, tornando a olhar para a frente.
     A porta de madeira escura e gasta foi aberta facilmente com o mínimo toque da ruiva na maçaneta prateada, dando visão a um amplo cômodo vazio. A tinta branca das altas paredes estava por sair, completamente velha, tão antiga quando provavelmente eram as teias de aranha que emolduravam os cantos do lugar. O ar dentro dele também não era dos melhores, o cheiro de mofo os estava enjoando, era como se não houvesse adentrado um resquício de sol ali há muito tempo.
     – Há um corredor de cada lado, com várias portas... – Constatou Sophia. – Além da escada, claro. Devemos nos dividir?
     Miguel observou a escada de ferro caracol que havia no cômodo, assim como o restante do lugar, encontrava-se empoeirada, ele conseguiu notar uma leve impressão nos degraus, eram pegadas, quase imperceptíveis, mas estavam ali, manchadas de terra.
     – Não sei quanto aos corredores, mas com certeza há alguém lá em cima.
Heloíse seguiu seu olhar e assentiu.
     – Certo... Diana e Eros, fiquem com o corredor à direita. Nicolas e Roberta, o da esquerda. – Ela pôs um dos pés sobre o primeiro degrau. – Miguel e Sophia, venham comigo.
     Os demais concordaram de prontidão. Eros foi quem alcançou a primeira porta do corredor designado aos irmãos, com o silêncio absoluto, quase podia ouvir as batidas de seu próprio coração ao tocar a maçaneta, até descobrir que estava trancada, pedindo a Diana que arrombasse a fechadura, apenas para descobriram que se tratava de outro cômodo vazio.
     Do lado oposto, Nicolas também percebeu que a primeira porta do largo corredor estava destrancada, ele observou a soleira da mesma antes de abri-la completamente e notou que o quarto -ou seja lá o que fosse, estava um completo breu. Com um gesto calmo, finalmente decidiu ver dentro do cômodo, e, com somente a luz provinda do corredor, encontrou na primeira tentativa o que estavam todos à procura.
     – Eva! – Exclamou, e correu até ela.
     Não estava exatamente claro dentro do quarto, mas ele podia dizer com certeza que era ela. Sentada em uma cadeira, suas mãos estavam amarradas fortemente para trás com uma corda e os lábios selados com uma fita. Quando Nicolas fez menção de tirar o que lhe impedia de gritar, ouviu-a resmungar palavras incompreensíveis, sua expressão era de angústia quando indicava fracamente algo atrás do garoto.
     – Eva? – Sussurrou, então olhou trás, encontrando a namorada, que estava há alguns passos atrás dele.
     Ela estava de cabeça baixa, os fios castanhos caídos desarrumados sobre a pele levemente bronzeada de sua face. Nicolas não era capaz de ver seus olhos.
     – Eu... – murmurou ela, somente.
     – Rob?
     Subitamente, os ombros da menina começaram a balançar de maneira suave, ao mesmo tempo em que uma risada sombria escapava por seus lábios.
     – Eu não esperava muito dos outros... – Os olhos castanhos dela finalmente o encararam. – Mas pensar que até mesmo você acreditaria nisso é realmente patético.
     – O quê...?
     Erguendo uma das mãos com elegância, ela cravou os dedos em suas madeixas escuras e levou-as para trás.
     – Vamos dar uma voltinha.

 
     No andar de cima, Miguel já havia perdido as contas de quantos cômodos haviam entrado e nada tinham encontrado, senão mais mofo e mais teias de aranha. O carpete escuro sob seus pés continuava a guiá-los para lá e para cá com pequenos resquícios de que alguém havia estado ali, em algum momento. Ele suspirou, tudo aquilo estaria sendo em vão? Pensou. Realmente não havia nada ali, nenhuma pista, nenhuma chance? Sentia-se impotente, até escutar a voz de Sophia irromper o silêncio no qual se encontravam.
     – Pessoal... venham ver isso.
     Heloíse e o nefilim de cabelos escuros se entreolharam, então seguiram a loura por entre alguns poucos móveis, que levavam a uma pequena porta, na qual ela estava parada, como se não tivesse certeza se deveria ou não entrar.
     – Mas que... – Balbuciou Heloíse, no instante em que seus olhos encontraram o conteúdo que havia no quarto que Sophia havia precisamente achado.
     Miguel ficou pasmo, ele não poderia entender o que era tudo aquilo, nada que pudesse pensar parecia fazer realmente algum sentido. Havia tantas fotos que eles mal podiam contar, fotos essas cujos rostos conheciam quase todos, havia várias fotos da Angelus e dos alunos.
     – Isso é bizarro, mas... – Sophia encarou um, em seguida o outro presente no cômodo. – O que é mais estranho, é que Roberta está em todas as fotos. Todas.
     – O que isso deveria significar? Que é ela por trás de tudo isso? – Heloíse indagou, ainda incrédula sobre o que via.
     Miguel percorreu os olhos sobre uma escrivaninha de madeira envernizada que havia ali, e notou uma pequena pilha de livros encapados com couro escuro, apanhou o primeiro com cuidado e abriu em uma página aleatória, atento sobre o que lia.
     – Na pior das hipóteses, é isso... – Finalmente respondeu Miguel, então ergueu o caderno em suas mãos, revelando uma espécie de diário. – Ou é alguém completamente obcecado por ela.

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