Lembranças

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Henry narrando 

Não estou gostando nada dessa história de amizade. Essa melação toda de amor pra lá e amor pra cá está me dando nos nervos.

A muito tempo eu não sentia isso, desde quando tinha dezenove anos. Tive que fazer alguns tratamentos com psicólogo, fui diagnosticado com transtorno de personalidade borderline. Fiz tratamento durante três anos, e agora estou tendo sintomas parecidos novamente.

O que gerou tudo isso aos meus dezenove anos foi minha primeira namorada na faculdade, eu fiquei muito obcecado por ela. Eu era um cara que tinha a autoestima muito baixa e ela era linda, sempre fui muito tímido ao contrário dela. Enquanto ela se divertia com os amigos eu ficava isolado. Tinha um que não  desgrudava dela, ficava pra cima e para baixo, enquanto eu... Bom eu só servia para pagar as coisas que ela queria.

Meus pais sempre tiveram muita grana, por isso eu era o caixa forte de Patrizia. Certa vez a questionei, perguntei se ela tinha vergonha de mim. Naquela época eu era um pouco acima do peso e não tinha muita vaidade, talvez fosse por isso que ela não me apresentava como namorado, quase nunca nos beijavamos. Ela disse que eu era bobo, que não era nada disso. Eu a idolatrava, ela parecia uma Barbie de tão linda que era. Depois de alguns meses de namoro, eu comecei a fazer dieta e ir pra academia. Comecei a cuidar da minha aparência, desde então deixei a barba crescer e comecei cortar o cabelo com uns cortes modernos. Mas acho que Patrizia já estava apaixonada pelo "tal amigo". Muitas meninas notaram a diferença, mas aquela que eu queria chamar a atenção... Não soltou sequer um elogio. Foi então que eu comecei a me impor e proibi- lá de andar com Paul.

Ela veio com aquele história que era tudo amizade e que eu estava vendo coisas. Desse dia em diante eu não deixava mais Patrizia respirar, era um carrapato grudado nela. Fiscalizava as redes sociais dela, ela só saia se eu a levasse, só frequentava lugares comigo. Caso eu ligasse para ela e ela demorasse atender, eu aparecia na casa dela em segundos. Virei um tremendo sufocador, na minha cabeça ela me trairia a qualquer momento.

Patrizia aguentou esse sufoco por dois meses. Estávamos completando nosso primeiro ano de namoro, mas tinha dois meses que eu tinha resolvido mudar drasticamente. Patrizia me olhou nos olhos, demonstrando medo e falou que queria terminar comigo.

Aquelas palavras me fizeram parar de respirar por alguns minutos. Como assim ela queria terminar comigo? Ela tinha tudo que queria, tudo o que ela me pedia eu dava, eu a levava para onde ela queria ir. E agora ela com essa de terminar.

Ela ameaçou sair do meu apartamento, eu a impedi. Tranquei a porta e disse que ela iria ficar ali, que não era uma opção me largar. Que tínhamos que conversar direito.

Patrizia chorava e me pedia por favor para deixa- lá ir.
Quanto mais ela falava, mais minha cabeça doía, eu massageava a têmpora e andava de um lado para o outro buscando uma solução. Se ela saísse dali estaria tudo acabado.

Patrizia levantou e foi em minha direção, juntou as mãos, como alguém que suplica , e pediu para eu deixá-la ir. Quando eu estava amadurecendo a idéia, pensando se aquilo era realmente um namoro, estava disposto a deixá-la ir... ela jogou uma bomba em cima de mim.

Ela começou a me socar e gritava que nunca tinha me amado, que só tinha me usado até aquele momento. Que o amor da vida dela era Paul e que nunca me olharia como olha pra ele.

Naquele momento eu não pude controlar todas as emoções que surgiram dentro de mim, a voz dela estava fazendo minha cabeça estourar e eu só queria que ela calasse a boca. Segurei o pescoço dela com as duas mãos e apertei até não ouvir mais a voz dela. Tudo ficou em silêncio e só então que eu me dei conta do que eu estava fazendo.

Soltei Patrizia no chão e comecei a andar de um lado para o outro, passando as mãos no cabelo, não tinha coragem de conferir se ela estava viva.

Pensei em ligar para meus pais, mas como eu contaria pra eles?

Ouvi um barulho de celular tocando, fui até a bolsa dela e peguei o celular, estava lá o nome de Paul e a foto dos dois sorrindo.

Como ninguém atendia ele resolveu mandar uma mensagem.

- Está tudo bem? Está demorando para descer, quer que eu suba? 

Já estava tudo planejado, ele está a esperando. Como eu fui idiota!

Fiquei olhando para ela caída no chão e pude perceber que ela ainda respirava.

Decidi então ligar para minha mãe e contar toda a verdade.

Em poucos minutos ouvi umas batidas na porta, eu estava tão exausto psicologicamente que não conseguia me levantar do chão onde estava sentado.

Ouvi uns barulhos de chave e minha mãe entrou correndo, seu semblante era de desespero. Por trás dela estava meu pai, ele passava as mãos nos cabelos e olhava Patrizia caída e eu sentado do lado dela.

Minha mente foi ficando distante e eu já não entendia o que minha mãe falava comigo, não conseguia respirar direito. Lembro de ter visto Paul na entrada querendo passar e o meu pai o empedindo, ele se soltou dos braços do meu pai e veio até mim me dando um soco no rosto.

Tudo ficou um silêncio só... Acordei em um hospital, com uns acessos no meu braço. Tudo era muito claro e tinha um silêncio absurdo, só dava para ouvir o barulho dos equipamentos.

Meus braços estavam amarrados na lateral do meu corpo e tinha uma faixa que prendia minha cabeça na cama. Próximo a minha mão tinha um botão vermelho, deduzi que era para apertar caso eu precisasse de algo. Apertei.

Imediatamente veio um enfermeiro e me fez algumas perguntas. Como eu estava sob efeito de sedativos , ele decidiu me soltar.

Eu estava internado há três dias, ele me comunicou que pediria para minha mãe entrar.

Minha mãe chorava tanto que parecia que teria um treco. Perguntei por Patrizia e ela respondeu que estava bem, que já estava em casa, só estava abalada psicologicamente.

Tive que responder algumas perguntas para um policial. Depois da alta tive que comparecer a delegacia, fiz alguns trabalhos voluntários e tive que me tratar por três anos com psicólogo e psiquiatra.

Desde então não tive notícia de Patrizia, nos mudamos de cidade um dia depois da alta. Cada um seguiu sua vida, apaguei todas as minhas redes sociais e tentei recomeçar do zero.

Feito para mimOnde histórias criam vida. Descubra agora