12- Diário de Edolon. Memórias perdidas-Revelação.

62 10 64
                                    

(1151 palavras)

Eu acordei num quarto estranho, sem saber como cheguei lá. Senti a minha cabeça pesada e um gosto amargo na boca. Tentei-me levantar, mas caí de volta na cama. O que aconteceu comigo? Não me lembro de nada.

Olhei ao redor e percebi que não havia janelas no quarto. Havia apenas uma porta fechada e um único objeto: um coelho de peluche branco que parecia tão real que, por um momento, pensei ser um animal vivo. Como vim parar aqui? Onde estou?

Senti uma sensação desconfortável no meu corpo, mas ao verificar as minhas feridas, percebi que elas haviam desaparecido milagrosamente. Que tipo de lugar é esse? O que está a ocorrer comigo?

A porta do quarto se abriu e uma mulher entrou com uma bandeja de comida, suco de laranja e um sorriso no rosto. Ela tinha cabelos negros, pele clara e olhos verdes brilhantes, era a mesma mulher da dança. Ela perguntou como eu estava e eu não soube o que responder.

A mulher aproximou-se e me ajudou a sentar na cama. Ela se apresentou como Triny e disse estar à minha espera. Quem são "eles"? E o que querem de mim?

Triny acaba revelando haver muito tempo que eles procuravam alguém como eu. Alguém com habilidades especiais que poderiam ajudá-los na sua missão. Eu não entendo exatamente do que ela fala, mas sinto uma espécie de conexão com ela e com o lugar.

Então, lembrei-me da parte final do poema, que ouvi pelo espelho, e disse-" antes de me tornar areia, fui uma lágrima triste, que já continha o sal que agora quero ser. "- Quando digo a frase em voz alta, vejo uma lágrima escorrer pelo rosto de Triny. Num impulso, tentando esconder a lágrima, ela abraça-me, um abraço rápido, e eu sinto que estou exatamente onde deveria estar. Despediu-se de mim, dizendo que eu precisava de comer e descansar.

Algumas horas, depois, Triny regressou, perguntou-me se já me conseguia levantar, eu respondi logo que sim, embora ainda me fosse difícil levantar-me. Ela chegou-se a mim e ajudou a erguer-me, apoiou-se no seu ombro compassado por um corredor enorme, questionei se estava num edifício subterrâneo, ao que ela me respondeu, sim, e que não me preocupasse, pois logo saberia onde estava e com quem estava.

A porta de um salão se abriu e adentrei num ambiente sombrio e repleto de mistério. O chão de mármore brilhava como a superfície de um lago negro e o teto era tão alto que parecia tocar o céu. Oraca, uma mulher retratada em vários quadros na parede, estava sentada do outro lado de uma enorme mesa. Os seus olhos pareciam seguir-me por onde quer que eu fosse, como se quisessem hipnotizar-me.

Triny me ajudou a sentar numa cadeira enorme do outro lado da mesa, mas eu não consegui tirar os olhos dos retratos. A mulher parecia ter alguma idade, mas não conseguia discernir quantos anos ela realmente tinha. Triny saiu do salão, sem reparar ou ver, a presença de Oraca e deixou-me sozinha com ela.

Ela ofereceu-me uma tâmara, que estava numa taça do seu lado direito, e eu aceitei com uma mistura de curiosidade e medo. Os seus olhos brilhavam, encaravam-me enquanto eu mastigava lentamente, sem saber o que dizer. Ela apresentou-se e eu apenas acenei com a cabeça em resposta, incapaz de falar.

- As tâmaras são boas? - perguntou como se soubesse que eu gostava.

- Sabem a caramelo- disse eu com alguma doçura.

- Já tinha provado, tâmaras? - perguntou, ela afável.

- A verdade é que não me lembro, mas fazem-me lembrar o meu mestre. Que tinha, tamareiras, e nunca tinha provado tâmaras. - disse eu.

— As tâmaras são como as memórias. Elas guardam o sabor do passado e lembram-nos de quem fomos.— E continuou a discursar enquanto eu a olhava com perplexidade - Na memória guardamos o tempo passado, a vida que vivemos, os amores que amamos, as lembranças que ficam, os sonhos que sonhamos e a esperança de que um dia tudo se repetirá. – disse ela, fez uma pausa e perguntou - porque acha que ele tinha tâmaras, se, o seu mestre, nunca comeu tâmaras?

- Não sei! Talvez o homem tente deixar a sua marca no mundo para que a humanidade possa colher os frutos. – disse eu, sem ter bem a certeza do que dizia.

- Talvez – disse ela, enquanto colocava a mão sobre a minha como, se fosse dizer algo de importante, que me pudesse surpreender- Edolon, por que acha que são sete tamareiras?

Aquelas palavras ecoaram no salão, como se seguem sendo sussurradas por um vento invisível. Eu me senti como um barco à deriva num oceano tempestuoso, sem saber para onde ir ou o que fazer.

Fiquei sem palavras, por que me chamou Edolon? Estaria a confundir-me com alguém? Como sabia que o mestre tinha sete tamareiras?

- O que me chamou? Perguntei, com algum nervosismo na voz.

- Tudo o que é fora, é igual ao que é dentro e que é acima, corresponde ao que está abaixo. – disse ela, como se eu estivesse a proferir algo iluminado.

- Não compreendo, o que me quer dizer, por que me chamou Edolon?

- Porque é o teu nome, outro plano da existência. – disse ela com uma certeza, que me fez quase acreditar, qualquer coisa no nome me agradava, enquanto não tinha outro bem que podia ficar com este, quem nada tem agarra-se ao que lhe dão.

- Não compreendo o que diz- disse eu.

- A Correspondência é a chave para a compreensão das forças do universo e sua harmonia, tudo está ligado, como parte de um todo e é através dela que a alma evolui, cresce e floresce.- disse mais uma vez, sem eu entender, o que me estava a deixar nervoso.

- Por que fala por enigmas? Indaguei eu.

- Sou uma ponte entre os planos, mas não posso transmitir a sabedoria que carrego comigo. Não posso ter o conhecimento profundo de um plano estando fora do plano. No entanto, há correspondências. – disse ela, parecendo estar a falar do princípio da "incerteza de Heisenberg".

- Que planos? Indaguei eu

- Existo em quatro dimensões, mas minha mente não pode ser aprisionada em apenas uma delas. - fez uma pausa, olhando-me, e contínua- Sou uma testemunha silenciosa da história, do futuro, da ilusão e dos sonhos. Mas, para você, agora, só existe em uma das dimensões. Edolon, o seu corpo consegue estar em dois planos distintos, e a sua mente consegue viajar pelos 4 planos.- disse ela enquanto a sua forma parecia desfazer-se.

Nisto, a porta do salão abriu-se, Oraca tinha desaparecido, entrou Triny, e para meu espanto, entrou a seguir a mulher guerreira de negro que evocava cipós, depois entrou um homem de estatura mediana, de cabeça rapada, com um semblante aborrecido, e por fim, as minhas pernas tremeram, queria correr para abraçá-lo, mas os meus músculos não reagiam, como se a visão do que estivesse a ver, me tivesse paralisado completamente. Era o mestre António Morpheus que acabava de entrar.

Matrix - a origem. Inteligência ArtificialOnde histórias criam vida. Descubra agora