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Eram pouco mais de uma da tarde quando Enid, seus três irmãos mais novos —Lucille, Zachary e Isaac— e seu pai —Murray, estavam almoçando. Da mesa da sala de jantar, que por sinal dividia espaço com a de estar, ouviram a porta do Hyundai HB20 cinza batendo com mais força do que o habitual. A filha mais velha imediatamente largou os talheres e tratou de engolir a comida que estava em sua boca, quase sem nem conseguir terminar de mastigar.

— Quem quer ajuda pra escovar os dentes? —Sugeriu em tom animado.

Lucy e Isa levantaram as mãos euforicamente, visto que a irmã sempre fazia as atividades, consideradas chatas por eles, divertidas.

— Eu ainda não terminei! —Zach exclamou e cruzou os braços, emburrado.

— Ainda quer comer? —Perguntou e ele negou com a cabeça— Então hoje eu vou te dar uma colher de chá.

Assim, os três comemoraram e subiram com ela de bom grado. Segundos e Esther, a matriarca da família, entrou em casa derrubando um vaso de plantas e tudo o que estava em cima da bancada da cozinha americana. Murray tentou segurá-la, para que não se machucasse ou continuasse a quebrar o que visse pela frente, mas, como o habitual, os gritos começaram.

No andar de cima, depois enrolar para sair do banheiro —único cômodo que era fácil não ouvir a briga por ficar no final do corredor, Enid levou os irmãos para o quarto. Colocou som relativamente alto e os desafiou a cantar em plenos pulmões, querendo distraí-los tanto do barulho quanto das preocupações e dúvidas que rodeavam suas pequenas mentes.

Quatro músicas depois, Enid notou que o outro ambiente ocupado estava silencioso. Aquilo era sinal de que a situação estava controlada. Ou pior.

— Vocês têm lição pra fazer?

— Eu e Lucy acabamos tudo na aula mesmo —Zach contou orgulhoso— Isa tem porque deve ter ficado conversando com a namoradinha dele —Zombou e o irmão ficou vermelho.

— Cala a boca, Zachary!

— Ei, podem parando! Como assim "namoradinha" hein? —Perguntou tentando soar brincalhona, mas por dentro estava nervosa. Eles estavam crescendo tão rápido!

— Ela é só minha amiga. Zachary é um bobo.

— Isaac Sinclair —Enid repreendeu.

— Tá, desculpa, ele não é bobo —Disse depois de bufar— Mas ela é mesmo só minha amiga. Zach nos viu conversando no intervalo e tá brincando com a minha cara desde então.

— Vocês dois, tratem de se resolver. Não quero ter que me meter —Mandou e ambos assentiram— Quanto falta?

— Bem pouco! Acho que só um exercício.

— Okay, então faça. Zach e Lucy, podem ficar aqui e ajudá-lo? —Questionou e eles concordaram— Ótimo. Eu já volto.

— Depois você pode ir com a gente lá fora?

— Se eu chegar aqui, todos me mostrarem os deveres feitos e o quarto estiver arrumado, sim. Prometo.

Eles comemoraram e Enid saiu do quarto, fechando a porta atrás de si. Respirou fundo enquanto encarava a escada, com medo do que encontraria. Desceu os degraus devagar e aos poucos pode ver a tamanha bagunça deixada pelo 'furacão Esther'. Olhou para o sofá e lá estava seu pai, sentado com uma fisionomia de cansaço, acariciando as costas da mãe que, deitada nele e abraçando as próprias pernas, chorava.

Enid sentou do outro lado dela e trocou olhares com o pai. Ele concordou com a cabeça, passando segurança, e a filha puxou assunto:

— O que aconteceu, mamãe?

Caminhar • WenclairOnde histórias criam vida. Descubra agora