Capítulo 3 - Perseguidor

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— Sua Alteza não foi encontrada em lugar algum — relata Fedelma, o tom exalando frustração.

Agradeço internamente por ela não estar olhando para o meu rosto, pois a minha inquietação agravará o problema. Estou observando pela janela da biblioteca da Imundice, um ambiente tão isolado quanto os outros quartos dessa casa, a única diferença é o cheiro de livros antigos que me atrai. Poderia ter tomado esse tempo para adquirir conhecimento sobre Kildare ou druidas, porém não tenho paciência com leitura. Só leio se for algo interessante, e ainda bem devagar porque as palavras me causam sono com facilidade.

Sendo honesta, eu não sei ler bem. Preciso ler sílaba por sílaba e não entendo a maior parte das palavras. Foi um sacrifício conseguir ler aquelas cartas que Dother me enviava. Eu não sabia o significado de várias palavras, e posso imaginar que ele o fez de propósito.

Eu nunca li um livro e não tenho tempo para me importar com essa bobagem. Professor Redmond pode usar os argumentos que quiser comigo, mas, sinceramente, mesmo ele dizendo que os livros trazem o tipo de conhecimento que eu posso levar para a vida, eu sou uma pessoa prática e braçal, por isso me contento com o martelo da forja. Ou contentava. Não ligo se me chamarem de estúpida e analfabeta.

Acho que papai e Brizo também nunca leram nada, ou tocaram algum instrumento ou qualquer passatempo mais culto. No máximo, quando crianças, eu e Brizo fazíamos música estapeando as nossas coxas para criar um ritmo. Era tão ruim e irritante que os vizinhos reclamavam, especialmente quando nós dois inventávamos de bater nas panelas de casa com uma colher de pau.

E de novo eu estou divagando.

— A senhorita é a única pessoa que teve certo contato com Sua Alteza durante essas semanas — retorna Fedelma.

Está me acusando?

— Nós não... — Se eu disser que não tenho qualquer envolvimento com Dian, levantarão suspeitas a respeito do dia que ele me libertou do obair. Temos que parecer minimamente íntimos para fazer algum sentido. — Ah... Agora eu imagino onde ele possa estar — minto.

— A senhorita nos guiaria até Sua Alteza?

— Eu posso comparecer à audiência sozinha, sem problemas. — Dizer isso me causa uma acidez no estômago e a boca fica amarga. — Posso responder por Sua Alteza também.

— Eu receio que Sua Majestade esteja mais intrigada a respeito do por que o príncipe te libertou mesmo ao custo de se tornar um darach. — Fedelma é cautelosa, porém se descuida com frequência. — Acredito que sua presença possa trazer apenas negatividade à audiência, pois Lady Marfach é fruto de um ato hediondo do príncipe.

— Fedelma — meu tom se torna arbitrário.

Ela me observa ligeiramente surpresa, com cara de quem está esperando levar um xingamento e sabendo que se excedeu. Sei que posso mandar Fedelma calar a boca e ela obedecerá.

— Sim, Lady Marfach?

— Eu receio que Sua Alteza não retornará cedo — digo, tentando manter as rédeas. — Não posso controlar para onde ele decide ir, nem quebrar a sua privacidade. Se príncipe Dian é tão essencial para a audiência, então é melhor que adiem novamente e...

Fedelma faz um sinal desesperado com a mão e eu me silencio, dando-lhe permissão para falar.

— Não. — Ela está convencida e sua voz se suaviza, apesar da clara preocupação. — Sua Majestade anunciou que não aceitará outro atraso. Acredito que se contentará com o seu depoimento até que Sua Alteza retorne.

Está decidido: eu irei sozinha ao encontro de rei Dub. É uma situação séria e que logo desencadeia a palpitação acelerada no meu peito. Eu tenho que prestar atenção em cada movimento de agora em diante, já que não posso contar com a inútil presença de Dian.

O Príncipe do InfortúnioOnde histórias criam vida. Descubra agora