Capítulo 5 - Duas magpies dão sorte

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A tentação de nenhuma riqueza no mundo é capaz de me manter nesse condado. Visar uma vida de luxos e confortos duradouros se mantém um desejo tolo e impossível. Eu preciso sair de Kildare.

Aprendi desde criança a não ser movida pela curiosidade e hoje agradeço à minha mãe pelo ensinamento, sendo assim, pouco me importa o que cada um está orquestrando. Posso viver muito bem sem saber os motivos de Carman ou o que Dother tem em mente, contanto que esteja longe deles.

Eu piso na Imundice sonhando acordada com a minha liberdade.

Fedelma me lava e remove a maquiagem desmanchada do meu rosto. Quis me encher de perguntas, mas o choque de realidade que me assola no meio do banho faz com que a mulher se cale e se foque na sua função.

Minha bochecha ainda arde junto da minha dignidade. O som do tapa ainda estala nos meus ouvidos e zumbe.

Eu começo a tremer na banheira logo que as palavras de Dub fazem sentido para mim, de que minha liberdade está acorrentada a Dian. Se eu fugir, ele irá atrás de mim. Se ficar, Dub já deixou claro que sua vista grossa sobre minha humanidade não durará para sempre.

Eu vi demais, de acordo com o rei. Só estou viva e com direitos porque sou útil.

Depois que essa utilidade acabar, o que acontece aos humanos que pisam em Kildare?

Eu fui incapaz de esconder o mais essencial de Dub. Ele é rei e me despreza. Ele é quem tem o poder de me apagar com uma ordem, não há nada que eu possa fazer residindo no seu domínio. Odeio o sentimento de que outro druida conhece sobre a minha humanidade, não bastasse Dother, Dian, Muirenn, Muirne, Carman e Balor. Isso não é um bom sinal, todos eles podem me chantagear no futuro.

— Direi para Erin preparar um chá de valeriana à senhorita — informa Fedelma, que está passando uma bucha nas minhas costas. — Ou a senhorita está precisando ver um druida liang para controlar a ansiedade?

— Estou bem. — Como sou idiota por mentir a tal ponto. Minhas unhas estão sendo devastadas nos meus dentes, com esmalte e tudo. — Só um chá.

— Certeza?

— Absoluta. — Cuspo o pedaço da minha unha e o sangue se mescla com a água da banheira. — E Dian?

— Sua Alteza — corrige Fedelma. — Ainda não há pistas. A senhorita deveria nos informar se realmente souber da sua localização, antes que Sua Majestade a procure novamente.

Ouvir isso me causa um sobressalto.

— Não. Não, de novo não. — Viro de costas, meus olhos recaem brutalmente sobre os de Fedelma e ela se afasta um pouco, talvez assustada com a minha expressão. — Amanhã eu irei atrás daquele infeliz.

— Sua Alte... — Fedelma desiste de me corrigir no meio da frase e volta a se aproximar para enxaguar as minhas costas.

Sinto as pálpebras pesadas assim que saio do banheiro e ando pelos corredores cinzentos da Imundice, a esmo. O sabonete com aroma de jasmim está na minha pele e causa um absurdo contraste com o odor de fuligem que antigamente eu exalava, mas é bem agradável.

Estou inclinada a ir para o meu quarto, para dormir até o dia seguinte. Na verdade, minha intenção era retornar da audiência e ir explorar a biblioteca, talvez encontrar algo ou só perder tempo, porém a lembrança constante de que Dub entrará em contato comigo me drena qualquer energia. Não sei quando isso vai acontecer e minha ansiedade só tende a aumentar.

O mais prudente que posso fazer por agora é ter consciência de que dias pacatos como os de semanas atrás são únicos e jamais se repetirão.

O mais prudente que posso fazer por agora é ter consciência de que dias pacatos como os de semanas atrás são únicos e jamais se repetirão

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O Príncipe do InfortúnioOnde histórias criam vida. Descubra agora