10- Diário de Edolon. O ritmo e a dança.

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(797 palavras)

"A maior ilusão do homem é a própria realidade, o conhecimento reside no espelho da alma."

A frase não me saia da cabeça, o que ela sugere? Que a realidade é subjetiva que pode ser interpretada de maneiras diferentes por pessoas diferentes? Que o conhecimento que vem da reflexão pode ser mais valioso que o conhecimento baseado na perceção?

Poderia fazer diversas perguntas e não encontrar nenhuma resposta, pelo contrário, só aumentaria a confusão que me aflige, com novas perguntas. A realidade não é apenas percebida pelos sentidos, é fácil compreender e a reflexão interna ajuda a termos uma melhor compreensão, mesmo no meu estado de espírito, é compreensível.

E se não há sentidos, se não há reflexão interna e tudo é implantado? Ou seja, se a frase tiver um significado literal, ou seja, a realidade está no espelho. Espelho, onde não pude perceber o meu reflexo, e o tapei com um manto. Não posso deixar o medo vencer-me!

Olhei para o espelho com desconcerto, arrastei o manto que o cobria e em vez de observar a minha imagem, vi uma mulher sentada num banco no jardim, à beira da praia. Ela usava umas calças de ganga e uma blusa azul, e se envolveu com paixão nas páginas de um livro. Os seus olhos brilhavam de amor pela poesia, mas o rosto mostrava uma luta entre o dever e a arte que iluminava o coração. Antes de partir, ela escreveu as suas reflexões na areia com um pau, e com os seus dedos desenhou versos e frases. Foi embora, mas seu coração ansiava por ficar entre as páginas do livro.

Sou um espetador em silêncio, enquanto as suas palavras ganham vida diante de mim, observando o voo das gaivotas. Os riscos de areia, admiravam o sol, e se perguntavam se a água que corria para o mar, buscavam a união, a eternidade ou apenas a força da gravidade.

As palavras tornaram-se mais claras, no sussurro de uma voz feminina:

Eu, pensamentos esculpidos na areia, observando o voo distante das gaivotas. Anseio pela eternidade do sal, no sonho de me tornar mar e persistir.

E depois parou, num compasso como se recordasse e retomou — antes de me tornar areia, fui uma lágrima triste, que já continha o sal que agora quero ser.

Fiquei maravilhado com aquele momento, a poesia escrita na areia e o universo a pulsar no meu coração. A mulher partiu, deixando a poesia para trás, misturada com as ondas do mar.

Mas de repente, emergindo da espuma de uma onda, lá estava ela, vestida de laranja, e o sol afundando no mar, envolto numa cor alaranjada. A lua subiu no céu, e eu, fui teletransportado para dentro do espelho, dançando sobre as ondas ao lado da mulher de vestido cor de laranja. Fiquei hipnotizado com aquela cena, a poesia escrita na areia virando mulher e o mar a puxar-me para dançar.

A dança começou com uma energia pulsante, como se a música guardada na própria essência da vida estivesse se tornando viva. O ritmo nasceu e a dança tomou forma nos nossos corpos. A música transformou-se em movimentos suaves e fluidos, como se as nossas almas se derretessem e se fundissem. Elevámo-nos com o vento, como se estivéssemos a dançar nas nuvens, embalados pelo sol ardente da clara noite. A dança vivia na madrugada do sonho da música, guiando a minha alma. A dança era algo de fantástico, onde dois seres se conectavam através do ritmo e da paixão.

Era como se seguimos juntos em direção à eternidade, com os nossos espíritos dançando como um só, um portal para outro mundo, onde a realidade e a fantasia se uniam. A dança é a língua universal da alma, expressando as suas mais profundas paixões e desejos. Era a arte de se conectar com o universo através do corpo e da mente.

Sem compreender como, atraído por uma força externa, constatava o meu reflexo no espelho, consoante a realidade, mas não do jeito que queria naquele instante. Subitamente, voltei a mim, ali de frente ao meu reflexo, um ser sem memória, só pensamentos: porque não procurei um médico este tempo todo, quem sou eu, o que faço aqui?

Mas por uma lei natural, ou seja, o que for, essas questões já não me afligiam tanto, e dizia, para mim mesmo, que as atitudes têm mais importância que as memórias, que os fatos que aconteceram, na minha vida, serão admitidos e não protestados. Que o meu foco, seria, apenas, acreditar no que podia controlar e modificar e não nos lamentos de um passado inexistente.

Ainda sem explicação para o que vi, decidi aceitar, decidi deitar-me, pois seguiria as instruções do bilhete, tentando a racionalidade em vez da emoção. Não é que o bilhete seja racional, mas a estupefação que sinto pelos delírios que tenho na mente parece menos sensata.

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