16 LABAREDAS

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LUCAS SAIU DO BANHEIRO E ESPEROU POR DOMINGAS. Decidiram ir àquele shopping mais distante para não correrem o risco de encontrar com alguém da escola. Mesmo assim, ainda tinham de conviver com os olhares direcionados a eles. Era como se um garoto retinto e uma menina branca com vitiligo, juntos, fosse o superlativo da pena. Quando estavam na fila para o cinema, uma senhora que passava quase caiu quando virou a cabeça duas vezes para vê-los melhor.

Como Jorim sempre dizia, "a Damariana só é do jeito que é porque a sociedade aceita que ela seja assim".

— Tudo bem?

Domingas o surpreendeu com o olhar perdido. Lucas assentiu e fez questão de segurar a mão dela para irem embora.

— Ainda bem que tu me lembrou de desligar o celular, Lu. Do jeito que as coisas têm caminhado rápido, acho que minha perna explodira de tanta notificação do Wattpad.

— Eu tô até evitando abrir. Ficou impossível acompanhar. São muitos comentários. Quem publicou aquele último texto?

— O da venda de drogas? — Ele assentiu. — Ué, eu pensei que tivesse sido tu.

— E eu que tivesse sido tu.

Ela parou no meio do hall do cinema e pôs as mãos na cintura.

— É óbvio que não. Até eu fiquei surpresa com aquilo.

— Será que vai dar ruim?

— Não, talvez não. Aquele último não tem informações. É mais uma... uma...

— Denúncia jogada no ar.

— É, isso. Algo vazio, até. Mas sabe o que é engraçado? No começo, os textos estavam bem diferentes. Cada um de nós seguia por uma linha narrativa, escolhia um comentário ou um e-mail de denúncia que tivesse mais a ver com nosso estilo de escrita. Agora... — Domingas fez um gesto de dúvida, mãos para cima. — Não tem mais como saber.

— É como se todo mundo estivesse indo pro mesmo lugar, absorvendo um pouco do estilo dos outros. Bizarro.

Voltaram a andar e Domingas deu um aperto na mão dele.

— Não foste tu mesmo?

— Não, eu já disse! Por que eu ia mentir pra ti?

— Ah, sei lá. Acho que fiquei meio sentida com aquilo do Otávio.

Lucas fez uma careta.

— É, eu também. Não sei por que ele não quis admitir que aquele texto sobre o menino que matou um cachorro dentro da escola era só invenção. Tanto que nem teve grande repercussão.

— O quê? — Domingas voltou a estancar. — Aquilo era invenção dele?

— É, ué. Tu... Tu tá falando de qual texto?

— Do texto sobre as ­— sorriu com nojo — sobre as cagonas.

— Eu pensei que esse texto era do Evandro.

— Sério?

— Sim. Cheguei a perguntar pro Otávio e ele jurou que não era dele. Aí pensei que fosse do Evandro porque lembro de um dia a tia Cíntia ter comentado alguma coisa sobre isso com a minha tia.

— Mas o Evandro confirmou que era dele?

Lucas pensou por alguns segundos. Então, negou.

— Pior é que não. Eu perguntei e ele fez uma cara de mistério. Disse que "talvez sim, talvez não".

— Olha, Lu, eu não gosto nada disso. Estava tudo organizadinho, sob controle. Agora, é texto toda hora. Tem coisa ali que eu nem li. Eu tenho medo de que a gente tenha ido longe demais.

Lucas Verdelhos e a Revolução WattpadianaOnde histórias criam vida. Descubra agora