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Luzes brancas, turvas pelas lágrimas. Pessoas olhando, tentando saber o que se passava enquanto nem mesmo ela entendia. O aroma de remédio do ambiente e as diversas vozes —fazendo presses, comemorando uma alta ou chorando por uma perda— atordoavam ainda mais Enid, que adentrava ao hospital.

— Boa noite. Em qual quarto Esther Sinclair está internada? —Questionou à mulher atrás do balcão.

— É da família?

— Sou a filha mais velha. Meu pai tá com dificuldade de estacionar mas já tá vindo junto com os meus irmãos.

Ela assentiu e pegou a ficha enquanto Enid tentava disfarçar o quanto estava trêmula, ansiosa. Afinal, a ligação informando que sua mãe estava internada chegara há pouco mais de uma hora.

— Então, ela está passando por um momento bastante instável agora.

Enid sentiu um nó no estomago.

— O que aconteceu de fato? Só me disseram que ela estaria aqui.

— "A paciente tentou cometer suicídio com remédios que fora guardando pelo dormitório no decorrer de, pelo menos, uma semana" —Leu, afim de tirar toda a responsabilidade das duras palavras de si.

Uma semana apenas para executar. Há quanto tempo ela planejava aquilo?

— Ela vai ficar bem?

— Sendo bem honesta, garota, os médicos não sabem se ela vai passar dessa madrugada. Está bastante difícil salvá-la. Seu coração parou e voltou várias vezes desde que a encontraram.

Enid engoliu seco. Por sua mente, imagens conflitavam: Esther bem na última tarde; Esther surtando de repente há meses atrás. Considerando todo o contexto, não era lá o mais impossível de acontecer, nem perto disso, mas ainda sim ela não conseguia entender. Tinha certeza de que ela estava melhor. Parecia. Mas nem tudo é o que parece.

— E aí? Podemos vê-la? —Murray chegou questionando com Lucy no colo e acompanhado dos outros dois filhos.

Enid quis chorar, mas como poderia? Assustaria os seus irmãos e desestabilizaria o seu pai antes mesmo de saber qual rumo a situação tomaria. Apesar das chances, ela não sabia ao certo e não queria dar uma notícia como aquela para a família. Respirou fundo e sabia que teria que ser forte, talvez mais do que já tinha sido em toda a sua vida.

— Quarto 600, sexto andar. O primeiro à direita. Se ela não estiver lá, voltou pra sala de cirurgia.

Concordaram brevemente e começaram o caminho dolorosamente silencioso. Enid não era lá muito religiosa mas, em pensamento, pedia ajuda e amparo para todas as forças maiores que conhecia ou que pudessem ouvir.

Ao abrir a porta e ver Esther deitada na maca, repousando calmamente, sentiu uma onda de alivio, a qual ficou ainda mais forte quando a matriarca abriu os olhos e sorriu, por ver todos ali.

— Vocês vieram —Constatou e tossiu. Era possível sentir tanto calma quanto fraqueza em sua voz.

— Óbvio, mãe —Isaac disse enquanto Zachary correu para segurar sua mão

— Com frio ou com sede? —Perguntou ao senti-la fria e por ver seus lábios pálidos.

— Estou feliz por ver todos vocês —Falou e fez esforço para levantar a mão e acariciar o cabelo de Lucille, que dormia no colo do pai.

Em um susto, ela despertou.

— Não deixa a gente —Pediu e abraçou a mãe.

Quase que no mesmo segundo, uma lágrima rolou pela bochecha direita de Esther. Às vezes era doloroso não querer ficar, porém era mais ainda ficar daquela forma. Não via um futuro em que de fato estaria feliz e já estava cansada do contrário. Por mais que tivesse aprendido a lidar um pouco melhor, as vozes a cansavam, a perturbavam o dia inteiro; os pensamentos intrusivos não passavam, não importava quantos remédios ela tomasse; a taquicardia não cessava, e nem sempre era possível saber o motivo. Ela sentia-se doente e sem esperança de um tratamento. Nem sequer um diagnóstico.

Caminhar • WenclairOnde histórias criam vida. Descubra agora