Capítulo 68

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Chegar e ver todas aquelas pessoas me deixou com frio na barriga. Nos acomodamos nos bancos e aguardamos o louvor começar. Hinos e mais hinos tocavam e sem perceber eu me entregava àquele momento me esvaziando de mim mesma para que Deus me preenchesse com seu doce e santo espírito. Todas aquelas centenas de pessoas cantando em uma só voz era tão lindo que me arrancava arrepios. A paz do Senhor encontrou meu coração ansioso no momento em que abri a boca pra cantar junto.

Quando o louvor acabou, ouvi meu nome ser chamado para dar o testemunho. Olhei para Nicolas, respirei fundo e segui sozinha em direção ao altar. Parei em frente ao púlpito segurando firme o microfone, pensando em como começar, enquanto isso todos tinham seus olhos vidrados em mim. Eu nunca tinha falado antes pra tantas pessoas.

Isabella: boa noite a todos! Eu me chamo Isabella Fercondine, quero dizer que é um prazer estar aqui hoje e poder compartilhar um pouco da minha história com vocês. Tudo começou assim que completei meus 18 anos. Eu tinha uma vida normal como a qualquer outro adolescente da minha idade, estava tudo indo muito bem, eu só não contava que essa nova primavera chegaria trazendo consigo o maior desafio que já pude um dia enfrentar.

Vocês certamente notaram que eu não tenho cabelos, nem sobrancelhas, e devem imaginar o motivo. Um dia eu comecei a sentir mal estar, mas de início imaginei que não fosse nada demais, porém percebi que estava enganada quando comecei a sentir enjoos e vomitar sangue, eu não estava nada bem. Meus pais estavam em viagem quando aconteceu e só quando retornaram nós fomos ao médico. Fizemos alguns exames e descobrimos um câncer, não tínhamos muito a fazer, pois, ele já estava muito avançado, me deram 5 meses de vida.

Foi o pior dia de toda a minha vida, eu chorei muito depois de chegar em casa, parecia o fim do mundo, de fato, pra mim era. Nós nunca esperamos ir ao médico e ouvir algo assim. De repente, minha vida virou de ponta a cabeça, tomando um rumo totalmente desconhecido e nada mais foi como antes, tudo mudou, inclusive eu.

Os meses seguintes se resumiram numa luta esgotante e dolorosa contra o câncer, sem nenhuma expectativa de cura ou melhoria. Tudo que fazíamos era no intuito de não deixá-lo evoluir, controlar as dores e sintomas e quem sabe resistir por mais tempo. Mas nada do que fizemos foi suficiente, quanto mais o tempo passava mais a doença se espalhava, mais ela me consumia, mais as minhas forças se esgotavam e mais eu me entristecia pelo fato ter que partir tão cedo sem ter vivido o bastante pra realizar os meus sonhos. Eu sentia que havia entrado numa guerra já vencida pelo inimigo, sentia que não tinha chance alguma. Mas esperava no Senhor, mesmo com medo, insegura, mesmo aflita e frustrada, o Senhor era a minha esperança.

Todos os dias eu me lamentava pelo que estava vivendo, tudo o que eu mais queria era o fim daquele pesadelo e ter a minha vida de volta. Havia dias em que o desespero por saber que estava morrendo falava mais alto, a angústia e aflição tomava conta de mim. Por mais que eu quisesse e tentasse eu não conseguia ficar bem, tudo ao meu redor parecia colaborar pra me deixar triste e desanimada. Era como uma correnteza forte que me levava com sua braveza.

Minha alma tinha fome de vida, o meu corpo morria mais a cada dia, mas os meus sonhos ainda permaneciam vivos em mim, eu queria viver, queria muito, era tudo o que me importava, mas eu me dava por vencida e era insuportavelmente doloroso. Me fazia orar ao Senhor buscando força e conforto, buscando a dividir os fardos porque pareciam pesados demais pra mim.

O meu maior problema não era o câncer, era o fato de duvidar da minha fé, não acreditar que por mais pequena que fosse não era o suficiente pra me tirar daquela situação. O câncer parecia grande, o que eu mais queria e desejava parecia ser inalcançável. Sonhar com a cura de um câncer terminal parecia muito fantasioso e desse forma eu acabei criando uma barreira que não me deixava ver além daquela realidade, eu desistia antes mesmo de tentar.

Quando eu orava a Deus por cura, minhas palavras eram vazias de fé. É como pedir algo mas não esperar por nada em troca, sabe? E fé não isso, pedir pedir e pedir até que aconteça, não é ser insistente, não é dizer o que quer e esperar que você seja atendido. Nos meus últimos momentos de vida eu descobri o que é fé de verdade.

Eu acordei depois de uma parada cardiorrespiratória e a primeira coisa a qual me veio na cabeça foi o rosto choroso da minha mãe na última vez que estive acordada, dava pra sentir o desespero dela no olhar, aquilo me partiu o coração e eu não podia fazer nada para confortá-la _nesse momento me emocionei, as lembranças invadiam minha mente, era como voltar pra aquele dia, naquele exato momento e reviver tudo novamente. Quando finalmente soube o que havia acontecido, eu só consegui ser grata por ainda estar aqui. Eu queria aproveitar cada minuto enquanto ainda estava viva. Nesse dia eu coloquei a roupa mais bonita, ouvi minhas músicas favoritas, comi algo diferente, sorri de bobagens e coisas sem graça, declarei coisas lindas aos meus pais e ao meu namorado, liguei pra amigos, fiz tudo o que estava ao meu alcance pra ter um dia feliz e diferente, pois, eu não sabia se teria o dia seguinte pra fazer todas aquelas coisas, mas aquele momento era suficiente. Eu orei ao Senhor e agradeci por tudo que tinha vivido até ali.

No dia seguinte eu ainda estava lá, e por um instante desejei que não estivesse, porque eu sentia dores que chegavam a me espantar e nada as fazia passar. Era difícil falar, respirar, meu corpo estava exausto, eu não sentia as pernas, era o pior de todos os dias desce o início do tratamento. E por mais que tivesse passado o dia inteiro desejando que ele acabasse logo, quando a noite por fim chegou e eu podia descansar, eu não me permiti, eu não queria dormir, eu tinha medo de fechar os olhos e não acordar mais... era a sensação que eu tinha, que não acordaria.

Já passava das 22 horas quando começou a chover, o som da chuva me ajudou a controlar o alvoroço que eu sentia dentro de mim, então, eu deixei de pensar em morte e elevei meus pensamentos ao céu, tentei acalmar meu coração, refleti sobre a vida, sobre tudo, recordei histórias sobre fé e milagre e senti que precisava falar com Deus. Aquela poderia ser a minha última oração e sabendo disso eu estava decidida a dar tudo de mim, a fim de um encontro real e verdadeiro com ele. Eu queria colocar minha fé em prova, alcançar o milagre, justo no momento derradeiro. Algo reavivou o meu espírito e me fez clamar.

Quando Vem De Deus É Diferente [ Amor, Fé & Superação ]Onde histórias criam vida. Descubra agora