Herança de Sangue, Parte 2

Capítulo 16 - Teach

Muito tempo havia se passado desde que alguém realmente ouviu alguma palavra do jovem acorrentado, deitado em sua cela, que não comia direito, não bebia direito e aparentava estar quase sem vida. O porto de Stormfell estava cada dia mais próximo e Zach falava com muito prazer que iam deixar o amaldiçoado por lá. Amaldiçoado... Essa palavra ressoava na cabeça do garoto, trazendo algum tipo de memória, mas eram apenas sentimentos que ajudavam a deixar sua situação ruim ainda pior. Talvez Zach tivesse razão. Talvez ele realmente merecesse morrer. Talvez sair da tripulação fosse o certo. Ele não ia ligar de ser deixado à deriva em algum lugar, desde que não fizesse mal a ninguém. Era o correto. Era o que causaria menos dor. Era o que queria. 

A tortura que sofria era imposta por si mesmo. Quando fechava os olhos, conseguia ver as cenas horrendas de morte das pessoas que aqueciam seu coração. Quando comia, sentia apenas o gosto de sangue. Quando dormia, revivia toda a dor que sentiu. Lembrava de alguns momentos felizes com risadas e alegria, que logo eram transformadas em gritos de dor e agonia, em tristeza, infelicidade, sofrimento e morte. Quando era obrigado a falar, sentia lâminas em sua garganta por não estar bebendo água, sua língua estava inchando e estava ficando quase cadavérico. Dava pra ver os ossos de seu rosto, seus dedos estavam cada vez mais finos, sua pele estava ficando descorada e frágil, suas roupas agora estavam mais largas e qualquer um que olhasse para o garoto sentado olhando para os cartazes podia ter a certeza de que ele era apenas um cadáver. 

— Teach... - Amara falava, colocando a mão em seu ombro. — Espero que saiba que vou continuar sendo sua amiga. Por mais que você não queira mais falar comigo...

— Amara... 

— Sim? 

— Obrigado por ser minha amiga... Desculpe ser um amigo ruim. - Falar estava sendo mais difícil ainda. — A capitã já decidiu onde vai me largar?

— Ela... Ela não vai te largar. Vamos parar em um porto perto de Stormfell pra finalizar um negócio e ela te quer na comitiva. 

— Hm...

— Eu espero que consiga reagir, Teach... Não aguento mais te ver nessa situação. Janelinhas tá triste também, agora que perdeu um parceirinho. E a capitã, bem... Tá tendo que lidar com a tripulação. 

— Desculpa, Amara. Eu espero que você nunca sinta isso que eu estou sentindo... Você é a pessoa mais alegre que eu conheço. Me lembra alguém... Mas não sei quem. 

Amara dava um abraço pelas costas de Teach pelas grades da cela e para sua agonia, acabava sentindo os ossos de suas costelas. Ela passava a mão pelos cabelos do garoto antes de se despedir e sair da área das celas. Não muito tempo depois, a capitã Von Draken chegava e abria a porta da cela, entrando e ficando sentada de frente ao jovem. 

— Teach, eu vou ser sincera com você. Pensei muito sobre a sua situação e no que fazer. Amara já deve ter dito que vou te mandar com uma comitiva pra finalizar um negócio, não foi?

— Sim, capitã. 

— Eu não quero que vá embora do navio. Mas você precisa de um pouco de mudança e sair dessa cela, então você vai procurar uma pessoa pra mim. Vamos passar dois dias no porto, então você vai ter tempo pra procurar. Pergunte sobre seus amigos, dos cartazes. Se ela não souber deles, então ninguém mais sabe. 

— Vou perguntar sobre cadáveres?

— Se estiverem mesmo mortos, ela vai saber dizer. Se estiverem vivos, as coisas vão mudar. E talvez ela te ajude com a sua memória. Quando você descobrir o que aconteceu de verdade, me diga o que vai querer fazer. Vou respeitar sua decisão e te ajudar.