0.08- Liberdade e amor!

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Sentada, numa mesa na sua casa, Triny escrevia a uma amiga imaginária. Nunca o havia feito, pois o seu AniPower iria dizer que não era lógico nem coerente. Hoje tal como ontem, por sua livre vontade, o seu AniPower está ausente. Escrever é coisa que já não se usa, pois não tem nenhuma utilidade, nem há papel, nem lápis. Mas Triny havia trazido do armazém da biblioteca uma caneta e umas folhas de papel presas por um cordel.

"Com alguma dificuldade para expressar o que sinto, difícil de escrever. Tenho uma ideia e parece estar na ponta da língua, mas as palavras parecem que desaparecem e, sem saber, já escrevo o que não quero. As pessoas são complicadas, não têm emoções, nem sentimentos, são como robôs sem dor nem alma. Estão vivos, mas mortos para a vida. Não tem olhar nem sorriso, comunicam por pensamentos como se fossem estímulos eletroquímicos. Como se pode fazer um diálogo em que um diz que 2 + 2 são 4 e o outro acrescenta: "está correto, e hoje vai chover, porque o sen(x) está no primeiro quadrante e o sol fez 45.º". O outro responde: "tem lógica, mas não precisamos desta conversa, pois ambos sabíamos disso".

E ambos vão para casa até ao outro dia. Sentam-se, comem, fazem sexo com um robô se as calorias consumidas estiverem acima do recomendável, senão só pedem que a mente lhes dê essa sensação. Deves achar estranho uma criança saber o que é o sexo, neste mundo sem nexo. Não estranhes, pois, a informação, não tem filtro caso seja consciente, coerente e concetual. O sexo é vedado às crianças da minha idade, só acontece mais tarde, quando a mente e o corpo estiverem preparados, pois tudo é calculado.

As pessoas estão sós e isoladas, sem saber da sua identidade. A única coisa que os chama à razão da existência é quando o sistema climatérico altera a temperatura e os faz transpirar. Sentem então o corpo a suar e alguma falta de ar, só aí se lembram que têm que respirar, pois tal raciocínio não tem nada a acrescentar..."

Ela acreditava que tudo ia piorar, ainda mais. O mundo estava prestes a ser tomada por uma força maligna, e Triny sentia que era a única capaz de vê-la. Sua mente e sua imaginação seriam suas maiores armas nessa batalha contra o desconhecido. Esta criança aparenta adivinhar o que vai no ar. Suas palavras pareciam estar escritas na próxima página de um livro que ainda não havia sido lido.

Enquanto a criança escrevia, sobre as avarias do sistema climatérico, Morpheus e Oraca, conversavam sobre isso mesmo.

Morpheus então queria falar sobre a coleta de dados, que o deixava alarmado – "que as almas suam com o calor que sentem sem a temperatura ambiente aumentar". Oraca ouviu, anuiu, mas nada sugeriu, o que, diga-se de passagem, é estranho para mente tão brilhante. Parecia estar a leste, noutro lugar, o que é natural por estar grávida.

Morpheus tentou em vão chamá-la à razão. Ainda tinha mais para contar e que o pior estaria por vir. Oraca, disse que para já era bom tudo ficar como é, sem tirar nem por, que o que falta, saber, há dê-se compor.

Morpheus insistiu e Oraca deixou cair que tal assunto não estava esquecido, que ela sabia, mas que, até o momento, nada faria, até mais saber. Saber mais para Oraca era recolher dados e verificar algumas hipóteses formuladas.

Morpheus tinha a certeza, que tudo isto era coisa de criança que viu o pai entrar em coma à sua frente e o trauma apareceu. A culpa foi do pai que num ato, irrefletido, de inveja, sobrecarregou o cérebro, e este deu o berro. Morpheus, embora sonhador, não tinha como escapar às malhas racionais da MenteDivina. A bem da verdade, não se pode dizer que fosse assim. Sempre tinha um sonho no bolso como medida para as reestruturações mentais.

Então, como ele dava a volta à MenteDivina? É, simples como o ovo de Colombo. É simples, mas é preciso saber que após explicado qualquer um consegue. Antes de Morpheus pensar, gostava de se colocar na pele de várias pessoas dos tempos antigos e imaginar como elas pensariam:

Matrix - a origem. Inteligência ArtificialOnde histórias criam vida. Descubra agora