Capítulo 2

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Acordo cedo nesta quinta-feira, e a saga da busca por um emprego continua. Digito alguns endereços e me cadastro em vários sites e vagas para trabalhos de todos os tipos, desde faxineiras, balconistas até merendeira para um colégio infantil. Só me resta aguardar e torcer para ser chamada. Ligo para a minha antiga patroa e peço uma carta de referência para que eu possa ter alguma credibilidade em uma possível futura entrevista.

— Julia, como quer que eu te dê uma carta de referência se você faltava com frequência, ou quando vinha, tinha que sair mais cedo do serviço? — ela justifica sua negativa.

— Pelo amor de Deus, dona Joana! — se ela estivesse na minha frente, eu juro que me ajoelhava — Minha mãe está doente, o que queria que eu fizesse? — pergunto chateada por sua recusa e falta de empatia.

— Eu sinto muito, Julia — ela não cede — Não irei recomendar alguém que demiti por justa causa. Espero que encontre o seu caminho. Boa sorte!

E então, ela desliga o telefone, me deixando sem palavras e sem rumo. O que vou fazer agora? Lembro-me de Roberta e seu contato de emprego. Essa é a única luz que enxergo no fim do túnel, e me agarro a ela com unhas e dentes. Ao invés de mandar uma mensagem como sugerido, decido ligar e tentar um contato mais pessoal, pois quem sabe assim, consigo convencer a tal da Olivia a me dar uma oportunidade.

— Alô — uma mulher atende friamente e imediatamente me sinto insegura.

— Ah... oi! — Falo sem graça — Meu nome é Julia, sou amiga da Roberta, e ela me passou o seu contato. É Olivia, certo?

— O que deseja, Julia? — ela vai direto ao ponto.

— Estou ligando para me colocar à disposição para o trabalho — solto as palavras de uma vez e volto a respirar.

— Que trabalho? — ela pergunta, e parece que ouço um... riso?

— Qualquer trabalho! — falo desesperada — Roberta me contou que, às vezes, a senhora a chama para trabalhar como garçonete em festas, não é isso?

— Ah, isso! Esse tipo de trabalho... — Ela conclui, e não deixo de estranhar.

— Olha, dona Olivia, sinceramente, não estou em condições de exigir nada no momento. Preciso trabalhar e aceito qualquer oferta: garçonete, governanta, diarista... Qualquer coisa será bem-vinda! Eu preciso trabalhar... — imploro.

— Qualquer coisa? — ela pergunta.

— Qualquer coisa! — Respondo convicta.

— Tudo bem — ela diz, e me encho de esperanças. — Aguarde meu contato, vou arrumar algo para você.

— Obrigada, dona Olivia. — Respiro aliviada.

— Não me agradeça — e então, ela desliga.

O que foi isso? 

***

Jogo toda a tralha da minha bolsa em cima da cama, rezando para ter algumas moedas ou dinheiro esquecido em algum canto para conseguir juntar o valor do medicamento da minha mãe, que está no fim. Restam apenas alguns comprimidos, e logo precisarei comprá-lo.

É um jogo psicológico estressante não saber se terei ou não a quantia na data certa para comprar o remédio e poder aliviar sua dor. Não suporto vê-la sofrer. Sinto-me péssima e ao mesmo tempo impotente, pois sem trabalho, não posso sequer aliviar seu sofrimento como necessita. Sua aposentadoria é suficiente apenas para pagar o aluguel e as contas básicas de água, luz e gás. O restante é comigo; e há dias em que me sinto a pior filha do mundo por ter apenas um macarrão instantâneo na mesa. No entanto, ela nunca reclamou. Nunca.

— Oi, filha — minha mãe diz, recostando-se no batente da porta do meu quarto, me deixando envergonhada por me pegar contando os centavos.

— Oi, mãe! — respondo constrangida, guardando rapidamente todo o conteúdo espalhado sobre a colcha de retalhos que ela mesma havia feito alguns anos antes, quando ainda conseguia mover seus músculos sem sofrer com a dor desconcertante da fibromialgia. — Como está se sentindo hoje?

— Estou bem. — Ela se esforça para sorrir, como sempre faz, mesmo nos piores dias.

— Qual é o seu nível de dor hoje? — pergunto aflita.

— Seis.

Um dia ruim, mas não terrível. Apenas mais um entre os outros tantos suportáveis.

— Tudo bem... — falo desanimada.

— Vai sair hoje? — Ela pergunta esperançosa.

— Não vou. — Respondo ao ter uma ideia. — Que tal assistirmos a um filme na televisão?

— Não... — ela me dispensa — Você é jovem, precisa viver sua vida, sair e se divertir! Não pode ficar presa em casa com uma velha doente!

— Você não é velha! — respondo apenas o que posso sem mentir.

— Filha... — ela insiste — Vá viver! Você tem seu namorado... Já basta suas amigas terem se afastado quando se trancou em casa para cuidar de mim.

— Não eram amizades verdadeiras — rebato —, se fossem, estariam aqui ao meu lado nos momentos difíceis.

— E o Henrique? — ela continua — Logo você irá perdê-lo também.

— Sinceramente, mãe — dou de ombros — , não sei se me importo — me jogo nos travesseiros, derrotada, sem me importar com mais nada.

— Julia! — ela adverte, chamando a minha atenção pela maneira como falei. Mas vejo em seus olhos sua aflição e preocupação com minha felicidade.

Se ela soubesse que o que importa para mim é o seu bem-estar e que o resto são apenas preocupações que posso resolver, entenderia que eu realmente não ligo. 

***

A internet confiscada do restaurante ao lado está péssima hoje. Conforme o fim de semana se aproxima, o local fica mais movimentado e o Wi-Fi congestionado. É claro que o seu Romeu, dono do estabelecimento, sabe que uso sua conexão aberta ao público, e por isso não desliga durante a madrugada quando fecha as portas. Ele me disse uma vez que não custava nada a ele fazer essa gentileza e que isso não mudaria em nada a sua conta de luz, para eu ficar em paz e aproveitar a cortesia. De tempos em tempos, faço questão de ir lá e comprar uma Coca-Cola, pois é o meu jeito de agradecer.

Minha mãe dormiu depois de tomar seu antidepressivo, e nosso filme acabou ficando para outro dia. Por isso, estou deitada na minha cama, navegando pela internet, procurando algo de bom ou útil para fazer. Não havia combinado nada com o Henrique hoje, então ele saiu para jogar bola com os amigos, me deixando livre para fazer algo que gosto.

O que eu gosto? Já nem sei mais... Aos vinte e três anos, era para eu estar curtindo a vida, como disse minha mãe; mas estou aqui, preocupada com minhas responsabilidades e contas a pagar. Imagino como seria se eu tivesse entrado na faculdade ou ao menos no curso técnico de enfermagem. Seria incrível ter uma profissão de verdade, mas não posso pagar pelo curso, pelo menos não agora. Somente um milagre para colocar minha vida no caminho que deveria ser, onde eu pudesse cuidar dar minha mãe e ainda sobrar dinheiro para estudar. Seria um sonho.

Preciso relaxar. Então, lembro da noite anterior e daquela sensação maravilhosa de relaxamento que tive após gozar; e mesmo com a péssima conexão, digito na pesquisa "vídeos eróticos" e me surpreendo com a sensação pulsante no meio das minhas pernas ao assistir às cenas. Sem me conter, levo minha mão onde mais necessito e me encontro completamente molhada.

Acho que o problema não está em mim, afinal! Talvez o Henrique que não me desperta mais o mesmo desejo de antes... Agarro meu travesseiro, encaixando-o entre minhas pernas, imaginando que aqui, junto a mim, há esse homem lindo que ilumina minha tela, e deixo que os movimentos constantes e ritmados que faço com meus dedos me levem às alturas.

Adormeço com um sorriso nos lábios, sabendo o que eu tenho que fazer no dia seguinte. 

O MagnataOnde histórias criam vida. Descubra agora