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HEATHER

O grande dia chegou e a carruagem chacoalhava por causa dos ladrilhos de Londres a medida que nos aproximávamos do local onde seria o Baile de Primavera. A noite estava agradável, aparentemente sem sinais de que choveria tão cedo, ainda bem. Seria um pecado sujar de lama um vestido tão bonito que tinha sido presente da Mali.

Sinto minhas mãos suarem por debaixo das luvas brancas de cetim e me lembro do dia em que experimentei este vestido e me senti tão bonita nele. Hoje estava me sentindo como uma princesa, maquiada, cheia de jóias bonitas. Simplesmente estonteante com esse vestido.

Assim que chegamos, o cocheiro me deu a mão e eu desci da carruagem. Vim sozinha, porque Mali e Calum iam chegar um pouco mais cedo, já que são parceiros de negócios dos anfitriões.

O salão é maravilhoso, cheio de lustres e com uma luz amarela que deixa tudo mais aconchegante. As flores que o enfeitam são as da estação e perfumam o ambiente de forma natural, tudo é agradável. As pessoas estão aglomeradas na pista de dança e ao redor da mesa de ponche.

Odeio admitir, mas eu adoro o clima dos bailes, mesmo que atualmente não tenha um objetivo maior, já não tenho a pressão de paquerar em si. Uma nova música começa, os arranjos são tocados por um grupo que está próximo a pista de dança, com alguns violoncelos, violinos e um piano de cauda.

Sinto uma mão na minha cintura.

— Vai ficar parada aí feito um poste, senhorita Campbell? — Calum parece soprar no meu ouvido e os pelos do meu braço se arrepiam espontaneamente.

— Claro que não, estava apenas procurando a sua irmã, achei que você fosse esperto o suficiente para perceber — viro o rosto na direção do dele e ele sorri pra mim.

Calum levanta um dos braços e aponta para uma mesa de canapés bem servida, na qual avisto rapidamente Mali e a Madame Irwin, acompanhadas de Mary e de uma outra jovem que não conheço. Nem me despeço, apenas começo a andar na direção das damas e quando chego, dou um abraço rápida em todas.

Descubro que a jovem nova no grupo é Bridgit Sconse e é do norte da Inglaterra, assim como Mary, está passando a temporada na casa dos avós, procurando um marido para chamar de seu.

— Senhorita Mary, é claro que ele está encantado com a sua beleza e gentileza, fazia tempos que eu não via um homem tão apaixonado assim — Madame Irwin pontuava, enquanto segurava uma das mãos de Mary. — Não precisa ficar nervosa, vocês já trocaram olhares no parque e isso é um ótimo sinal, eu tenho certeza que ele vai vir pedir para que você lhe conceda uma dança.

— Espero que sim, Condessa, foi como amor à primeira vista, sabe? — Mary continua e eu me ofereço pra ir pegar um copo de ponche pra ela, aproveitando para ficar próxima ao Visconde Clifford que não parava de olhar para Mary.

Ele me dá licença e, sem que ninguém perceba, digo baixinho mas alto o suficiente para que ele me escute.

— Deveria pedir uma dança à ela, Visconde, duvido que a senhorita Mary vá lhe negar esse prazer — ele me encara, um pouco assustado e ergo o copo em sua direção.

Caminhando na direção das damas, vejo Calum em outra ponta do salão cercado de jovens, há pelo menos umas cinco delas, tentando ganhar um pouco da sua atenção. Deixo uma risada escapar, torturar Calum era um dos meus passatempos favoritos e isso significava observar a sua cara de desespero em uma noite de baile o tempo todo.

— Aqui está o seu ponche, querida — entrego para Mary e aperto seu braço de forma leve, chamando sua atenção. — Ele vai vir, fique tranquila.

Mais uma rodada de valsas está prestes a começar. Mali some no meio dos convidados, Mary finalmente vai ter sua dança com o Visconde Clifford. Vejo a Madame Irwin de braços dados com seu Conde.

Não me incomodo mais de ficar sozinha em eventos como esse, depois de algum tempo a gente aprende a apenas apreciar o momento. Aproveito para me aproximar da mesa de degustação e comer mais um canapé, ou talvez dois, quando sinto uma mão comprida e gelada em meu braço. Viro na defensiva, achando que pode ser Calum que é o único que tem liberdade para me tocar dessa forma em público mas, para a minha surpresa, me deparo com um loiro alto que nunca tinha visto em baile algum.

— Mademoiselle, muito prazer, sou o Marquês Luke Hemmings — ele se apresenta e deixo que ele beije minha mão. — Notei que parece faminta, mas será que se importa de me conceder está próxima valsa?

Com uma gentileza dessas, era impossível dizer não.

— Claro, Marquês Hemmings — faço uma meia reverência —, encantada. Sou Heather Campbell.

— Campbell? — ele fica sério por um instante e parece reconhecer o sobrenome. — A senhorita é familiar do Duque Oliver Campbell?

Imagino que minha expressão murchou um pouco ao ouvir o nome do meu irmão e tento afastar as lembranças ruins. Ollie ia gostar que eu me divertisse hoje a noite e apenas isso, nada de pensar no passado.

— Sim, senhor, Oliver era meu irmão — comento, enquanto ele me conduz para a pista de dança e nos ajustamos nas nossas posições. — O senhor o conheceu?

O marquês então faz algo que eu não esperava, mesmo ele tendo notado que me referi ao meu irmão no tempo passado, ele abre um sorriso ao mesmo tempo que a valsa começa.

— Duque Campbell era meu superior no exército, servimos juntos bons anos — ele segura a minha mão e começamos a nos mover assim que o som dos violoncelos começaram. — Sinto a falta dele mas olhando agora para a senhorita, vejo o quanto são parecidos. Eu teria te conhecido mesmo sem que dissesse a respeito dele.

Deixo um sorriso escapar também. Luke era um homem muito gentil e polido, sabia escolher bem as palavras e não me deixou constrangida. Observo a pista de dança, aproveitando o silêncio entre nós dois.

Mary e Michael estão dançando graciosamente e de forma bem apaixonada. Entre esses dois, não há dúvida, o casamento vai acontecer. Está estampado na cara deles o quanto se gostam, mesmo sem ter trocado mais que duas frases antes desse baile. Por um lado estou feliz, por outro sinto uma pontada no coração. Minha vida seria diferente se eu tivesse me apaixonado assim ou se ao menos tivesse sido correspondida.

O Marquês me rodopiou e quando trocamos de par por alguns movimentos, o Conde Irwin segura minhas mãos e me conduz de forma respeitosa. Ele parece se divertir com alguma coisa.

— Querida senhorita Campbell, gostaria que pudesse ver a cena que estou vendo neste momento — ele ri, de forma disfarçada. — O Arquiduque Hood parece estar sendo queimado vivo nesta dança, prometa que você e a Madame Knight vão trazê-lo mais aos bailes, fazia tempo que eu não me divertia dessa forma.

Embora estivesse cheia de curiosidade para ver a expressão de sofrimento de Calum, me mantive concentrada na dança, imaginando e torcendo para poder ver sem que alguém notasse.

Quando destrocamos os pares e volto para os braços do Marquês Hemmings, outro rodopio e consigo ver onde Calum está. Seguro o riso. A bonita ruiva que ele está conduzindo pela pista de dança parece querer agradá-lo a qualquer custo, o que ele retribui ficando cada vez mais longe. O desafio é que eles estão no meio de uma dança, é impossível ficar longe assim de uma pessoa com quem você está dançando.

Por um momento, nossos olhares se cruzam e a carranca dele aumenta, principalmente porque nunca vou deixar ele esquecer esse momento.

Danço mais uma valsa com o Marquês que se provou um excelente dançarino e me deixa curtir a música e a dança, sem ficar fazendo mil perguntas ou comentários como todos os outros.

Avisto Calum novamente, de mãos dadas com a Mali dessa vez, enquanto dançam juntos.

Dançar com a própria irmã é um sinal importante para as debutantes, ele está quase gritando "não estou interessado", mas elas parecem não entender, fazendo quase uma fila para ser seu par em alguma dança.

Ele me encara mais uma vez e, em seguida, a carranca volta com força, mas dessa vez não entendo o porquê.

baile de primavera | cthOnde histórias criam vida. Descubra agora