O Príncipe do Infortúnio

Capítulo 4 - O tiro no escuro

Eu vejo cotidianamente o tratamento que proporcionam a Dian. Tem um pouco de desprezo, sim, mas não o agridem, xingam ou provocam qualquer malefício físico. Ele apenas não é mais tratado da mesma forma que um príncipe. Não acho que seja um absurdo se comparado à tortura que testumunhei Carman submeter Dian.

Confesso que estou começando a ficar intrigada com o desaparecimento de Dian. Ele não tinha mencionado nada de diferente ou demonstrado um comportamento suspeito, disse que iria se refrescar no Lago Cinéreo quando era manhã, na segunda. Hoje é sexta.

Meus pés estão colados ao chão, sem que eu ouse realizar movimentos bruscos, e meu corpo está pesado. Estar isolada com Dub me dá a mesma sensação de me encontrar com um urso no ártico.

Ele utiliza camisa e calças brancas, os botões da camisa não estão completamente abotoados e os colares de diferentes tamanhos e cores emolduram o seu pescoço, refletindo sua nova posição. Por cima de tudo há um manto branco de gola grande e felpuda, bordado inteiramente de detalhes dourados e trísceles que remetem à glória druida.

Qualquer falha e estarei em sério risco.

— Rememoro que a senhorita veio do Condado de Carlow e que Dother lhe trouxe por tédio — inicia Dub, à medida que apoia os cotovelos e entrelaça os dedos longos. Sua voz muda da água para o vinho, se relacionar à de momentos atrás. É muito suave, ao mesmo tempo que carrega desconfiança. — É uma história verdadeira?

Leanan mandou que eu contasse a verdade. Ela é a sombra de Dub e age em um condado miserável feito Wexford, sendo alguém que não aparenta conhecer o próprio rei e ser leal a ele desde antes da sua coroação.

Só que eu não sei o quanto Leanan e Dub discutem e se comunicam. Prefiro que ela conte a verdade em um lugar onde as paredes não têm ouvidos. Eu não me sinto segura aqui, e minha decisão é um completo tiro no escuro.

— É verdade. Vivi com meu pai e irmão a vida inteira por lá e era lenhadora — minto com um complemento para não ficar tão artificial.

— Entendo. — Dub assente complacente, a coroa de carvalho com linhas de diamante reflete na claridade. Está parecido com Dagda. — E quanto a Dian? O que tem a me dizer sobre a relação de vocês?

Engulo em seco. Espero que ele não tenha visto.

Dub não me dispensou para focar na procura de Dian, por isso devo me manter alerta. Os olhos do rei são idênticos aos de uma águia e não sei se ele está procurando o mesmo que estou escondendo.

— Eu... — Não me lembro exatamente qual história Dother havia contado na audiência passada, mas já inventei algo durante esse mês. — Eu nunca tive muito contato com Sua Alteza. Na maioria das vezes ele apenas me pedia chá de musgo e eu limpava o quarto de Lady Aaran, no entanto, houve um dia em que eu estava caminhando com duas colegas de quarto e me deparei com o meu pai nos subúrbios de Kildare. Ele estava desesperado porque meu irmão está devendo a um agiota e desapareceu há pouco tempo. Meu pai achava que o agiota tinha sequestrado o meu irmão, então veio a Kildare pedir ajuda.

— Como Dian se encaixa nesta história? — Dub cruza as pernas, sua atenção está intacta e intimidante.

— Eu estava nervosa e acidentalmente derramei chá em Sua Alteza. — Isso já quase aconteceu, na verdade, num dos dias que estava exausta por trabalhar como criada e ferreira, tendo só três horas de sono. Por um lado, é bom que todos os elementos da minha mentira são recortes de fatos que vivenciei, montados com outro contexto. — Quando vi meu erro, tentei limpar o dólmã de Sua Alteza, porém ele recusou a minha ajuda e eu tive medo de como me penalizaria por isso. No processo, eu acabei começando a chorar e ele perguntou a razão disso. Assim que eu contei sobre a situação do meu irmão, Sua Alteza disse que não acreditava que ser druida fosse uma bênção e que não faria falta a ele, então me libertou do nó para que eu pudesse ir atrás do meu parente.