Capítulo 23: Cheio de medo
O espelho era seu pior inimigo.
Há quem diga que, o pior inimigo do homem é o próprio homem, que o que está dentro do homem na verdade não passa de uma natureza monstruosa, horrenda, maldosa e egoísta, ambiciosa; apesar de tudo, cheia de medos e em busca da perfeição.
Kai estava em busca da perfeição.
Entrou em seu quarto e fechou a porta com muita cautela para não chamar a atenção de sua mãe na cozinha, enquanto ela preparava um almoço saudável para o modelo em ascensão. Encarou a mala a qual um empregado deixou ali mais cedo, quando voltou do hospital. Insistiu que podia carregá-la, porém seu atual estado de saúde mostra o contrário.
Sentou na cama, em frente ao imenso espelho que, de todos os campos de batalha que precisava enfrentar, não poderia ser um pior. Era ali onde enxergava seu rosto, seu corpo... os pontos que mais odiava em sua pele, o quanto seu cabelo nunca o deixava satisfeito, os pés que quando descalços lhe deixavam inseguro, o peso que até então era um grande problema por, segundo ele próprio, não conseguir manter o número na balança que tanto desejava. E quando conseguia, buscava por outro número, e outro, e outro, outro, mais outro. Incessantemente.
Os dias em que passou no hospital, se culpando por deixar a situação tomar tais proporções as quais interromperia sua carreira, suas metas e, o obrigaria a deixar a dieta de lado, foram os piores em sua vida. Era apenas ele naquele quarto com uma televisão gigantesca e uma janela com vista para o centro de Los Angeles. Lá havia cortinas longas, que ele sempre tratava de mantê-las fechadas por querer esquecer que um mundo existia do lado de fora. Aquele mundo que o deixou doente, a procura de uma perfeição que em ninguém existia. Foram longas noites encarando um teto, sem conseguir dormir, se perguntando quando acabaria, quando teria um fim, quando, finalmente, poderia ir pra casa e voltar a ter a vida que tinha antes. Em todas as visitas dos mil médicos de outras mil especialidades, quando recebia a pergunta, aquela droga de pergunta que insistiam em sempre fazer, assentia, dizia que sim, que entendia sua atual situação e que precisava dar atenção para si mesmo agora. O problema era que o seu "eu" era o responsável por querer matá-lo.
Como cuidaria de alguém que não dava a mínimo para ele? Que preferia o ver morto do que fora dos parâmetros exacerbados da moda?
Aos poucos, Kai foi parando de chorar e seus sentimentos passaram a se acoplar em seu peito, formando uma bomba relógio que vez ou outra alcançava o seu tempo limite.
Honestamente, poderia dizer com todas as palavras que se odiava.
Odiava tudo em si mesmo.
Odiava seu cabelo.
Odiava seu corpo.
Odiava seu rosto.
Odiava suas mãos e pés, e nunca seria capaz de aceitar nada que fizesse parte daquela casca que, por tudo, trocaria.
Será que era por isso que sempre estava sozinho? Não era bom o suficiente? Não conseguia ser bom o suficiente?
Havia um lado dentro dele que, afirmava que o certo era deixar que cuidassem de sua saúde, o melhor seria aceitar o seu estado e se concentrar em melhorar antes que o pior acontecesse. Mas do outro, achava ser uma completa perda de tempo.
No fim, a indústria da moda não mudaria e o número impecável das medidas permaneceriam.
— Eu trouxe um presente de boas-vindas.
Kai arregalou os olhos e se surpreendeu ao ver a porta branca ser aberta por Beomgyu, que tinha os dois braços para trás do corpo e um sorriso receptivo, sem se importar em pedir licença alguma para entrar. Sabia que seu amigo gostaria de sua presença.
VOCÊ ESTÁ LENDO
TRUST FUND BABY | YEONBIN
Fiksi PenggemarEra do tipo que vivia em uma bolha que o impedia de ver a realidade o qual todos viviam. Pois, na verdade, seu mundo era diferente e, tipicamente o ideal para qualquer adolescente da sua idade. Após sua família falir, Soobin ganha a missão complicad...