Acho que existem coisas na vida que não podem ser explicadas e talvez nunca sejam esclarecidas para você. Esse é o meu caso. Talvez eu tenha dado azar na vida ou apenas aconteceu.
Eu encarava a janela do meu quarto do hospital enquanto tentava tomar coragem para sair e ter que fazer meu novo tratamento. Já era a segunda vez somente neste mês que eu estava fazendo isso, ainda preciso me acostumar com o câncer.
Descobri câncer de pulmão três semanas depois do meu aniversário de dezesseis anos. No começo, não me afetou tanto porque eu pensei que minha situação não iria piorar. Mas então, tudo piorou em menos de um mês, quase duas semanas depois que descobri o câncer, e tive que passar a morar no hospital.
Estou aqui há quase dois anos, toda vez que aparecia um transplante para que eu saísse logo daqui, o meu corpo não reagia ou não aceitava o novo órgão. Já perdi todas as esperanças de que eu possa me recuperar e voltar para casa.
Neste mesmo andar em que fico, os outros pacientes têm câncer também, a maioria de pulmão mas também outros tipos. Posso dizer que eles entendem minha situação ou talvez não, eu não falo com ninguém daqui.
———— Ei, Shiv, você precisa ir agora ———— suspiro quando Elisa, uma das enfermeiras, entra no quarto.
Por algum motivo, não consigo digerir a minha situação atual. Claro, muita gente não aceita ter câncer, mas já vi muitas pessoas desse andar que está sempre sorrindo e que nunca parece estar triste.
Me virei para ela e sorri. Eu gostava muito dela, é uma boa mulher e acho que é a única pessoa desse lugar que eu gosto. Meus pais e meu irmão sempre me visitam nas sextas e nos finais de semana, então Elisa sempre me faz companhia nos outros dias e isso me deixa um pouco melhor.
Andei pelo corredor até que chegasse na sala para fazer meu tratamento. Havia muita gente aqui. Pelo o que eu me lembre, da última vez tinha somente eu e até prefiro que não tenha mais ninguém.
Não me dou bem com gente nova e principalmente agora que moro no hospital, não sei como falar com as pessoas que passam pela mesma situação que eu. O hospital até indica reuniões de apoio, mas eu nunca fui. Prefiro que ninguém fale comigo e me deixe com a minha própria dor.
———— Tudo bem, Shiv? ———— Sarah, outra enfermeira que eu também conheço, me pergunta indo até mim.
Confirmei com a cabeça. Coloquei meu fone de ouvido e comecei a escutar as músicas da Dua Lipa, minha cantora favorita desde os quatorze anos. O tratamento durava em torno de duas horas então eu poderia ficar escutando música durante esse tempo e ignorar tudo em minha volta.
Exatamente duas horas depois, Sarah cutucou meu ombro, o que significava que meu tratamento havia acabado por hoje. Me levantei da cadeira e fui andando até meu quarto. Mas por algum motivo que acho que nem o universo pode explicar, algum ser desastrado esbarrou em mim. E eu tenho certeza de que não era um médico correndo para a emergência.
———— Ei, cuidado onde anda, idiota! ———— me viro.
———— Desculpa. Não foi de propósito.
Assim que meus olhos param nele, sei exatamente quem é, quer dizer, não totalmente. Não sei o seu nome mas já ouvi que é um dos pacientes com câncer que está sempre sorrindo por aí. Provavelmente não faço questão de falar com ele, estou bem sozinha e acho que é bem melhor assim.
———— Seu cateter está caindo.
Ele se aproximou e arrumou meu cateter. Eu sabia como fazer isso, não sou idiota. Mas também não hesitei quando isso aconteceu.
———— Valeu. Vê se não esbarra em mais ninguém. ———— sorri.
Me viro e entro no meu quarto. Peguei meu computador e o liguei. Já era seis horas, normalmente nesse horário, eu ligo para o meu irmão.
———— E aí, Lamar. Como está as coisas?
———— Oi, Shiv. Normais até. Melhor do que na semana passada. ———— diz ———— Como foi o tratamento?
———— Normal, nada demais. Não sei o que adianta fazer essa droga de tratamento sendo que eu vou morrer.
É, eu posso ter falado algo muito estúpido agora. Mas é a verdade, eu não sou a primeira na lista de transplante e provavelmente se eu fosse, meu corpo iria rejeitar, então não valeria a pena ficar esperançosa esperando um órgão que talvez nunca chegue.
———— Shiv, não fala isso. Sua hora vai chegar e eu tenho certeza que seu corpo vai aceitar o transplante assim que vier.———— o tom da sua voz ficou baixa.
Sorri. Diferente dos meus pais, ele não me olhava com aquele olhar de pena toda vez em que me ligava ou quando vinha me visitar no hospital no final da semana.
Quando meus pais ficaram sabendo do meu câncer, quase explodiram. Sei que não é fácil para eles aceitarem que a filha pode morrer a qualquer segundo mas também não é fácil para mim.
———— Preciso te contar uma coisa.
Assim que ouço, me assustei. Não gosto de notícias ruins, principalmente vindo de Lamar.
———— Não vou poder ir te ver na sexta.
Já era a terceira vez nesse mês que meu irmão não poderia vir me visitar por conta da faculdade. Tem vezes que eu rezo toda quinta-feira para que ele venha para eu não ter que aguentar meus pais com aqueles olhares de pena para mim.
———— Por que?
———— Vou ter duas provas que vai durar quase um dia todo. Mas eu conversei com a mamãe e o papai, eu vou trocar com eles.
———— Como assim?
———— Eles vão ficar na sexta e, eu fico sábado e domingo.
Toda vez que meu irmão vem sozinho é muito melhor. Ele sempre me faz rir mesmo diante da minha situação.
———— Preciso desligar para estudar. Eu te amo, maninha.
———— Também te amo.
Desligo a chamada e fecho meu computador. Arrumei algumas coisas que eu precisava e me preparei para dormir. O que não demorou muito, acabei dormindo em menos de dez minutos.
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ʟɪᴠɪɴɢ ᴀ ʟᴏᴠᴇ ɪɴ ᴛʜᴇ ʜᴏsᴘɪᴛᴀʟ
FanfictionTer câncer de pulmão aos quinze anos e ter que morar em um hospital podem ser as piores coisas na vida de Shivani Paliwal. Ela é uma garota que já perdeu todas as esperanças possíveis de se livrar do câncer por conta dos últimos transplantes terem...