Capítulo 6

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— Onde estava? — Catarina pergunta após eu entrar esbaforida na cozinha. Percebo pelo seu tom de voz que estou encrencada.

Ouço risos e, ao olhar para o lado, vejo a mesma loira com cara de anjo que me repassou o recado da Catarina, dizendo que eu deveria subir e servir o escritório. Ela cochicha com outra garota e ambas olham para mim e acham graça de um comentário que fizeram. Nesse momento, entendo que a loira mentiu e quis me prejudicar. Talvez ela seja amiga da moça que faltou no serviço e tema por sua vaga, mas nada justifica essa maldade, principalmente contra alguém que não conhece e não sabe as dificuldades que essa pessoa passa na vida.

Fico dividida entre contar a verdade e prejudicar a garota que não deveria ter a minha empatia ou disfarçar e deixar para lá. Lembro agora que a Catarina me orientou a não subir, a não ser que seja por uma ordem direta dela; e não foi esse o caso. Na tentativa de querer fazer tudo direito e ser efetivada no emprego, não me atentei a esse fato. Não foi a Catarina que me pediu para subir, e sim a tal garota; então o erro foi meu.

Sei bem o que é passar necessidade. Não conheço a mulher e nem sua história, e por isso, ao contrário dela, não serei cruel e irei assumir a minha responsabilidade no erro, não serei vingativa e nem jogarei a culpa nas costas de outra pessoa. Invento uma desculpa qualquer, torcendo para que a Catarina acredite ou simplesmente deixe passar.

— Sinto muito, eu me perdi. — Digo a primeira coisa que vem à cabeça.

O celular da Catarina toca e seu foco muda momentaneamente. Agradeço mentalmente essa interrupção que provavelmente me livrou de ser despedida. A pessoa do outro lado da linha fala algo que muda a expressão do seu rosto, deixando-a furiosa. Após um simples "ok", ela desliga o telefone.

— O que está acontecendo hoje? — Ela fala frustrada e digita alguma coisa na tela do seu telefone. — A dançarina também furou!

Dançarina?

— Vá! — Ela gesticula com a mão, me dispensando. Ela está visivelmente chateada, porém está pronta para resolver mais esse empecilho.

Sem perder tempo, volto ao trabalho, mas antes encaro a moça loira com cara de anjo e lhe dou o meu melhor sorriso.

De anjo não tem nada!

Continuo circulando entre as pessoas, equilibrando a bandeja na mão e servindo as bebidas que desaparecem rapidamente, o que me faz voltar à cozinha com maior frequência. Entre essas idas e vindas, percebo a aflição da Catarina ao ter dificuldade em resolver a questão da dançarina. Lembro-me da roupa de odalisca em minha bolsa e, por um instante, penso no caso.

O que eu tenho a perder?

— Catarina — arrisco —, não pude deixar de ouvir sobre a falta da dançarina, acho que posso ajudar.

— Como assim? — ganho sua atenção.

— Eu posso dançar, inclusive tenho o figurino apropriado em minha bolsa — falo e imediatamente me sinto insegura ao lembrar da reação do Henrique ao me ver dançando —, mas é dança do ventre... — explico arrependida e tento voltar atrás. — Talvez não seja apropriado, me desculpe. Foi apenas uma ideia.

— Julia! — Ela fala quase aos gritos. — É perfeito!

— Perfeito? — Questiono confusa.

— Se vista! — Ela ordena empolgada — Deixe-me ver.

Catarina me segue até a área dos empregados e me aguarda do lado de fora do quarto enquanto eu troco de roupa. Respiro fundo e me agarro a essa nova oportunidade, afinal, serão dois pagamentos: de garçonete e de dançarina. Solto meus longos cabelos castanhos que cobrem as minhas costas e dou uma penteada com os dedos, deixando-os alinhados. Dou uma última conferida no espelho antes de me expor, como fiz há algumas horas, porém dessa vez será diferente. Não serei julgada por um namorado maluco que mal me conhecia, e sim por pessoas querendo entretenimento, e isso eu posso dar.

O MagnataOnde histórias criam vida. Descubra agora