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CALUM

Os dias passaram rápido depois da última vez que visitei Michael e está uma adorável tarde em Londres hoje, ideal para honrar meu compromisso no Wine, um bar apenas para cavalheiros, muito tradicional na alta sociedade londrina. Assim que entro, localizo o Visconde Clifford e o Conde Irwin, sentados juntos em uma pequena mesa, concentrados em um jogo de cartas. Há um outro cavalheiro, loiro e alto, junto deles, mas que eu ainda não conheço.

Faço um sinal para o garçom e me aproximo da mesa dos meus conhecidos, cumprimentando outros pelo caminho.

— Maurice, um duplo por favor. — peço e observo as cartas do conde por sobre seus ombros. — Estão jogando o que?

— Cacheta, sua graça.

Ashton usa um chapéu diferente que parecia uma cartola mas era mais curto e roxo, tinha alguns detalhes verdes na tira de cetim. Vestia um sobretudo preto e usava seus óculos para leitura enquanto jogava. Michael por sua vez usava o mesmo de sempre, um fraque azul marinho, o cabelo loiro despenteado e botas marrons de cavalgada.

Quando os dois acabaram o jogo, Maurice já tinha trazido meu duplo e eu o degustava sem pressa.

— Achava que ia visitar a sua concubina hoje, Hood — Michael já deve ter tomado pelo menos três doses de vinho e já parece um pouco aéreo, me tratando sem formalidades.

— Não ando muito no clima essa semana, preciso descansar também — dou uma risada. — No geral, ela me dá uma canseira. Mas vivo mudando, você sabe, pra elas não se apegarem...

Michael deu de ombros, me conhece a tanto tempo que minha aversão ao compromisso nem lhe incomoda mais ao ponto de me dar sermões sobre minhas amantes. Ashton, por outro lado, me observava de forma discreta, enquanto o charuto queimava entre seus dedos sem ganhar um trago sequer.

— Gosto de ver como se orgulha da sua reputação, sua graça — ele começa —, mas não se esqueça que a vida de todo libertino tem seu fim. Até você querer justamente a mulher que não pode ter, ou que pode, mas mediante um anel brilhante e caro.

— Não será o caso, Conde Irwin, lhe garanto.

— É o que todos dizem — ele retruca — e acredite, digo isso por mim mesmo. Já fui como você, embora não seja tão mais velho, eu não me importava com casamento e não entendia por que as pessoas precisavam firmar laços. Mas hoje, dentro de um, vejo as coisas de forma diferente.

Ergo uma sobrancelha pra ele, tentando entender onde ele quer chegar com essa conversa.

— O casamento é uma questão de perspectiva, conde, faz anos que frequento os bailes da alta sociedade e tudo o que eu vejo são mocinhas desesperadas para ter um Hood como último nome, um título de arquiduquesa e poder exibir os mesmos vestidos caros que minha irmã usa — dou de ombros —, o senhor consegue compreender que a maior parte delas não está procurando um amor verdadeiro e sim dinheiro, proteção. Se não é pra ser amado por quem eu sou como pessoa e sim por minhas posses, já tenho quem me dê esse amor, não preciso de uma esposa pra usar como troféu e deixar empoeirar na minha estante.

O loiro que nos acompanhava e até agora não tinha dito uma palavra, de repente, se junta a conversa.

— É bem verossímil a sua narrativa, sua graça, e nenhum de nós pode discordar que é realmente o que acontece. Mas por outro lado, já pensou que pode desposar uma donzela que, mesmo que não te ame a primeira vista, pode aprender a te amar?

— Cavalheiro, não te conheço, mas sim já pensei sim, acho que o senhor que não compreendeu que o que me apetece na verdade é um amor visceral, como o que meus pais tiveram — suspiro ao lembrar dos meus pais, eles eram realmente felizes, não era uma fachada como a maioria dos casais hoje em dia. — Minha irmã tem um casamento com um amor visceral assim, por isso sei que ele existe, só não vejo essa possibilidade tão forte pra mim no momento visto minhas opções.

Todos ficaram em silêncio por um momento.

— É um bom ponto, sua graça, espero que encontre em alguma donzela o que procura e esteja preparado pra ela lhe revirar do avesso — o loiro ri e logo em seguida estica a mão na minha direção. — Marquês Luke Hemmings, ao seu dispor.

O Wine era um lugar ótimo para conhecer personalidades distintas do nosso círculo de amigos e parceiros de negócios. Eu não me lembrava de conhecer nenhum Marquês Hemmings, deve ser novo na cidade. Aperto a mão dele e iniciamos uma conversa sobre o Baile de Primavera que será daqui alguns dias.

— Pretende ir ao baile, marquês? — o Conde Irwin questiona, agora dando mais atenção ao seu charuto. — Se tem interesse em desposar uma bela moça, lhe adianto que é o lugar ideal para criar conexões.

— Ouvi falar do baile, mas como sou novo na cidade, não tinha certeza se precisava de um convite para participar.

— Não seja por isso, está convidado — digo alegremente e ele sorri.

— Pretendo me casar, talvez não tão imediatamente, mas tenho desejo de encontrar uma boa esposa para ser mãe dos meus filhos e também senhora do meu lar.

As palavras dele me entediam um pouco. Não me leve a mal, eu acho poético quem tem interesse em se casar, mas não é o meu objetivo de vida. Pelo menos não por agora.

Então, desvio minha atenção para o salão e fico surpreso ao me pegar rindo sozinho ao lembrar do incidente com a Madame Irwin, ao me flagrar com a camisa aberta e encharcado de chuva. Apesar do choque dela, com certeza essa informação não chegou aos ouvidos do Conde, do contrário eu provavelmente estaria casado com Heather e teria que pagar uma indenização por atentado ao pudor à Condessa.

Faço uma nota mental para agradecer minha irmã por me livrar de todas as encrencas nas quais me meto.

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