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📌 aldeias das marés
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Como se quisesse combinar com o meu humor e – provavelmente – o das pessoas ao meu redor, os três dias seguintes foram chuvosos. A água vinda do céu não deu uma única trégua, chegando a conjurar tempestades em meio à madrugada, deixando o mar revolto e em um estado tão caótico que parecia refletir minha própria alma.
Mergulhei no trabalho naqueles dias, pela primeira vez começando adiantado a preparar o roteiro da próxima HQ. Lançando bimestralmente, não era como se eu precisasse correr com as coisas, mas era muito trabalho, especialmente porque fazia questão de preparar tudo sozinho, a não ser alguns detalhes que eram finalizados pela equipe da editora. Eu começava pelo roteiro, o que nunca era uma dificuldade para mim, porque eu tinha um caderninho ao lado da cama, onde sempre anotava ideias de histórias para minha Red Umbrella. Eram anos e anos "convivendo" com aquela personagem.
Em boa parte do tempo, ela me fazia companhia por dias e dias, praticamente fazendo parte da minha vida, surgindo em minha mente enquanto eu praticava musculação, no espaço da minha casa dedicado a isso, enquanto corria na praia, enquanto saía para andar de bicicleta, conforme tomava banho e até quando ia dormir. Era só uma questão de organizar as ideias e de aproveitar os enredos que pareciam mais completos na minha cabeça. Daquela vez, eu iria usar um onde minha heroína lutava contra um vilão que controlava o tempo, para ela poder voltar atrás e impedir uma grande tragédia.
Eram sempre histórias mirabolantes, com fantasia, mas eu costumava associar sempre a algo mais real, que pudesse levar uma lição a qualquer pessoa que lesse. A maioria dos meus fãs era composta por adolescentes e meninas, e eu queria que elas se espelhassem na minha personagem para se tornarem mulheres fortes, que poderiam fazer o que quisessem sem se diminuírem ou submeterem. Eu não costumava viver uma vida de "fama", porque em Aldeia das Marés ninguém conhecia vinnie hacker – meu nome –, mas sabia que tinha uma galera bem grande que me seguia e acompanhava, principalmente pelos e-mails que eu recebia.
Na minha biografia, por escolha minha, fora especificado a respeito da minha deficiência, porque – novamente – queria que pessoas como eu percebessem que também tinham seu espaço. Que era possível ser bem sucedido em uma carreira. Isso sempre me fazia lembrar da minha irmã. Ela não estava mais entre nós, e eu evitava pensar nela, não porque quisesse apagá-la da minha mente. De forma alguma, Suellen possuía sua própria representação na minha HQ, como outra personagem forte, mas era como uma mentora para a protagonista, aparecendo quase como um Mestre dos Magos, de Caverna do Dragão. Tudo o que eu queria era que ela tivesse conseguido uma oportunidade de mostrar seu valor.
