2- Diário de Edolon. Escapando dos Medos

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(567 palavras)

Naquela erma montanha, envolta pelo silêncio glacial, só o ritmo estrondoso do meu coração ecoava. A paisagem parecia imóvel, como se uma neve, branca, imaculada, tivesse encoberto toda a vida e soltasse um silêncio profundo. O pensamento sobre as emoções que sentia, era a minha única companhia. Mas à medida que ousava pensar, os corvos que me sobrevoavam, pareciam alimentar-se dos meus medos e pensamentos.

O medo nos devora, quando permitimos que ele seja nosso adversário. Ah, como seria bom que metade de mim fossem recordações e a outra metade coragem para enfrentar os medos. Os olhos são a janela da mente, como a mente é a janela da imaginação. Os meus olhos vêm medo, o meu corpo sente medo, como a minha imaginação poderia fugir do pavor? Silêncio, tudo silencioso, batia com os pés no chão a cada passo, como se cada passo provasse a minha existência.

Lembro-me de ter tapado os ouvidos para ouvir o meu interior e assim afastar o pânico absurdo da surdez, e fechar os olhos na esperança que os corvos sumissem. Silêncio e medo, era o que sentia, a falta de som apavorava-me. A mente humana, é composta por imagens, símbolos e narrativas, mas o mundo parecia nada ter para me dizer, para além da negrura do céu, povoado pelos corvos. Pensamentos... pensamentos são relâmpagos negros na tempestade das emoções.

Quanto mais pensava nos corvos e que eles faziam ali, mais estes se aproximavam, parecendo aumentar de tamanho. Fiquei com uma ideia na minha mente - estes corvos sugam-me a energia.

Não sabia se o medo era criado por mim ou se era algo que estava à minha volta. Tentei escapar desses pensamentos, mas perseguiram-me implacavelmente, como monstros vorazes. Até que, ao vislumbrar a aldeia, alcancei um alívio indescritível.

Foi com enorme alegria que entrei na aldeia. Para meu espanto, vi um homem, vestido de negro com óculos de sol, de rosto tapado, parecia tentar entrar na aldeia. Os corvos dirigiram-se para ele, e deram-me a sensação de que lhe segredavam qualquer coisa ao ouvido. Depois partiram novamente para a floresta, assim que entrei na aldeia.

Penetrei pela única rua que existia, senti um tremendo alívio ao ver pessoas, que cultivavam, harmoniosamente, as suas quintas. Os corvos, felizmente, tinham desaparecido.

A aldeia era pequena, aconchegante, cercada por morros cobertos de vegetação. As casas, na sua maioria feitas em xisto, que davam um tom de crepúsculo às ruas. O fumo que emanava das chaminés, combinava-se com o ar fresco da montanha. Era um lugar simples, mais cheio de vida, com crianças a correr e pular, e um cachorro correndo atrás de uma bola. Claramente havia uma atmosfera de alegria e paz, na aldeia.

Finalmente tinha deixado a solidão dos montes impregnados de puro silêncio e o tormento dos pensamentos. Alguns dos habitantes cumpriram-me com cordiais acenos de cabeça.

À medida que atravessava a aldeia, estando eu mais calmo, não pude deixar de notar que não se ouviam vozes. Podia ser necessidade de ouvir alguém falar, como se o som pudesse adoçar a minha sensação de inexistência, mas aquele silêncio... Como pode uma comunidade inteira viver sem falar, sem se comunicar com palavras? Eu queria falar! Não sabia o que dizer, mas queria.

Perguntei onde ficava a casa do mestre Morpheus e fui direcionado, sem palavras, a uma casa erguida no alto de um monte. Lá, finalmente, poderia escapar da solidão e dos pensamentos, e mergulhar em calma e paz. Talvez até falar.

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