Capítulo 11 - Família em ruína

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Em dezoito anos, sempre me foi dito que druidas nasciam como druidas. Ouso julgar que quase nenhum humano detém a verdade, pois a realidade jamais foi exposta em qualquer lugar de Wexford, pelo menos entre o meu círculo de relações.

Eu perguntava muito sobre druidas quando criança e minha mãe respondia tudo sem gaguejar, da mesma forma como o meu pai, tios e avós. O que eles tinham em comum, é que me esclareciam em um tom sonhador baseado em mitos, como se morar em Kildare e ser druida fosse o ápice do sucesso. Talvez não estejam errados. Não sei como é a vida de uma família druida comum e eu estou aqui sem merecer tais privilégios.

Eu fico cerca de vinte minutos na sala de jantar caminhando de um lado para o outro, cogitando e ignorando Bran retirar os pratos, talheres e restos de comida da mesa.

O sino toca todos os dias ao anoitecer e seu badalar pode ser ouvido em qualquer lugar de Kildare no mesmo volume. Nunca vi esse sino, porém ele sempre vai me remeter a Dother, da época que eu forjava no porão do Crann Bethadh e ele me fazia companhia, indo embora apenas ao toque do sino.

Se não me engano, essa é a hora que os religiosos param tudo o que estão fazendo e seguem numa caminhada até o Nemeton mais próximo para agradecer à Danu pela bênção. Como é de se esperar, não há Nemetons perto da minha residência, apesar destes locais sagrados estarem por toda parte em Kildare.

As orações sempre são conduzidas por Dother, o príncipe que nasceu da forma como é, e que deve se sentir um favorito de Danu. Ao menos a sua gratidão por ela, com tanta dedicação às orações, isso é mais sincero do que qualquer coisa que ele tenha feito por mim.

Pode ser que no fim das contas o idiota realmente seja alguém especial e nós sejamos infortunados. Sou obrigada a concordar com Dian, pois não há ambiente mais desgraçado do que a moradia de uma humana miserável e um darach.

E ainda assim, eu agradeço à Danu quando algo de bom acontece.

Dian me deu a opção de participar ou não da reunião com o seu irmão. Obviamente não quero fazer isso, porém é insensato da minha parte fugir de Dub e evitá-lo. O rei já me odeia o bastante. Essa é a única razão para eu deixar os garfos que estão na minha mão, na tigela que Bran recolhe os talheres, e arrumar meu pijama longo de frio, antes de tomar um longo momento para reunir coragem e abrir a porta.

A quietude traz um vazio a mim, com a ideia de que se faz desnecessário ouvir gritos quando os trovões clareiam a noite e sequer uma gota de chuva cai. Daqui a algumas salas, não encontrarei a situação alarmante que os céus prescrevem.

Deve ser péssimo para Dub todos terem noção dos seus sentimentos mais profundos apenas julgando o clima do dia. Ele pode manter a serenidade que quiser no seu rosto, hoje, eu saberei que é falsa.

Novamente estou próxima ao rei, e meu psicológico é culpado por me dar a falsa impressão de que o tapa ainda arde. Não quero mais ir e vê-lo. Meus pés parecem cimentados ao chão, comigo diante do meu novo terror.

Eu uso a palma das mãos para coçar meus olhos, tendo em mente que isso não vai me ajudar a pensar melhor e é só um tique nervoso. É óbvio que a indecisão me estressa. A opção mais segura é sair pela porta dos fundos, seguir até o Bhaile andando no meio da noite e ficar na companhia de Muirenn ou Muirne, qualquer uma que não esteja trabalhando agora. Não, na verdade, isso não vai funcionar. Elas estão ocupadas.

Kiera me convidou para a sua residência, mas nem considero isso uma opção.

Ao abrir os olhos, meu destino é mais inevitável do que antes. Não adianta fugir de um rei que tem controle até sobre o clima ou qualquer passo que eu der. Medo só vai me tornar imprudente e desesperada, mas se eu for diferente disso, posso obter mais informações.

O Príncipe do InfortúnioOnde histórias criam vida. Descubra agora