Klisé

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Klisé (adj.):
Clichê, só que na Grécia. Do francês, cliché, significa uma chapa de metal com palavras ou símbolos gravados em relevo, utilizada para reproduzir as impressões.
No sentido figurado, representa uma ideia muito repetida, previsível e sem originalidade.

Point Of View Charlotte

Eu odeio a Engfa. Odeio. Odeio. Odeio. Primeiro porque ela é a única pessoa no mundo que me deixa sem reação e segundo e mais importante porque ela é uma vingativa do caralho que me deixou com um tesão filho da mãe no meio de um restaurante, tudo pra ter o prazer de me pagar na mesma moeda.

- Lotte. - Me chamou rindo - Sabe o que eu lembrei?

A encarei e fiz sinal pra que continuasse.

- Do dia que aquele cara fez uma serenata pra você no meio da rua. - Engfa gargalhou.

Já disse que odeio a Engfa?

- Ué por que você ta rindo? - A fuzilei com o olhar porque ainda não tinha a perdoado - Eu achei bonitinho.

- Ah tá. - Respondeu irônica - Você queria enfiar a cabeça dentro do meu útero do tanto que você tava com vergonha, Meu Deus até hoje não acredito que ele realmente pensou ser uma boa ideia.

- Não é você quem acredita nessa baboseira de filmes românticos? Sempre tem serenatas e as pessoas se apaixonam. - A impliquei sabendo que ela ia se sentir pessoalmente ofendida.

- Eu acredito na ideia da serenata, o que eu não acredito é na incapacidade que ele teve em planejar isso. - Revirou os olhos e levantou as mãos pra pedir sua tão amada sobremesa ao garçom.

- Você acredita mesmo? - Questionei, me divertindo com o quanto ela consegue se irritar fácil.

- Claro que sim. Ué, onde já se viu, se algo é um clichê é porque é verdade. - Engfa respondeu como se isso encerrasse a discussão.

- Ai P'fa não é possivel que você realmente acredite que alguém vai começar a cantar no meio da rua e as pessoas que estão passando vão acompanhar e achar lindo, hoje em dia as pessoas se irritam com quem fica do lado direito da escada rolante, fala sério. - Continuei implicando e dei um gole no vinho que já estava quente.

- Lógico que isso é possível, Charlotte. - Me encarou - As pessoas amam uma demonstração de afeto em público, se ela realmente for boa, no caso.

- Ah tá bom, me poupe, daqui há pouco vai dizer que acredita em casais que saem correndo pra se encontrar no aeroporto. - Agora eu realmente estava dentro da conversa a ponto de querer provar que estava certa.

- Pelo amor de Deus, é claro que isso acontece. - Engfa respondeu já estressada - Às vezes a gente só percebe que ama alguém quando está perto de perder.

- Claro, mas impressionante que não existe celular nessas horas né? Ou o quanto o trânsito sempre é feito pra dar realmente o tempo certinho pra pessoa certa chegar bem na hora.

- Cala a boca Charlotte. - Seu tom de voz estava um pouco ressentido.

- É sério, se for só Bangkok tudo bem, mas imagina cidade grande ou exterior mesmo, P'fa? - Dei uma risada um pouco forçada - Esses filmes só existem porque as pessoas precisam se iludir a ponto de achar boas as coisas ruins da vida.

- Quê? Isso nem faz sentido. - A morena rebateu.

- Lógico que faz - Respirei fundo - Pensa comigo, se as pessoas acreditam nesse amor que vem pra dar significado a toda a sua vida ou em um salvador da pátria, alguém que é capaz de te amar tanto que só o amor dela é o suficiente pra te fazer feliz, então todo mundo vive esperando alguma coisa e consegue esquecer as verdadeiras frustrações da vida e o fato de que a maioria dos seres humanos são incapazes de se amar sem depender de alguém.

Engfa fez uma careta e me ignorou.

- Engfa, é sério, quantos casos você conhece que a garota mais bonita do colégio deu bola pro mais feio? Ou o contrário? Essas coisas não existem. Amor não é isso não.

- Tá bom, se você diz. - Engfa acrescentou enquanto virava sua taça de vinho e chegava pra trás pra que o prato com sua sobremesa fosse deixado na mesa.

- Não fica irritada, meu amor. - Peguei em sua bochecha e ela se afastou com um bico do tamanho do planeta Terra - Não é possível mesmo que você acredite nessas coisas.

- Ok, eu já entendi que você não acredita mas será que pode parar por favor de fazer piada com o que eu acredito? - Seu tom de voz me fez finalmente perceber que ela realmente estava chateada, mesmo sem conseguir decifrar o verdadeiro motivo, já que nós sempre tivemos essas discussões por implicância quando ela me obrigava a assistir pela milésima vez 500 dias com ela ou qualquer outra comédia romântica.

- Engfa, por favor né, para pra pensar no Michael que estudou com a gente, você acha realmente que ele virou um galã de arrepiar e que casou com a supermodelo da classe?

- Não é nisso que eu acredito, Charlotte - Ela se ajeitou mais uma vez na cadeira evitando meu olhar.

- Mas P'fa, é tipo essa coisa de que ódio tem que virar amor, não vira, você não se apaixona pela pessoa que te irrita, na vida real ela só te irrita mesmo.

Engfa ficou em silêncio o que eu entendi como sinal pra continuar.

- Mas definitivamente o que mais me irrita nesses filmes é que toda mulher bem sucedida e confiante, só alcançou esse status porque não teve tempo de encontrar o verdadeiro amor da sua vida, desde quando nós mulheres precisamos de alguém pra sermos completamente felizes?

- Para de problematizar a porra dos filmes. - Engfa disse irritada.

- Quantas pessoas já te pagaram uma bebida em um bar quando você tava triste e queriam conhecer sua alma? Na vida real elas só querem transar.

- Hm. - Foi tudo que ela disse.

- Absurdo também é o quanto a primeira vez dos casais padrões são sempre maravilhosas e na vida real além de doer pra caralho, o cara ainda não dura nem 5 minutos.

Engfa dessa vez deu um sorriso de lado apesar de seus olhos estarem tristes.

- Mas tem um que me irrita muito. - Eu disse levantando seu rosto com o dedo pra que ela me olhasse.

- Qual? - Perguntou baixo meio que com medo.

- A despedida do sonho. - Revirei meus olhos. - Sempre tem alguém que tem que desistir do emprego dos sonhos pra ficar com a outra pessoa, isso é ridículo e Friends é o grande responsável por tornar isso aceitável.

Engfa se levantou me encarando e eu pude ver lágrimas presas em seus olhos.

- Eu vou pro quarto. - Falou baixo me fazendo entender que ela realmente estava chateada com alguma coisa.

- Por quê? - Me levantei depressa e segurei em suas mãos.

- Você se esqueceu de um clichê, Char. - Ela sorriu mas sem felicidade - Um que eu sinceramente não quero ouvir sua crítica.

- Qual? - Perguntei com um nó na garganta.

Engfa deu um beijo na minha bochecha e disse - Os melhores amigos que se apaixonam.

E assim, simplesmente assim ela me deixou plantada no centro de um restaurante chique e minha ficha caiu que junto com as críticas que eu fiz aos filmes, eu também estava criticando tudo aquilo que Engfa pensa sobre o amor. Eu me odeio, eu definitivamente odeio Charlotte Austin e com toda certeza do mundo amo Engfa Waraha e sou vítima de um clichê, porque eu estou apaixonada pela minha melhor amiga que no momento deve também me odiar.

N/A: char querida, eu concordo em partes com você mas sinceramente? VAI TI FUDE MALUCO

Presente de GregoOnde histórias criam vida. Descubra agora